20 out, 2025 • João Pedro Tavares
Quando o cardeal Robert V. Prevost foi eleito Papa, como Leão XIV, justificou que sentia como missão continuar o legado de Leão XIII, Papa que publicou a Rerum Novarum, encíclica que serviu de base aos princípios da Doutrina Social da Igreja aplicados ao mundo do trabalho e à sociedade em geral: a defesa da casa-comum, o destino universal dos bens, a promoção da dignidade da pessoa, a solidariedade e a subsidiariedade. São princípios que devem orientar, como critérios de discernimento, as escolhas, decisões e ações dos líderes, em particular, no exercício das suas responsabilidades. E não se encontram desactualizados nem ultrapassados, conforme referiu o Papa, apesar dos desafios dos avanços tecnológicos e da inteligência artificial em particular.
A inteligência artificial é criada pelo homem. Mas será uma aliada? Ou uma intrusa? Dará um grande contributo para o desenvolvimento? Ou constituirá uma nova arma? Olho para a tecnologia, no geral, ou para a inteligência artificial, em particular, como um martelo que é seguro por uma mão. O maior dos desafios está na mão e não no martelo. No uso que lhe for dado, no propósito associado.
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O primeiro erro seria ignorar ou combater a sua adopção. Devemos estar abertos e abraçar estas oportunidades, usando-as com um bom propósito. Serão sempre meios e não fins em si mesmos. Os fins são os mesmos já anteriormente enunciados, as pessoas, a casa-comum e o bem comum. Outro erro seria idolatrá-la como uma solução para tudo, como uma panaceia para os problemas da humanidade que rapidamente conduzem à mentira e à violência. De novo seria desvirtuar o princípio e o fundamento das nossas vidas.
Se nos perguntarmos que contributo estas ferramentas darão para a erradicação da pobreza ou para o combate à fome, tão pouco nos atreveríamos a vaticinar. O desafio não está no potencial, nas capacidades, ou nas competências, que já existem de sobra, mas no mau uso, no carácter dos líderes e na hipocrisia que existe entre intenções, acções e compromissos.
Que lugar para a ética e a finalidade última do bem comum e da dignidade das pessoas?
Um erro é reduzir as pessoas à condição de “recursos humanos”, como se fossem apenas mais um meio produtivo — a par do capital, dos equipamentos ou de outros ativos da empresa. Outro equívoco é medir o sucesso apenas por resultados financeiros de curto prazo, ignorando dimensões igualmente vitais como o impacto social e ambiental, a sustentabilidade, a boa governação e a transparência
O desafio é ser fiel aos princípios existentes e procurar discernir com bom critério a aplicação de todo o potencial disponível e futuro. Aprecio por isso a iniciativa Rerum NovAIrum, que se propõe reformular a encíclica do Papa Leão XIII, incorporando a realidade atual e futura à luz dos princípios definidos no final século XIX, faz precisamente 134 anos. O objectivo é criar mecanismos de reflexão ética que ajudem os decisores — ou os processos de certificação — a avaliar a finalidade das ferramentas tecnológicas, garantindo que algoritmos e sistemas de IA sejam orientados para o bem comum e coloquem a esperança no centro da inovação.
Então sim, a inteligência artificial poderá ser uma grande aliada que devemos apoiar e continuar a desenvolver.
João Pedro Tavares, presidente da UNIAPAC Europa e ex-presidente da ACEGE - Associação Cristã de Empresários e Gestores