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Ursula "faz lindamente" em reunir-se com Trump só quando existir acordo para assinar
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Paulo Almeida Sande

Ursula "faz lindamente" em reunir-se com Trump só quando existir acordo para assinar

08 mai, 2025 • Pedro Mesquita


Não há memória de que um presidente da Comissão Europeia tenha esperado 100 dias para reunir, pela primeira vez, com um novo Presidente dos EUA. Na praça de São Pedro, em Roma, Trump e Ursula von der Leyen trocaram breves palavras e assumiram que vão finalmente encontrar-se. À cautela, a presidente da Comissão Europeia fez saber que a reunião irá acontecer "no momento certo", quando houver sobre a mesa um acordo pronto a assinar sobre tarifas.

Paulo Almeida Sande, especialista em assuntos europeus, diz à Renascença que "é importante" haver cautela porque o problema principal da relação com os Estados Unidos é que "ninguém sabe bem como é que se deve relacionar com esta administração".

Almeida Sande recorda que Donald Trump “disse, com todas as letras, que a União Europeia é uma inimiga dos Estados Unidos", que "foi criada para fazer frente e prejudicar os próprios Estados Unidos".

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Na leitura deste especialista em assuntos europeus, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, “faz lindamente, faz muito bem" em assumir uma posição de prudência, em particular depois do episódio em que o Presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, se viu envolvido na Sala Oval da Casa Branca.

"A certeza da incerteza é óbvia", explica Paulo Almeida Sande, daí a posição cautelosa da União Europeia.

A Comissão Europeia diz que Ursula von der Leyen e Donald Trump vão encontrar-se no momento certo. Acontecerá quando estiver sobre a mesa, e pronto a assinar, um acordo para resolver as tarifas. É importante esta cautela?

É importante. Na relação com os EUA e com esta administração, a União Europeia tem tido nesta matéria uma grande cautela. Portanto, nós não podemos considerar que a Europa não tomou uma posição, por exemplo, tão radical como a China - podendo ter uma leitura de que a Europa não foi capaz de responder de uma forma assertiva - e ao mesmo tempo criticar a Europa por ter a atitude cautelosa como teve, e continua a ter, em relação a tal possível acordo.

O problema principal da relação com os Estados Unidos é que ninguém sabe bem como é que se deve relacionar com esta administração. No caso da Europa, e da União Europeia, a posição americana - e Trump disse-o com todas as letras - "a União Europeia é uma inimiga dos Estados Unidos". Foi isso que ele disse. Que "foi criada para fazer frente e prejudicar os próprios Estados Unidos". Mas, ao mesmo tempo, temos sempre uma dúvida profunda, quase que diria existencial, sobre o que é esta forma de negociar desta administração [norte-americana].

Terá sido, provavelmente, por se recordar daquele episódio de Zelensky na Casa Branca, na Sala Oval, que Ursula von der Leyen faz saber que "procurarão encontrar-se no tempo certo, quando estiver sobre a mesa um acordo para resolver as tarifas impostas pelo Presidente norte-americano e este estiver pronto a ser assinado? Ou seja, a presidente da Comissão Europeia não quer passar pelo mesmo...

E faz lindamente, faz muito bem. Aliás, é bom que faça essa referência à Ucrânia e a Zelensky. É uma boa referência porque nos permite perceber uma coisa: é que exatamente por causa desse trajeto na relação com a Ucrânia, assistimos ao anúncio da assinatura do acordo sobre as "terras raras" e sobre os minérios ucranianos, que não tem nada a ver com aquilo que era a retórica inicial.

Isso exemplifica bem a forma como esta administração americana negocia, que é procurar obter o máximo benefício em termos económicos para os Estados Unidos, o que é absolutamente legítimo, mas usando métodos que não conhecemos em geral, não são tradicionais, não são comuns na política internacional e, em particular, na política comercial e na política na relação entre os Estados.

O mundo já conhece as regras do jogo?

As regras do jogo eu acho que ninguém conhece, até porque elas estão sempre a mudar. São regras que dependem muito, se quisermos, da forma como Trump vai interpretando progressivamente, passo a passo, cada um dos momentos em que as coisas vão acontecendo.

Mas, pelo menos, já há uma certeza dessa incerteza...

A certeza da incerteza é óbvia e leva justamente a esta posição da União Europeia que é cautela. Repare, vamos ter nos próximos tempos uma tentativa da União Europeia de encontrar uma plataforma que tem que existir, porque verdadeiramente há Estados-membros com posições muito diferentes sobre esta matéria: Há uns que querem uma posição mais radical, no caso da França, por exemplo, há outros que preferem uma atitude mais conciliadora.

Portanto, a Europa está a tentar encontrar uma plataforma sua, que seja adequada para a negociação com as linhas vermelhas, ou seja, os limites a que se pode chegar, mas ao mesmo tempo finalizando a administração norte-americana os riscos e os custos de não fazer esse acordo. Mas a resposta tem que ser comum. O que não pode haver, e esse é o ponto de partida que ainda não está sequer consolidado por parte da União Europeia, é justamente existir uma base em que todos os Estados-membros estejam de acordo.

A certeza da incerteza é óbvia e leva justamente a esta posição de cautela da União Europeia

Já disse que Ursula von der Leyen faz "lindamente" em sentar-se com Donald Trump apenas quando tiver tudo pronto para assinar. A questão que agora coloco é esta: os interlocutores norte-americanos, quando falam com a União Europeia dizem que nunca sabem muito bem com quem é que hão de falar. Von der Leyen coloca-se claramente na "pole position" para ser a verdadeira interlocutora da Europa?

Deixe-me dizer-lhe uma coisa sobre isso, que eu acho que é talvez o mais importante quando olhamos para esta conjuntura: aparentemente, pelo menos até agora, a forma de olhar para a União Europeia e provavelmente a estratégia seguida pela administração norte-americana passava - e passará ainda, eventualmente - por dividir a Europa.

Mas na hora da verdade, na hora de ser alguém a representar a União Europeia, Bruxelas faz bem em apresentar Ursula von der Leyen em vez de formar uma dupla, por exemplo, com António Costa?

É a presidente do executivo. Bom, eu julgo que seria útil para a Europa ter essa dupla dimensão, até porque António Costa, como presidente do Conselho Europeu é, se quisermos, o representante institucional conjunto dos Estados-membros. E Ursula von der Leyen é a presidente do Executivo. Portanto, estarem os dois presentes significaria, do ponto de vista da União Europeia, essas duas dimensões cruciais da construção europeia.

Isso pode acontecer, mas - para já - o que se sabe é que, "no momento certo" Ursula von der Leyen vai encontrar-se com Donald Trump. Não há qualquer referência a António Costa.

Exatamente. O número de telefone da União Europeia, se lhe quisermos chamar assim, quando procuramos responder à velha questão de Kissinger, do século passado, de dizer para onde é que é o telefone quando quer telefonar para a União Europeia, é evidente que o telefonema principal, aquele que deve ser feito em primeiro lugar, é à presidente da Comissão Europeia porque é o Executivo. É ela quem, de facto, determina e conduz as políticas europeias.

De facto, Ursula von der Leyen tem o poder do executivo. E Donald Trump, em particular, a administração norte-americana e os Estados Unidos, respeitam em primeiro lugar quem tem o poder. Dito isto, faz muito bem Ursula von der Leyen estar disponível para se encontrar com o Presidente dos Estados Unidos, mas apenas quando os dados estiverem na mesa e quando as coisas estiverem claras.

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