18 out, 2025 - 08:00 • Sandra Afonso , Arsénio Reis
O socialista Álvaro Beleza acredita que os portugueses vão eleger António José Seguro nas eleições presidenciais do próximo ano, para impedir o domínio total do PSD em Portugal. "É hoje o único candidato à esquerda que tem hipótese de ter apoios de gente que não votou PS", defende.
Em entrevista ao programa Dúvidas Públicas, da Renascença, o presidente da SEDES - Associação para o Desenvolvimento Económico e Social considera que Seguro será um "árbitro que garanta independência e isenção", num país que virou à direita no Governo, no Parlamento, nas autarquias e nas regiões autónomas.
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A Comissão Nacional do PS reúne-se este domingo, em Penafiel, num encontro onde vai ser discutido o apoio à candidatura presidencial de António José Seguro.
O ex-secretário-geral socialista conta com o apoio de vários membros do partido, alguns fizeram mesmo questão de marcar presença na apresentação da candidatura, há quatro meses.
Na altura ainda estavam em cima da mesa vários nomes, como eventuais candidatos a Belém, dentro da família socialista. Neste momento, Seguro é o único socialista candidato a substituir Marcelo Rebelo de Sousa.
Álvaro Beleza, membro da comissão política do PS, acredita que o partido vai unir-se no apoio à candidatura de António José Seguro.
"Eu entrei no PS há 40 anos. Apoiei Mário Soares, que tinha grande parte do PS e a direção contra ele, ganhou e foi Presidente da República. Porquê? Porque era o único da esquerda que conseguia entrar à direita. Isto é uma questão até de matemática. Hoje é a mesma razão que vai levar à vitória de António José Seguro".
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Acrescenta ainda que Seguro "é hoje o único dos candidatos à esquerda que tem hipótese de ter apoios de gente que não votou PS ou da esquerda que vota, nomeadamente, no PPD, ou no CDS e noutros partidos liberais".
"Para Presidente da República tem que ter 51% dos votos, não pode ter só os votos do PS, ainda por cima hoje, que a esquerda é mais pequena do que era há 40 anos, no tempo do Mário Soares", explica.
Álvaro Beleza acredita ainda que Seguro será eleito pelo povo, para impedir que o PSD controle todas as posições de poder no país. Na eventualidade de Marques Mendes vencer as presidenciais, o PSD voltaria a garantir o sonho de Sá Carneiro: "uma maioria, um Governo e um Presidente", além dos governos regionais e da presidência da maioria dos municípios.
"Essa é uma das razões porque eu acho que vai ganhar. O António José Seguro vai ser eleito Presidente. Os portugueses são muito sensatos na escolha do voto e é evidente que o país está muito desequilibrado, está demasiado desequilibrado. Todos os órgãos de poder estão à direita, todos", sublinha o socialista. "Os portugueses querem na Presidência um árbitro que garanta independência e isenção, mas que também tenha experiência, que conheçam ao longo de décadas", acrescenta.
Para o presidente da SEDES, nas presidenciais os eleitores vão preferir um "árbitro", resta saber qual será o melhor.
"Eu acho que para ser um bom árbitro é bom que esteja no ramo, há muitos anos. O Presidente da República é o mais alto responsável à frente de um país. Acho que a experiência política é importante. Acho que é bom manter uma república civil e os partidos políticos são centrais na democracia. Essa conversa contra os partidos, acima dos partidos... Não há democracia sem partidos, nem acima nem ao lado!", garante.
Álvaro Beleza comenta ainda aqueles que considera os três candidatos com possibilidade de serem eleitos nas presidenciais. Diz que se ganhar Marques Mendes, perde-se um bom comentador de televisão. Gouveia e Melo "fez mal" em recusar o convite para Chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas, porque também aí é preciso reformar. António José Seguro é "uma pessoa de confiança, previsível, um social-democrata".
É “indesculpável” se Portugal não aproveitar o bom momento económico para reformar, avisa o presidente da SEDES - Associação para o Desenvolvimento Económico e Social. Em entrevista ao programa Dúvidas Públicas, da Renascença, Álvaro Beleza lembra que o país atravessa um ciclo muito favorável, mas "normalmente somos bons a gerir a pobreza e a bancarrota, somos maus a gerir a abundância".
O médico defende que "o Governo tem aqui uma obrigação de aproveitar" o atual momento, porque "nunca chegou tanta inteligência e gente qualificada, tanta intenção e investimento a Portugal, a economia portuguesa está a mudar, temos unicórnios, jovens fantásticos, se não aproveitarmos esta altura para fazer a reforma do Estado e a reforma Fiscal, que baixe a carga fiscal, quando é que vamos fazer?", questiona. "Isto não vai ser bom sempre", reforça.
Além das reformas do Estado e da justiça, o presidente da SEDES sublinha a necessidade de uma reforma fiscal, que simplifique e baixe os impostos, uma bandeira que a associação tem vindo a defender há vários anos, com o apoio de cada vez mais personalidades, incluindo antigos e atuais governantes.
A SEDES defende uma reforma para "simplificar processos, torná-los mais escrutinados e mais simples, e que permita diminuir a carga fiscal para as empresas e para as pessoas", explica.
"Nós temos que baixar a carga fiscal de forma consistente, para não pôr em causa as finanças públicas, acabar com uma data de escalões, temos escalões a mais, temos benefícios fiscais a mais. Isso ajuda a quem? Os escritórios de advogados e as grandes empresas? Os pequenos, não. Nós temos 500 e tal benefícios fiscais, alguns nem se sabe para quê", diz.
