Isto não é só Europa

Trump vai tirar 32 milhões novos empregos à UE?

03 mai, 2025 - 12:00 • Alexandre Abrantes Neves , Beatriz Martel Garcia (sonorização)

A UE lançou pacotes para aumentar a autonomia nas chamadas "matérias-primas críticas", mas as previsões podem ficar em risco com as tarifas de Trump. Vasco Becker-Weinberg, ex-eurodeputado do CDS-PP, alerta que a UE pode sair "indiscutivelmente" prejudicada. Já Francisco Ferreira da Zero pede maior coordenação para aumentar a reciclagem destas "matérias-primas essenciais".

A+ / A-
Trump vai tirar 32 milhões de novos empregos à UE?

A ideia era ambiciosa e ia colocar a Europa na rota da competitividade a nível mundial, mas está agora em risco graças à nova política alfandegária dos Estados Unidos. Até 2030, a União Europeia (UE) previa criar 32 milhões novos empregos e gerar um impacto económico na ordem dos biliões de euros. O objetivo passava por apostar em força num pacote que aumentasse a autonomia no que toca a “matérias-primas críticas” e reduzir a dependência que, atualmente, ronda os 65%.

As previsões eram animadoras e os primeiros projetos – que permitiam reduzir as importações de materiais essenciais à produção, por exemplo, de cosméticos, plásticos e fertilizantes – foram aprovados no início deste ano. Mas as tarifas de Donald Trump voltaram a trocar as voltas a Bruxelas.

Já segue a Informação da Renascença no WhatsApp? É só clicar aqui

“Acho que é extremamente imprevisível planear execução de objetivos a médio e longo prazo com base neste caminho irregular a que temos de nos habituar na administração de Trump”, começa por apontar Vasco Becker-Weinberg, antigo eurodeputado pelo CDS-PP e convidado no Isto não é Só Europa, uma parceria Renascença/EuranetPlus.

O também presidente do Instituto Português de Direito do Mar esclarece que a Europa “muito dificilmente” se tornará totalmente autónoma nestes materiais. Entre os países importadores, a China é um parceiro essencial – é, por exemplo, de Pequim que se importa a totalidade das chamadas terras raras pesadas. Por esta razão, Becker-Weinberg pede atenção se Trump e Xi Jinping não conseguirem chegar a acordo sobre as tarifas.

“Preocupa-me a relação difícil entre o dos Estados Unidos e aquele que é o nosso primeiro mercado de onde importamos matérias-primas críticas, que é a China. As últimas notícias são de que se vão sentar à mesa e conversar e, portanto, daí também pode vir uma luz ao fundo do túnel. Se não, vai indiscutivelmente [pesar-nos nos bolsos]”, alerta.

Nas medidas pensadas pela UE, entram também as famosas terras raras, que têm sido pedidas por Donald Trump como moeda de troca para garantir a paz na Ucrânia. Apesar de reforçar a posição norte-americana neste domínio, o acordo alcançado entre Washingthon e Kiev não deve pôr em causa os esforços de competitividade da EU: “Traz-nos previsibilidade, que é o melhor amigo do desenvolvimento”, acredita Becker-Weinberg.

Reciclagem tem de entrar na campanha

A lei das matérias-primas essenciais aprovada pela UE tem gerado críticas por parte de associações ambientalistas, principalmente por voltar a facilitar a mineração de solos. Para Francisco Ferreira da Zero, o equilíbrio é possível, mas é preciso que Bruxelas desenhe medidas mais ambiciosas e mais próximas da realidade nacional: “Nós estamos muito interessados na descarbonização, mas também na inovação. Não queremos depender apenas do lítio ou de determinados materiais que, se calhar, daqui a poucos anos vão ser substituídos por outros bem mais atrativos”, assinala.

Um dos pontos incluídos também na estratégia da Europa para aumentar a autonomia estratégia destas matérias-primas passa pelo incentivo à reciclagem – em 2021, em Portugal, apenas 21% dos resíduos foram reciclados, bem abaixo da meta de 65% definida a nível europeu.

