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Entrevista Bola Branca

Nuno Lobo: "Há uma cultura de medo. Pessoas da minha lista foram ameaçadas"

04 fev, 2025 - 07:30 • Rui Viegas

O ainda presidente da Associação de Lisboa quer suceder a Fernando Gomes na FPF. Para o efeito, terá de bater nas eleições de dia 14 Pedro Proença, a quem acusa de ser um “catavento” e de “esconder alguma coisa” por não querer debater.

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Entrevista a Nuno Lobo
Entrevista a Nuno Lobo

Nuno Lobo, 47 anos, advogado, lidera a Associação de Futebol de Lisboa desde 2013 e em outubro passado apresentou oficialmente a candidatura à presidência da Federação Portuguesa de Futebol para as eleições de dia 14.

Em entrevista à Renascença, o dirigente chama “catavento” a Proença e recusa a ideia de unanimismo à volta da candidatura do rival, que estará a influenciar a eleição da Liga Portugal, acusa. Fala em “medo” e “receio”, garante até a esta rádio que os seus apoiantes foram “coagidos" e “ameaçados", dando conta ainda de que apresentou provas ao Ministério Público de que foi seguido e fotografado.

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Lobo pensa no Jamor como a “principal casa” da federação e promete uma cidade do futebol no norte do país. Sobre a ausência de um debate entre os candidatos, Nuno Lobo só vê uma razão: "Quem tem medo de debater não é democrata. Quem tem medo de debater esconde alguma coisa..."

Começaria pelo facto de Fernando Gomes, a quem o senhor quer suceder, ter indicado recentemente o seu adversário nestas eleições, Pedro Proença, para o Comité Executivo da UEFA. Como é que olha para esta indigitação?
Fui informado pelo Fernando Gomes que a UEFA, na eleição que vai ter para o Comité Executivo em abril, tinha dado um prazo a todas as federações nacionais para que até ao dia 3 de fevereiro indicassem um representante para ir a eleições em abril. Ou seja, não é uma nomeação, é apenas uma candidatura para estar num dos lugares da UEFA. E Pedro Proença era o único elemento da direção que preenchia esses requisitos.

Porquê?
Porque está na direção da federação, numa posição inerente enquanto presidente da Liga. Portanto, Fernando Gomes não tinha outra hipótese. Agora, vejo isto de uma forma muito clara: demonstra muito daquilo que é o percurso de Pedro Proença no futebol. Um catavento do dirigismo desportivo. Quer estar na Liga, quer estar na federação, quer estar na European Leagues, quer estar na UEFA e, segundo se diz, também já quer estar na FIFA.

...
Vejo isso com alguma estupefação, mas também com alguma tristeza. E a minha posição aqui é absolutamente clara. No dia 14 de fevereiro, depois de ser eleito presidente da federação, vou pedir à UEFA, dadas as circunstâncias excecionais de uma eleição federativa aqui em Portugal, que me possa substituir nesta indicação à eleição. Se a UEFA assim não o entender, eu próprio irei retirar a candidatura de Pedro Proença ao Comité Executivo da UEFA.

Diz que Fernando Gomes não tinha outra alternativa, mas apesar disso, apesar dessa legitimidade em fazê-lo, não acha que aos olhos da opinião pública acaba por haver aqui um favorecimento?
Julgo que não. Fernando Gomes nada podia fazer, até porque é o próprio Pedro Proença que se autopropõe. Não vejo isto como algo que Fernando Gomes quisesse, mas algo a que Fernando Gomes foi obrigado.

Descendo, então, meramente ao plano mais doméstico, fica-se um pouco com a ideia de que há uma unanimidade em volta do seu adversário nestas eleições…
Não, de forma alguma. O que vou vendo naquilo que é o percorrer dos 84 legados, o percorrer das associações distritais, o percorrer das associações de classe, o percorrer dos clubes profissionais, é muito diferente daquilo que é unanimidade ou unanimismo na candidatura de Pedro Proença. Muito longe disso. Agora, há aqui algo que é absolutamente inequívoco. As pessoas têm medo, têm receio. Há uma cultura de medo e de receio. Porventura, as pessoas têm algum receio de confrontar alguém que está a liderar uma instituição, designadamente a Liga. Esta candidatura enfrenta permanentemente aquilo que é o poder instituído do futebol em Portugal.

Está convicto que, no silêncio das urnas, poderá a sua candidatura tirar vantagem? É isso também que podemos deduzir?
Sim. Primeiro ponto, tive as subscrições mínimas para ir a votos. E, agora, estou convicto que, no silêncio da urna, naquele que é o último reduto da democracia, vão fazer uma ponderação e vão perceber o que é que é melhor, efetivamente, para o futebol português. Portanto, conto ser eleito presidente da federação.

