23 out, 2025 • Alexandre Abrantes Neves , Beatriz Martel Garcia (sonorização)
Pode ser um dos efeitos da introdução da Inteligência Artificial (IA) nos ambientes laborais: o aumento da eficiência pode dar força às ideias de reduzir a semana de trabalho para quatro dias. Para o especialista e consultor em IA, tudo isto está ainda muito dependente de “incentivos financeiros”, mas o “ideal” seria ter uma mudança de mentalidade o mais rapidamente possível – e para isso deixa propostas ainda “mais arrojadas” do que a semana de quatro dias.
“Quero pegar em 20% da população e dizer: ‘Vocês não precisam de trabalhar’. Porque o que está a acontecer agora é: 80% da minha equipa, 70% da minha equipa, 50% da minha equipa já consegue cumprir o trabalho”, sugere no podcast Renascença/EuranetPlus “Isto não é só Europa”.
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A solução daí para a frente – nomeadamente para garantir a sustentabilidade da segurança social – ainda é um “problema” por resolver, mas uma garantia deixa: nos próximos 50 anos, vai ter de haver uma mudança. “Nós temos tarefas para ter pessoas a trabalhar oito horas por dia, cinco dias por semana?”, questiona.
Um dos setores que pode lucrar mais com o aumento da eficiência (o FMI prevê um crescimento na economia mundial até oito décimas), na leitura de Rocha e Melo, é a administração pública – apesar de temer que a redução de tempo em executar tarefas possa aumentar ainda mais a oportunidade de exigir burocracia nos serviços públicos.
“O meu medo é: vai ser tão fácil montar processos burocráticos [com a IA] que eu tenho medo que qualquer diretor, subdiretor, gestor dentro do setor público, que de cada dia de manhã tenha uma ideia de um processo novo”, considera.
A IA já entrou em muitas empresas portuguesas, mas o ritmo não é igual para todas e, na perspetiva de Rocha e Melo, ainda se pode ter de esperar “cerca de 15 anos” até esse tipo de tecnologia entrar em ambientes onde a presença de ferramentas digitais ainda é residual, nomeadamente em certas fábricas e indústrias.
Quando isso acontecer, a IA já fará muito mais do que a “gestão básica de conhecimento” que “faz e responde a perguntas” e o risco de substituição de pessoal por tecnologia é maior. Esse plano de reestruturações já está em marcha por algumas empresas, acredita Rocha e Melo, mas duvida que isso vá prejudicar a relação entre trabalhadores e empresas.
“Eu quero acreditar que há alguma paz social, como tu dizes. Temos também de nos lembrar que há uma renovação das pessoas. As pessoas vão saindo, vão se reformando e outras vão entrando”, considera, adicionando que Portugal “é um país equilibrado nesse sentido”.
Neste episódio do “Isto não é só Europa”, João Rocha e Melo responde a várias perguntas de ouvintes. Uma delas veio da Carla, professora do ensino básico e secundário, que se mostrou preocupada com o aumento de desigualdades, junto das populações mais desfavorecidas que não possam aceder a este tipo de tecnologia. Para o especialista em IA, o problema existe, mas o reverso também.
“Eu até acho que a IA aproximou quem tem menos recursos de quem tem mais recursos. Porque a verdade é, embora sejam precisos alguns recursos, são recursos que já estão algo massificados. O ChatGPT é para todos e é grátis na internet”, defende.
Ainda assim, e quando até estas “condições básicas” faltam, Rocha e Melo defende que deve ser o Estado a chegar-se à frente – e essa reflexão deve começar em Bruxelas.
“A UE teve uma perspetiva mais de segurança, ainda não houve uma preocupação, pelo menos, regulatória, assim social – de qual é o impacto disto, a preocupação da inteligência artificial, se é uso abusivo, se é segurança de dados, se é certos setores não poderem fazer certas coisas”, apelou.