Podcast Igreja e Liberdade - Episódio 2

Quando o cardeal Cerejeira incentivou os jovens a contornar a censura

17 out, 2025 - 06:30 • Ana Catarina André

No segundo episódio de “Igreja e Liberdade”, Helena Roseta recorda o apoio que o então patriarca de Lisboa deu aos jovens da Ação Católica que queriam denunciar a falta de informação sobre as cheias de 1967. Conheça esta e outras histórias neste trabalho com coordenação científica de Paula Borges Santos, numa parceria com o IPRI – Instituto Português de Relações Internacionais.

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Episódio 2: Ver, Julgar e Agir

Naquela noite de 25 para 26 de novembro de 1967, não se sabe exatamente quantas pessoas morreram na região da Grande Lisboa. A água e a lama destruíram 20 mil casas e arrasaram bairros e aldeias em concelhos como Vila Franca de Xira, Loures e Cascais. Em pouco tempo, as cheias mobilizaram milhares de jovens, entre os quais mais de 2.500 da Ação Católica, uma organização da Igreja da qual fazia parte, por exemplo, a Juventude Escolar Católica (JEC) e a Juventude Universitária Católica (JUC).

“Havia brigadas de estudantes a ir trabalhar para os bairros [afetados]. Os de medicina iam vacinar, iam tratar das pessoas com doenças, os outros iam limpar a lama, fazer esses trabalhos todos”, recorda Helena Roseta, então uma jovem estudante de arquitetura.

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Enquanto ajudavam as populações e procuravam mitigar os efeitos da tragédia, os jovens aperceberam-se que o Governo liderado por Salazar queria conter e limitar a informação que circulava sobre a tragédia – oficialmente morreram 462 pessoas, mas sabe-se que o número pode ter chegado aos 700.

“Os jornais não publicavam os comunicados das associações de estudantes. O presidente nacional da JUC era, na altura, o meu namorado, mais tarde meu marido, Pedro Roseta, e da JUC feminina era a Manuela Eanes. Entenderam-se os dois para tomar uma posição clara contra esta coisa abusiva de não se poder dizer a verdade sobre um desastre monumental”.

Em conjunto, Manuela Eanes, que depois do 25 de Abril se tornaria primeira-dama, e Pedro Roseta, mais tarde ministro da Cultura, decidiram criar um caderno de reflexão sobre a catástrofe e comunicaram a sua intenção ao patriarca de Lisboa, o cardeal Manuel Gonçalves Cerejeira. “O Pedro [Roseta] tinha acesso ao cardeal e explicou-lhes o que se passava e ele deu-lhes força e disse: ‘Avancem. O que é verdade tem de ser posto cá fora’.”

Nesse caderno, Helena Roseta entrevistava os arquitetos Nuno Portas e Gonçalo Ribeiro Telles que explicavam a devastação causada pelas cheias. “As pessoas construíam nas zonas mais escondidas, muitas vezes nos vales, e essa é que foi a desgraça. Os vales são inundados. Não acontece nada a quem está no topo. A explicação é que isto era uma consequência de um sistema social e económico injusto”, diz Helena Roseta em entrevista à Renascença.

Esta é uma das histórias que a arquiteta recorda no segundo episódio do podcast “Igreja e Liberdade” sobre o papel da Ação Católica na formação de milhares de jovens portugueses na segunda metade do século XX.

Além de Helena Roseta, este episódio conta com os testemunhos de António Matos Ferreira e dos padres António Janela e Joaquim Batalha. Este trabalho tem coordenação científica de Paula Borges Santos, numa parceria com o IPRI – Instituto Português de Relações Internacionais.

Ao longo de cinco episódios, saiba mais sobre a luta dos cristãos contra a guerra colonial e contra a ditadura e explore outros temas como o legado do episcopado na adaptação da Igreja à democracia e as relações que os católicos estabeleceram com o Estado português e com os partidos políticos.

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