30 abr, 2025
A 30 de abril de 1945 - há exatamente 80 anos - o chanceler nazi Adolf Hitler entregou os restos do outrora altivo III Reich à sua sorte e cometeu suicídio, com um tiro de pistola, no bunker da chancelaria em Berlim, depois de obrigar a mulher, Eva Braun, com quem casara na véspera, a cometer idêntico fim, ela mordendo uma cápsula de cianeto. Uma semana depois, a 7 de maio, em Reims, Karl Dönitz e Alfred Jodl assinaram a rendição incondicional da Alemanha, lançando a Europa e o mundo no júbilo do «V-Day», o Dia da Vitória (mesmo que ainda faltasse derrotar o Japão).
Os seis anos da II Guerra Mundial foram a maior barbárie bélica da história da humanidade: 60 milhões de mortos, incontáveis feridos, destruição generalizada de cidades, regiões e países inteiros, deslocações maciças de população e destruição de fronteiras, fora o crime genocida do Holocausto (só a Polónia perdeu 17% da sua população!). Os horrores do conflito revelaram-se então aos olhos do mundo - o exército vermelho libertara Auschwitz em janeiro de 1945; ingleses e americanos alcançaram Bergen-Belsen, Dachau ou Buchenwald em março e abril. Na hora mais negra da humanidade, vencedores e vencidos proclamaram «Nunca Mais!», jurando que a nova ordem internacional teria de ter mecanismos que evitassem novas guerras, sobretudo à escala de 1939-1945, ou 1914-1918. No mais vencido dos países vencidos - a Alemanha - nada mais havia, para sobreviver, do que vasculhar por alguma coisa entre o entulho. O futuro Chanceler da RFA e da Alemanha reunificada, Helmut Khöl, que tinha ao tempo 15 anos, recordaria os dias de 1945-46 em que não se levantava da cama, pois não havia lenha para aquecer a casa, nem alimento para suster o corpo. Conforme Roberto Rosselini imortalizou no cinema, a antiga pátria de Hitler estava a viver, como num purgatório, o seu «Ano Zero», a sua «Stunde Null». Dos escombros, nasceria um “milagre” económico chamado RFA (contrastando com a RDA cinzenta e comunista), e de um continente destruído e mergulhado no abismo nasceria, como antídoto para novas guerras, uma comunidade europeia de democracias, mediante os dólares norte-americanos do Plano Marshall, a reconciliação franco-alemã da CECA e a criação e alargamento da CEE, a partir dos anos 1950, naquela parte da Europa que teve a sorte de ficar para cá da «Cortina de Ferro».
Os historiadores são claros na importância crucial de 1945 e depois. Uma longa história de guerras entre povos, nações e impérios deu finalmente lugar a décadas de paz no mais complexo continente do mundo. E o “post-War” tornou-se depois, a partir de 1989, um “post-Wall”, quando a queda do Muro de Berlim (e a implosão da URSS) reforçou a crença de que a guerra ficara lá atrás, como recordação de um passado longínquo e não repetível. 80 anos depois dessa «Hora Zero», a guerra está de volta às fronteiras e ao território da Europa. Karl Marx acrescentou ao enunciado de Hegel, de que a História se repete, pelo menos, duas vezes, a ideia de que ela acontece primeiro como tragédia e depois como farsa. No atual troar de canhões, não há muita farsa e pode haver grande tragédia. 1945 ensinou aos que o viveram o que os que hoje decidem já esqueceram, a saber (e cito Timothy Garton Ash), que “os seres humanos nunca conseguiram construir o paraíso na terra, mesmo - talvez em especial - quando tentaram, mas construíram repetidamente o inferno na terra. Na primeira metade do século XX, foi o que os europeus fizeram ao seu próprio continente. Não foram outros que o fizeram por nós. Foi a barbárie europeia, cometida por europeus contra europeus”. O que farão os europeus e quem cobiça partes da Europa na primeira metade do século XXI? Copiaremos o abismo ou a redenção?