No IRC, lembra que "precisamos de um imposto competitivo, que não temos. Não só com os países de Leste como com aqueles que competem connosco da nossa dimensão: Irlanda ou Holanda do lado de cá, República Checa e outros".
Nesta matéria Álvaro Beleza, que está na Comissão Política do PS, assume que rema contra o partido. "Ao contrário do que muitos economistas andam a dizer, é evidente que o IRC mais baixos torna o país mais competitivo internacionalmente". Mas não defende apenas a redução da taxa principal, que o Governo decidiu baixar em um ponto percentual para 19% em 2026.
Para Álvaro Beleza, o IRC tem de "deixar de ser progressivo, enquanto que os impostos sobre as pessoas devem ser progressivos". Nas empresas esse efeito é "perverso", funciona ao contrário, explica. Quanto maiores são as empresas, mais impostos pagam, o que incentiva a que se dividam, em vez de ganharem escala.
Defende ainda que "há condições para subir mais" o salário mínimo. O Governo e os parceiros sociais continuam a discutir o aumento de rendimentos para o próximo ano, como o salário mínimo nacional ou os aumentos da função pública, que servem depois de referencial para o setor privado.
Álvaro Beleza diz que "nós já temos economia e os empresários portugueses já têm capacidade para pagar mais e melhor. Em Portugal paga-se pouco", defende. "O Dr. Salazar ainda está cá muito presente no país e ainda temos aqui umas doenças do antigo regime: o corporativismo, a ideia da quinta, prefiro ter uma quinta que me juntar aos vizinhos e ter uma grande herdade, uma grande empresa. Pouca partilha e pouca ambição".
Não diz se considera um entrave à reforma laboral esta mentalidade do século passado. Neste tema o presidente da SEDES trava a fundo, defende que não é uma questão prioritária. "Acho que o Governo errou na prioridade. Eu não me metia por aí", diz.
Um dos verdadeiros problemas do país é a falta de habitação, diz, e para o resolver é preciso que o Estado incentive a habitação pública. "Eu punha as fichas todas em construir habitação pública para jovens portugueses que queiram cá ficar, temos que atrair os nossos jovens, e para arrendamento. Não é para vender. Esta ideia de que toda a gente tem que ser proprietário de uma casa até é anti económica, porque a economia hoje é global e é flexível", explica.
Álvaro Beleza aponta três prioridades: creches gratuitas, porque é ali que começa o elevador social; casas para estudantes, "os pais fazem um esforço brutal e se calhar essa também foi uma das razões por que diminuíram os estudantes no ensino superior"; e a terceira é investimento público em habitação.
A SEDES prepara-se ainda para promover em abril do próximo ano, em que se celebram os 50 anos da aprovação da Constituição Portuguesa, a reforma da descentralização do poder. "Nós temos que ter poder local com escala e regiões, isto é, as câmaras municipais, por si só, não tem escala para gerir assuntos que deveriam gerir". Este é o momento, "o país está maduro o suficiente para fazer isso, que está na Constituição. Não é preciso rever a Constituição", explica.
Ao longo desta entrevista ao programa Dúvidas Públicas, o presidente da SEDES critica várias vezes a falta de ambição da proposta de Orçamento do Estado para 2026, apresentada pelo Governo. No entanto, concorda com o atual formato, despido de grandes medidas políticas.
"O Orçamento é para prever a despesa e a receita do próximo ano. Depois, à parte, tem que se discutir as grandes reformas de fundo", explica. Esta foi, aliás, uma das exigências do PS, para negociar com o Governo a viabilização do Orçamento no parlamento.
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O secretário-geral socialista, José Luís Carneiro, já anunciou a abstenção do partido, o que garante a viabilização do Orçamento do Estado para 2026. Isto apesar de considerar o documento "vazio", "sem estratégia" e "sem medidas de apoio às famílias e empresas". Álvaro Beleza concorda.
"Não queremos fazer parte do problema, neste caso, de uma crise política", explica. Diz ainda que é uma decisão "inteligente", porque "também não é por nós que o PSD se deita com o chega". Além disso, "permite ao PSD poder acordar com o PS medidas importantes e eu como sou muito do centro esquerda, mas ao centro, acho que o país só ganha com isso", refere.
Questionado sobre se o PS não arrisca perder esta potencial vantagem, caso o Chega também viabilize o próximo Orçamento do Estado, Álvaro Beleza diz que o partido de André Ventura "não me interessa minimamente".
"Preocupo-me com o PS e o PSD, porque são os grandes partidos do regime e fiquei muito satisfeito nas eleições autárquicas. Ao contrário do que andavam aí a dizer, em Portugal não há três blocos como em França. Há dois, liderados pelo PS e pelo PSD."
Ainda assim, admite que o resultado eleitoral das autárquicas teve algum sabor amargo. "Eu acho que a ambição é muito importante e não gosto de perder nem a feijões", diz. "O PS perdeu", admite. "O objetivo do PS quando vai a eleições é ganhar. Perdeu a Associação de Municípios. Portanto, o resultado nesse aspeto é um mau resultado".
Álvaro Beleza, presidente da Associação para o Desenvolvimento Económico e Social e membro da comissão política do PS, é o entrevistado deste sábado do Dúvidas Públicas. Um programa que pode ouvir em antena aos sábados, a partir do meio dia, ou a qualquer momento no site, em podcast ou no YouTube.