José Luís Ramos Pinheiro
Opinião de José Luís Ramos Pinheiro
A+ / A-

Quem pretende desfazer a Europa?

06 jun, 2024 • Opinião de José Luís Ramos Pinheiro


Se a extrema-direita crescer como nunca, nunca a União Europeia esteve tão perto da desintegração.

A política interna está ao rubro com as eleições europeias à porta. Mas nestas eleições jogam-se destinos mais importantes do que a escolha entre Sebastião Bugalho e Marta Temido. Mais do que saber se o Governo vai ganhar ou perder com os resultados de domingo, importa conhecer que Europa vamos ter no Parlamento Europeu, a partir desse dia.

Se a extrema-direita crescer como nunca, nunca a União Europeia esteve tão perto da desintegração.

O populismo de extrema-direita fez das fraquezas europeias bode expiatório para quase tudo o que de mau sucede, em cada um dos países membros.

Os movimentos de extrema-direita europeus têm sido encorajados e insuflados a partir do ‘trumpismo’, com a exceção da Frente Nacional, em França, que já cá anda há muitos anos.

Os ventos de extrema-direita fazem também o encanto de Moscovo (que ativamente os estimula) ao conduzirem à desestabilização interna da Europa e à desejada quebra da unidade europeia no apoio à Ucrânia.

A extrema-esquerda não é menos perigosa para o projeto europeu. Sucede, porém, que neste momento o esquerdismo perdeu cor e votos e não constitui ameaça eleitoral comparável.

Em todo o caso, os movimentos de extrema-esquerda europeus, incluindo em Portugal, são também herdeiros legítimos e diretos do marxismo-leninismo, cujo expoente foi a União Soviética.

E embora tais movimentos sejam agora mais fracos nas urnas do que no passado, eles criaram condições objetivas para que o populismo de extrema-direita crescesse e desse cartas.

Ao pressionar para uma rutura cultural - fraturante, permanente e insaciável - a extrema-esquerda (e assim foi, manifestamente, o caso da extrema-esquerda portuguesa) abriu espaço para uma reação feroz de quem, ao longo dos anos, se sentiu (mal ou bem) agredido ou mesmo violentado.

O terreno para o crescimento da extrema-direita foi semeado de forma incauta precisamente pela extrema-esquerda. Anos e anos de políticas fraturantes abriram espaço para alternativas de sinal ferozmente contrário.

Perante o combate cultural permanente da extrema-esquerda - que até pretende eliminar a objeção de consciência em determinados atos médicos, impondo a sua visão do mundo a quem manifestamente não a partilha - também o centro político fraquejou na maioria dos países da União.

O centro (mais à direita ou mais à esquerda) perdeu valores, desnatou-se e acomodou-se. Pragmático, deixou cair convicções e valores, na esperança de não perder o suposto comboio da ‘modernidade’.

Veja-se, com raras exceções, como se comportaram muitos dos representantes do chamado centro político ao longo dos anos, em temas como aborto e eutanásia.

Veja-se como o centrismo europeu consentiu ou defendeu que as raízes judaico-cristãs fossem afastadas do texto constitucional da União Europeia (cujos pais fundadores, já agora, eram democratas – cristãos publicamente assumidos).

Sem convicções claras, o centro político também contribuiu, objetivamente, para os crescimentos da extrema-direita; ainda que boa parte dessa chamada extrema-direita use as convicções num sentido puramente utilitário – ganhar votos e aceder ao poder.

A defesa do direito à greve das forças policiais (e também das Forças Armadas?) mostra como o populismo da extrema-direita é até mais forte do que a sua ideologia. Ideologicamente a extrema-direita nunca poderia defender um tal direito.

Como, se invoca a cultura cristã, nunca poderia a extrema-direita propor uma linguagem e uma política violentas face aos imigrantes que antes de mais são pessoas com a mesma dignidade humana que tinham ou têm os nossos emigrantes quando procuravam ou procuram no estrangeiro, aquilo que não encontravam ou não encontram em Portugal.

De resto, Portugal é hoje um país envelhecido, fustigado por décadas de políticas anti natalistas que a extrema-esquerda orgulhosamente impôs e o centro resignadamente consentiu. Por isso, sem imigração (embora com regras claras e combate às redes de tráfico humano) o futuro será mais difícil. Já hoje, sem imigrantes, boa parte da economia portuguesa entraria em colapso.

A complexidade que o mundo vive exige escolhas responsáveis.

Os tempos aconselham o voto em partidos moderados, dando-lhes o respaldo eleitoral necessário para evitarem uma Europa ainda mais frágil que faria as delícias de Moscovo, Pequim e, seguramente, de Donald Trump.

Comentários
Tem 1500 caracteres disponíveis
Todos os campos são de preenchimento obrigatório.

Termos e Condições Todos os comentários são mediados, pelo que a sua publicação pode demorar algum tempo. Os comentários enviados devem cumprir os critérios de publicação estabelecidos pela direcção de Informação da Renascença: não violar os princípios fundamentais dos Direitos do Homem; não ofender o bom nome de terceiros; não conter acusações sobre a vida privada de terceiros; não conter linguagem imprópria. Os comentários que desrespeitarem estes pontos não serão publicados.