24 set, 2025 • Afonso Cabral*
Na apresentação oficial aos sócios do Benfica, Mourinho confirmou que ia mudar gradualmente o Benfica e que a densidade de jogos não permitia outro cenário.
De saída, Bruno Lage apontou a introdução de Sudakov e Lukebakio como facilitadores do trabalho do seu sucessor, como que estes dois resolvessem miraculosamente os problemas estruturais da equipa.
A máquina de Mourinho tropeçou ao segundo jogo, em moldes que pareceram déjà vu ao adepto encarnado. Primeira parte aquém, segunda de maior domínio, vantagem conseguida e desperdiçada na compensação.
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Faço uma pausa na análise para recordar algo importante. Os processos não se mudam numa semana. É impossível, com jogos de três em três dias, ter tempo para treinar, quanto mais para introduzir novas dinâmicas, estruturas e ideias. O processo faz-se de jogo, recuperação física, jogo, recuperação física, num loop que termina a 5 de outubro após a deslocação ao Dragão.
Aí serão 16 dias para dar um cunho mais pessoal à equipa, mas... sem os internacionais. Por isso este texto não tende a criticar a lentidão da mudança na dinâmica das águias, apenas constatar o que mudou e o que ainda há para mudar.
Começo pelo que mudou: estrutura da equipa em 4x3x3 mais declarado, com Ríos e Sudakov a ocuparem o espaço entrelinhas à direita e esquerda respetivamente, com a missão de pegarem no jogo em corredor central. Muito mais afinado nesta missão o ucraniano, pela habilidade em espaços curtos. Rios não cai tantas vezes no corredor direito, e é visto como um médio de ataque a espaço, que invariavelmente pede a bola nas costas da linha defensiva adversária.
Sensação de "déjà vu" na Luz, mesmo com outro trei(...)
Como extremo figura Ivanovic. Ele que quase sempre emparelhava com Pavlidis no 4x4x2, agora parte do corredor para utilizar o físico para procurar terrenos mais interiores em condução. Nas Aves correu bem, contra o Rio Ave o sérvio teve maior dificuldade e colou-se à linha como muleta demasiadas vezes, o que não o beneficia.
Depois, os aspetos importantes a mudar. Como se comporta o Benfica após a perda de bola? José Mourinho apelidou a equipa de ‘naif’ após a transição concedida que resultou no golo de André Luiz mas o problema é muito mais estutural e vem do início da temporada.
Os sete jogos seguidos sem sofrer passaram uma mensagem errada mas os problemas sempre estiveram lá. Neste momento, e ainda com Mourinho, o Benfica não está equilibrado no momento de perda de bola.
Apesar de o processo coletivo ser primordial, importa-me destacar Enzo Barrenechea. O argentino é um 6 pelo que oferece com bola. Joga muito bem de frente, descomplica e tem uma capacidade de passe e gestão de ritmo de jogo muito acima da média. É um 6 pela ótica de blocos baixos que o Benfica enfrenta semana sim semana sim, na Liga Portuguesa.
Defensivamente tem algumas lacunas, sendo a mais evidente o momento de perda de bola. É um jogador que quando o Benfica se instala no meio-campo ofensivo quer ele também estar perto da baliza adversária. Pensa o jogo como um 8 e isso desprotege a equipa.
Se o posicionamento pré-perda causa problemas ao Benfica, o seu comportamento reativo pós-perda acentua-os. Porque quando o Benfica perde a bola, Enzo é excelente na reação, vê o jogo para a frente e ataca imediatamente o portador da bola. Quando recupera, tudo bem, mas quando é ultrapassado, os adversários veem um mar pela frente e encaram a linha defensiva de frente.
Para uma equipa mais equilibrada, os ‘8’ teriam de fazer este trabalho e Enzo teria de retirar um pouco o espaço nas costas e atrasar a condução do adversário para permitir que a equipa chegasse.
(o golo do Rio Ave evidencia mais uma vez o posicionamento demasiado alto de Enzo)
É um problema para Mourinho resolver certamente, seja ao trocar Enzo para 8 por um 6 mais equilibrador (talvez Manu quando regressar) ou uma necessidade de adaptação do argentino, que não será do dia para a noite.
*comentador de futebol na Renascença