O que seria uma surpresa?
O futebol português tem sido muito fértil em surpresas eleitorais. Recordo que nos últimos dois atos eleitorais da Liga, com dois candidatos, em 2011 António Laranjo perdeu as eleições para Mário Figueiredo. Depois, em 2015, com Luís Duque e Pedro Proença, Luís Duque tinha a unanimidade de praticamente todos os clubes e perdeu contra Pedro Proença. O futebol português tem-nos ensinado que é muito democrático naquilo que são eleições. Não será uma surpresa.

Nesta contagem de espingardas, seja numa eleição no âmbito desportivo, seja no plano político-partidário – e esse é um plano a que Nuno Lobo também está habituado –, teve recentemente um apoio público manifestado pelo Vitória de Guimarães. Não é pouco?
Lá está, é aquilo que estava a dizer. É preciso ter coragem e o Vitória e o seu presidente tiveram a coragem de publicamente dizerem aquilo que outros dizem e pensam somente em privado. Há esta dificuldade de assumir uma posição de rutura e é o momento certo para que as pessoas digam “basta", “chega”.

Quem foram os outros clubes que manifestaram esse apoio em privado?
Foram muitos, foram muitos. Convictamente acreditam na minha equipa, no meu projeto.

E quais são as dores desses clubes?
As dificuldades que os clubes têm. Os clubes profissionais, por exemplo, estão bem pior do que estavam em 2015, quando Pedro Proença assumiu a Liga. Tenho dito muitas vezes que sou a continuidade de Fernando Gomes, mas com um programa reformista e inovador em comparação com aquilo que considero que foi feito menos bem por parte de Fernando Gomes.

Já vamos falar de Fernando Gomes também, porque, ao fim e ao cabo, foram muitos anos de mandato. Todavia, ainda em relação a Pedro Proença, li recentemente que o Nuno Lobo considera que o presidente da Liga tem receio de debater consigo. Não vão debater?
Eu queria muito. Aliás, fiz um pedido institucional à Comissão Eleitoral da Federação para que pudéssemos debater com Pedro Proença. Esse convite foi-lhe transmitido já pelo presidente da Comissão Eleitoral, José Luís Arnaut, e 15 dias depois ainda não há sequer uma resposta negativa. Quem tem medo de debater não é democrata. Quem tem medo de debater esconde alguma coisa. É no debate que surgem as linhas diferenciadoras de cada um. E, portanto, gostava muito que Pedro Proença viesse à terra, viesse à mesa comigo, para que pudéssemos confrontar as ideias daquilo que cada um preconiza. Deve estar com medo.

Pedro Proença disse recentemente também que, sendo o presidente da Liga, não iria intervir nas próximas eleições da Liga Portugal. Acredita que isso vai acontecer?
Vou ser muito claro: nenhum presidente de uma instituição deve meter-se ativamente naquilo que é a escolha futura do líder dessa instituição. Há uma coisa que é certa. Se eu ganhar as eleições no dia 14 de fevereiro, Pedro Proença não tem condições políticas para continuar na Liga. E, portanto, eu próprio no dia 14 à noite irei pedir responsabilidades ao presidente da Liga e espero que ele se demita. Aquilo que tenho a perceção é que Pedro Proença anda a fazer contactos para apoiar determinados candidatos. Acho que ele não o devia fazer. Acho que o está a fazer.

O que está a dizer é que Pedro Proença está a influenciar de facto?
A perceção que tenho e o conhecimento que tenho é que sim. Determinados candidatos. Mais do que um até, o que é uma questão até estranha.

A questão dos direitos televisivos é importantíssima, neste momento, no futebol português. Qual será o trabalho da sua federação neste âmbito?
Terei um papel muito ativo. Aliás, a proposta final terá que ser entregue ao presidente da federação para que este a possa entregar ao Governo. Esse é, talvez, o processo-chave daquilo que será o futebol português nos próximos anos. Serei um ator muito, muito, muito ativo. Até porque hoje não há qualquer processo de centralização. Há um conjunto de estudos, feitos por consultoras, pagos a peso de ouro.