Na perspetiva de Francisco Ferreira, Portugal tem sido um “mau aluno” na gestão de resíduos e na utilização de fundos europeus, que podiam ser utilizadas para substituir medidas poluentes (como a queima de resíduos) por outras mais ecológicas, como a recolha porta-a-porta. O presidente da Zero pede, por isso, aos líderes da AD e do PS para incluírem os temas ambientais na campanha.

“É só ler aquilo que são os princípios do Pacto Ecológico Europeu, os princípios da economia circular, e seguir os exemplos que nós temos tido a oportunidade de mostrar em alguns municípios, até de grande dimensão. A mensagem é muito simples: não vamos queimar resíduos, que é o mais anti economia circular, e vamos realmente ter uma solução que comprometa as várias partes”, apelou.

O centrista Becker-Weinberg discorda desta leitura e considera que é “evidente” que o atual governo está empenhado em melhorar a política ambiental portuguesa. O problema agora está, aponta, na dificuldade em conseguir incluir estes temas numa campanha que está preenchida pelas polémicas que levaram à queda do governo.

“A campanha está sequestrada por alguns temas que nós temos acompanhado. Julgo que o Francisco concorda comigo – ambos achamos que nunca se fala suficiente de ambiente. Era sempre bom podermos falar mais sobre ambiente, falarmos mais sobre sustentabilidade, também falarmos mais sobre mar”, afirmou.

Solos contaminados. Portugal é "caso escandaloso"

O número é preocupante. Segundo a Agência Europeia do Ambiente e do Centro Comum de Investigação, 60% dos solos europeus estão danificados e as consequências já se fazem sentir, desde a qualidade dos nossos alimentos e águas até aos fenómenos extremos que podem ser acentuados.

Preocupada com este cenário, a União já avançou com uma Lei de Monitorização dos Solos, para pressionar os estados-membros a fazer uma avaliação rigorosa e frequente dos solos. “É a única vantagem, no meio disto tudo”, considera Francisco Ferreira, que aponta o dedo aos últimos governos portugueses.

Trump diz que Zelensky quer assinar acordo de minerais e volta a falar da Gronelândia
Trump diz que Zelensky quer assinar acordo de minerais e volta a falar da Gronelândia

“Este é um caso que acho verdadeiramente escandaloso. Há, pelo menos, dez anos, temos uma lei dos solos contaminados prometida para Portugal e todos os governos, uns mais outros menos, não têm conseguido encontrar o consenso para o fazer”, lamenta.

Vasco Becker-Weinberg não alinha nestas críticas e prefere não entrar na discussão nem sobre esta legislação nem sobre a polémica lei dos solos, alterada no início do ano e que permite a conversão de solos rústicos em solos urbanos. O ex-eurodeputado do CDS-PP sublinha, no entanto, que têm sido dados passos para facilitar a integração das decisões europeias nas leis nacionais.

“Acho que o grande desafio está em adaptarmos a nossa máquina administrativa a essas exigências [europeias], seja no nível de celeridade dos procedimentos administrativos, seja numa participação que se traduz em resultados efetivos ao nível da legislação. (…) Mas o caminho feito tem sido bastante positivo ao nível da harmonização da legislação portuguesa com a União Europeia”, rematou.

Saiba Mais
Comentários
Tem 1500 caracteres disponíveis
Todos os campos são de preenchimento obrigatório.

Termos e Condições Todos os comentários são mediados, pelo que a sua publicação pode demorar algum tempo. Os comentários enviados devem cumprir os critérios de publicação estabelecidos pela direcção de Informação da Renascença: não violar os princípios fundamentais dos Direitos do Homem; não ofender o bom nome de terceiros; não conter acusações sobre a vida privada de terceiros; não conter linguagem imprópria. Os comentários que desrespeitarem estes pontos não serão publicados.

Destaques V+