05 mai, 2025
À entrada para a campanha eleitoral teremos quase todos, por um lado, aquela sensação "Como? Só agora é que vai começar a campanha?" e, por outro, a noção clara de que alguns temas relevantes não merecerão o cuidado necessário.
Uma e outra coisa são parte e consequência de um ciclo de momentos políticos cada vez mais acelerado que é ele próprio irmão gémeo de uma aceleração na produção de momentos mediáticos. Tudo é importante (geralmente grave, muito grave) num instante e parece quase esquecido no instante seguinte, quando tanto agentes políticos como empresas jornalísticas - sobretudo os canais televisivos em ciclo contínuo (que, num país com audiências e mercado publicitário limitadíssimos são, ainda assim, cinco!) - mudam para a coisa seguinte. Neste enquadramento, já tivemos (e continuaremos a ter) uma sequência de debates com um formato muito particular - a meio caminho entre os territórios da informação e do entretenimento - em que representantes das forças políticas se confrontam em ambiente de pressão (aqueles cronómetros sempre a dar, a dar) e na esperança de ganhar o apreço dos painéis de comentadores logo a seguir; "o importante é que a minha ‘boca’ seja mais forte do que a tua". A isto juntar-se-á, certamente, um dilúvio de sondagens, complementado por "sondagens de sondagens" e por resultados de oscilações diárias numa "tracking poll" com 200 opiniões diferentes a cada edição. E teremos (já estamos a ter), de novo, as entrevistas a programas de entretenimento e a produtores de conteúdos digitais, combinadas com as analógicas visitas relâmpago a "lugares" visualmente impactantes (normalmente, feiras, fábricas, escolas, centros de saúde, ruas emblemáticas de cidades).
Quem justifica todos estes formatos performativos e alinhados com lógicas de produção de surpresa a um ritmo intenso aponta o dedo a outras geografias em que tudo é semelhante. Estaremos, aceita-se, alinhados com as práticas de outros países, mas isso não quererá forçosamente dizer que estamos todos a dar contributos positivos para o fortalecimento do sistema democrático. Nalguns desses mesmos países (e também por cá) já se estuda um fenómeno crescente designado por "fuga às notícias" (news avoidance) - cada vez mais pessoas rejeitam a validade, para as suas vidas, de informação baseada, sobretudo, em "ruído". O afastamento deliberado dos fluxos informativos não terá necessariamente reflexo direto no nível de envolvimento na vida política do país, mas pode ser um fator a considerar.
Haverá, no período que agora se inicia, pendências da pré-campanha que vão, certamente, "andar por aí". Algumas, previsíveis, como as fragilidades no setor da Saúde, a crise na Habitação ou, sobretudo, as apreciações sobre o comportamento ético do primeiro-ministro por relação com o caso da sua empresa familiar (que estão, no fundo, na origem destas eleições antecipadas). Outras, resultantes de imprevistos, como foi o apagão da última segunda-feira de abril. Não é questionável a sua relevância, mas é possível que a combinação entre as estratégias de Comunicação Política dos partidos e as estratégias de maximização de atenção das empresas jornalísticas aponte o nosso olhar apenas para questões acessórias (como aconteceu, por exemplo, há dias, na sequência das infelizes declarações de Hugo Carneiro, do PSD, sobre a necessidade de vigiar políticos e jornalistas). E, sem alternativa à vista, votaremos, todos, uma vez mais, sobretudo com base em perceções sedimentadas no tal "ruído". Até ao dia em que, por cansaço, possamos entender que não vale mais a pena prestar atenção.