...
Mas não há um dirigente, um presidente de clube que me possa dizer quanto é que vai ganhar. Não há valores. Não há nada. E, portanto, sendo a centralização uma mão cheia de nada, queria, obviamente, ser um ator-chave naquilo que é sentar [à mesa] com os clubes, dialogar com os clubes, dialogar com a Liga. Para que possamos efetivamente ter aquilo que será uma bomba atómica no futebol pela positiva. Ou seja, este processo de centralização, se for efetivamente feito e bem feito, pode, efetivamente, catapultar o futebol português para outros patamares.

Fernando Gomes esteve três mandatos na presidência da Federação Portuguesa de Futebol, desde 2011. No plano meramente desportivo, digamos que esses seus mandatos tiveram uma figura de cartaz chamada Cristiano Ronaldo. Como é que, consigo, vai ser a despedida de Ronaldo?
Vamos ver. Ainda não está nada marcado. Acho que Cristiano Ronaldo ainda pode dar muito ao futebol português. O futebol português tem que agradecer muito a Cristiano Ronaldo. Não só naquilo que foi a vertente desportiva, mas, sobretudo, e temos que o dizer, naquilo que foi a sua ajuda para que a federação pudesse hoje financeiramente ser o que é. Quando, no meu mandato, Cristiano Ronaldo sair, terá a homenagem que merecerá. Agora, não tenho nada em concreto… ainda conto com Cristiano Ronaldo. Quero estar em março com ele na Dinamarca e quero estar no próximo Mundial com ele.

Fernando Gomes foi sempre muito elogiado pelo seu trabalho na federação. Qual é o balanço que o Nuno Lobo faz deste desempenho ao fim de três mandatos?
Muito bom. Fernando Gomes é o melhor presidente da federação nos 110 anos que tem esta instituição. É um presidente completo. E vai ser muito difícil igualar o trabalho dele.

Mas há espaço para crescer ainda?
Claro que sim. Há espaço para crescer não só naquilo que é o aumento de praticantes, o aumento da nossa competitividade nos campeonatos, as vitórias das nossas seleções, em termos de infraestruturas. Tenho esta proposta para fazer uma cidade do futebol a norte. Ou seja, há sempre espaço e há muito ainda para crescer, sendo que temos que ser gratos àquilo que Fernando Gomes nos deixa. Uma federação inigualável em comparação com 2011 e sobretudo uma federação preparada para os próximos desafios. Designadamente, aquele que nós queremos que seja o melhor Mundial de sempre, o de 2030 [organizado por Portugal, Espanha e Marrocos].

Num âmbito mais governamental, mas naturalmente com dedo federativo, o projeto de remodelação do Estádio Nacional resume-se a pouco mais do que uma cobertura. Vai reformular este projeto?
Gostava muito de manter aquilo que é o projeto original, mas sobretudo gostava muito de complementar aquilo que é esse projeto. Naquilo que são as condições. Não só de funcionamento como de segurança. E digo-lhe já, Rui, que o Jamor, para mim, será a principal casa da federação. Nos próximos quatro anos, a final da Taça de Portugal vai manter-se no Jamor. Agora, efetivamente, o projeto não é aquele que nós preconizamos e portanto, com o Governo, vou tentar reformular e acrescentar valor àquilo que já é um bom início.

Parece-lhe curto o que viu?
Parece-me um bocadinho curto. Já é bom para aquilo que temos, mas falta mais.

Tenho duas perguntas finais para lhe fazer, mais num plano pessoal. A 5 de dezembro último apresentou uma queixa contra desconhecidos por espionagem e escutas ilegais, no âmbito já desta disputa eleitoral. Como é que está este processo?
Fui constatando que a todos os sítios onde ia, havia fotografias. Ou antecipadamente as pessoas sabiam que eu estava nesses locais. Almoços, jantares… Nos locais inclusive onde não estava em campanha e pertenciam à minha vida privada, havia fotografias a circular na ‘net’. Sei que fui seguido, tenho essas provas, apresentei-as ao Ministério Público e aguardo.

Relaciona essa sua suspeita com o facto de ter entrado nesta corrida eleitoral à Federação Portuguesa de Futebol?
Julgo que sim, porque os registos fotográficos da minha pessoa incidem naquilo que são os contactos da minha candidatura.

Para terminar, admite desistir ou vai até ao fim?
Vou até ao fim! Tudo fizeram para que não chegasse aqui. Houve pessoas da minha lista, subscritores da minha lista, que foram pressionados, ameaçados, coagidos a não pertencerem à minha lista e sobretudo a não apoiarem a minha lista.

Por quem? Por elementos afectos à lista adversária?
Não queria ser tão incisivo, mas o tal sistema queria que houvesse uma passadeira vermelha para o candidato que hoje enfrento nas urnas.

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