01 abr, 2025 - 13:30 • Inês Braga Sampaio
João Félix é contratado, brilha na estreia, gera entusiasmo nos primeiros jogos, começa a cair de rendimento, perde importância nas opções do treinador, passa a aparecer somente em fogachos. João Félix sai para mais um clube, mais uma montanha-russa. Vira o disco e toca o mesmo, como dita a expressão popular; mudam as camisolas, as cores e os emblemas, mas a história é a mesma.
O último jogo do AC Milan, em que o avançado agora milita, terminou com uma derrota diante do Nápoles - e mais dúvidas em torno de Sérgio Conceição -, mas ficou igualmente marcado por um episódio curioso, revelado esta terça-feira.
À saída do túnel para os balneários, no final do intervalo, o internacional inglês Kyle Walker, um dos jogadores mais experientes do plantel, virou-se para João Félix e declarou: "Passa a bola, só. Não somos o Messi. Aqui não há Messi's."
A primeira história da carreira de João Félix já foi contada muitas vezes: apareceu que nem um cometa na segunda metade da época 2018/19; ajudou o Benfica de Bruno Lage a dar a volta ao campeonato e sagrar-se campeão; foi vendido nesse mesmo verão ao Atlético de Madrid, por 120 milhões de euros mais juros.
A promessa inicial foi-se esvanecendo ao longo das três temporadas e meia que João Félix passou em Madrid. Porque tinha escolhido o clube errado para as suas características, porque lhe pediam demasiado para defender e não o suficiente para atacar, porque estava preso a um sistema que não o favorecia, porque não tinha o perfil certo para os "colchoneros", porque Diego Simeone não o compreendia.
Seja qual for a razão, a verdade é que João Félix não conseguiu justificar o preço.
Começou, então, a sucessão de empréstimos. Na segunda metade de 2022/23, Félix foi cedido ao Chelsea, a troco de 11 milhões de euros. Nos primeiros 58 minutos da sua estreia, diante do Fulham, deixou os adeptos de água na boca - até que viu o cartão vermelho direto por uma entrada perigosa e os "blues" perderam, por 2-1.
Seguiu-se uma suspensão por três jogos. Quando regressou, salvou um empate contra o West Ham. Alguns jogos mais tarde, após fogachos aqui e ali, foi substituído ao intervalo de uma vitória sobre o Leicester.
João Félix terminou a temporada com quatro golos em 20 jogos, 14 deles como titular, num clube em caos. Muitos jogos espelharam aqueles seis meses: um arranque forte, a prometer grandes coisas, e depois o apagão.
Mas o Chelsea era um clube em pleno naufrágio, com demasiadas trocas de treinadores, a mudar de mãos depois de a invasão da Rússia à Ucrânia ter obrigado Roman Abramovich a vender o clube, e com um plantel que crescia a cada janela de mercado e teimava em não encolher. Ainda assim, fossem quais fossem as razões, a verdade é que o Chelsea não ficou com o internacional português.
"Fomos informados de que [Mauricio] Pochettino [então novo treinador dos "blues"] não conta com João Félix. Ele vai regressar, veremos. Não temos nada planeado", disse na altura o presidente do Atlético de Madrid, Enrique Cerezo.
Chegou, então, o clube de sonho de João Félix e aquele que muitos prediziam ser o contexto ideal para o seu perfil: o Barcelona. Desta vez, por uma época inteira.
Mais uma vez, o avançado começou forte, com três golos e duas assistências nos primeiros quatro encontros. Porém, a intermitência de épocas anteriores persistiu. Alternava jogos de grande brilho com outros em que mal se via e, nas últimas dez partidas em que participou, foi suplente em nove. E só marcou em uma.
Finalizou a temporada com dez golos e seis assistências em 44 jogos. Deixou sede de mais. Como antes, o clube era um caos: novo presidente, problemas financeiros, treinador que ia sair mas afinal ficava, mas depois saiu mesmo, o talento de "La Masia" chamado Lamine Yamal que despontava e lhe tirava espaço. Entre tantas possíveis razões, a verdade foi uma: o Barcelona não quis ficar com João Félix.
Havia outro problema: as celebrações efusivas dos golos que marcou ao Atlético - em ambas as voltas do campeonato - inviabilizavam o regresso.
Quem ficara com água na boca era o Chelsea, que esta temporada o fez regressar, e em definitivo, com contrato válido para sete épocas. Embora os valores da compra não tenham sido revelados, a imprensa inglesa falava em 50 milhões de euros. João Félix estava, finalmente, livre do Atlético de Madrid, para voltar a sorrir.
No entanto, como avisava a BBC, este Chelsea não era diferente do que o português encontrara ano e meio atrás. O plantel continua a inchar, em especial com avançados. Não há política de contratações à vista para lá de comprar em catadupa. E quando Félix chegou, após estreia a marcar na Premier League, ficou também claro que não tinha a plena confiança de Enzo Maresca, que lhe dava a titularidade quase exclusivamente na Liga Conferência. Ainda assim, o "14" registou sete golos e duas assistências em 20 jogos nos primeiros seis meses.
O Chelsea contratou dois avançados portugueses para esta época: João Félix e Pedro Neto. O ex-Sporting de Braga lá continua. Em janeiro, o ex-Benfica foi emprestado ao AC Milan, de Sérgio Conceição, em busca de minutos de jogo.
A história repetiu-se, em Itália, e mesmo com um treinador português ao leme.
João Félix estreou-se com um golo. A tapeçaria já se entrelaça sozinha: depois de seis jogos a titular - dos quais o Milan venceu dois, empatou um e perdeu três, e em que Félix não marcou e assistiu -, Conceição relegou o amigo do seu filho Rodrigo para o banco. E a imprensa italiana, que se apaixonara pelo talento do internacional português nos primeiros jogos, já questiona a sua contratação.
"Aos 25 anos, o rótulo de jovem promessa já lá vai", escreveu Afonso Cabral, comentador de desporto da Renascença, quando João Félix se mudou para Milão. E vai ficando cada vez mais distante e a afirmação plena tarda e tarda e tarda.
Quando tinha 22 anos e estava ainda no Atlético de Madrid, João Félix definiu três metas para a carreira. "Ganhar a Liga dos Campeões, ganhar um Mundial ou um Europeu com Portugal, e, claro, a Bola de Ouro", disse. Aos 25 anos, o avançado tem ainda muito tempo de carreira pela frente, e as razões para esta ou aquela aventura não ter funcionado empilham-se, no entanto, a cada ano que passa sem que consiga afirmar-se em pleno, tais metas parecem ficar cada vez mais distantes.
Esta terça-feira, o jornalista Fabrizio Romano adianta que João Félix não continuará no Milan, que o devolverá ao Chelsea. A cada clube e a cada montanha-russa, a cada nova camisola e novo emblema, a história repete-se.