06 ago, 2024 - 21:35 • José Pedro Frazão
É certo que o mundo está cada vez mais quente mas o historiador Peter Frankopan assinala que outras gerações já passaram por desafios climáticos de grande magnitude no passado. Em entrevista à Renascença, registada recentemente em Lisboa, o autor que escreveu "A História do Mundo" com o foco nas relações entre os humanos, a ciência e o ambiente, assegura que desde sempre que os humanos têm estado preocupados com as fronteiras ecológicas do planeta.
No seu livro, conclui que muitas alterações do clima foram a força motriz para muitas mudanças ao longo da história da humanidade. Apesar de algum catastrofismo em relação ao futuro, parece que a história foi sempre assim, pelo que nos conta nesta obra. Afinal o que há de novo aqui?
A má notícia é que, quando há alterações climáticas, ocorrem eventos de extinção de pessoas ou animais. Assim, durante a maior parte da história do mundo, antes dos humanos chegarem a este planeta, a nossa própria vida não teria sido sustentável. Durante a primeira metade da sua existência, a Terra não teve oxigénio suficiente para os humanos. O que se aprende em história, biologia, geologia e ciências é que todos somos animais e que se o ecossistema mudar, temos de nos adaptar, através da evolução, ou morremos. E nós, humanos, só nos reproduzimos aproximadamente a cada 25 anos como uma geração. São necessários milhões de anos para evoluir, para sermos capazes de lidar com a realidade.
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Veja as coisas que estão a acontecer no mundo: a temperatura do oceano no ano passado na costa da Flórida foi de 38 graus centígrados, o que é o mesmo que a de uma banheira de hidromassagem. No Mediterrâneo, no verão passado, a temperatura da água esteve em torno dos 28 graus centígrados, 4 graus mais quente do que o normal. Na Índia tivemos este ano temperaturas acima dos 50 graus centígrados.
Alterações climáticas
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Suponho que se lembre da história da Bíblia em que José aconselhava o Faraó, apelando a que nos sete anos em que tivesse bastante, se certificasse que tinha comida de lado, pois haveria um longo período de escassez. O Faraó respondia que mais ninguém lhe dizia isso. E quando chegou aos sete anos de escassez, o Faraó libertou então José e os seus irmãos, dizendo que ele tinha sido o único que lhe disse que precisava de se preparar para as consequências da mudança. Esta é uma história ecológica, ambiental e climática.
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Devido à morte de muitas pessoas, o preço da carne baixou e as pessoas ficaram mais saudáveis porque comeram mais proteínas. Quando se ingere mais proteína em criança, isso ajuda no desenvolvimento do cérebro, levando a melhorias cognitivas e a pessoas mais inteligentes. Por isso há muitas maneiras pelas quais os desastres podem, por vezes, conter uma réstia de esperança.
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Essa é também a história da escravatura. Em África, por exemplo, diferentes comunidades tiveram de fazer uma escolha: ou se tornavam escravos ou escravizavam outros povos. Estas tensões e pressões fazem com que as pessoas reajam e se comportem de formas assustadoras, mas também bastante lógicas. Se se está muito pressionado, precisa de se salvar, e isso, por vezes, significa infligir castigo e dor a outras pessoas.
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Por exemplo, desde o ano em que nasci, em 1971, os oceanos absorveram calor equivalente a 25 mil milhões de bombas de Hiroshima. E isso obviamente muda a distribuição química da água, os sistemas dentro dos níveis de água para todos os animais e plantas. Isto é causado pela forma como queimamos combustíveis fósseis, mas também por causa das partículas que vêm dos pneus, o que significa que agora encontramos microplásticos em cada metro cúbico de água no Oceano Ártico, muito longe de Lisboa ou de Nova Iorque e Londres. Temos 40 partículas microplásticas por cada metro cúbico de água devido à forma como vivemos. No Reino Unido, todas as semanas colocamos 9 biliões de partículas de microplásticos na água devido aos ciclos das máquinas de lavar roupa e à utilização de produtos sintéticos.
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Estas coisas mostram que podemos preocupar-nos em como colocar uma métrica. Mas, no geral, se viver nos hemisférios norte ou mais a norte, o mundo em aquecimento ainda o irá afetar, mas são os trópicos que primeiro se tornam lugares quentes, logo impróprios ou perigosos para a vida humana. Recentemente as escolas nas Filipinas foram fechadas por causa do risco de vida de estar ao ar livre. Quando se está acima dos 40 graus, é realmente perigoso. E grande parte do mundo em desenvolvimento não tem o luxo de ter ar condicionado ou disponibilidade de água. Portanto, quando as coisas correm mal noutros lugares, precisamos de descobrir como trabalhamos como comunidade global para evitar crises humanitárias.
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Há muita reflexão sobre como melhorar estas coisas e utilizar os nossos materiais mais rapidamente. Tenho um colega em Cambridge a trabalhar em grandes melhorias na vida das baterias. Vimos recentemente que uma empresa automóvel chinesa anunciou que produzia veículos elétricos com uma autonomia de quase 2.000 quilómetros. Esta é uma grande mudança para quando este tipo de tecnologia estiver disponível a preços mais baixos. Os preços das baterias estão hoje 90% mais baixos do que eram há 15 anos. Portanto, há muitas razões para sermos otimistas. Mas suponho que me sinto como um bombeiro à porta de um edifício em chamas a dizer: 'não se preocupe, temos muitas mangueiras que vêm com água para apagar o fogo'.
As picadas de carraças estão a aumentar e os mosqu(...)
Pensamos que foi apenas recentemente que os humanos se 'iluminaram' e chamamos-lhe Iluminismo e a era da inovação científica, mas isso relega todas as pessoas que vieram antes de nós, rejeitando-as como sendo estúpidas e tolas. No passado, todos tentaram descobrir o que precisavam para sobreviver, como cooperar, como ser resilientes e como trabalhar em conjunto. Quer dizer, houve guerras pela água, sobre as quais escrevi, na Mesopotâmia que duraram 150 anos, há 4,5 mil anos. O controlo sobre o abastecimento de água, sobre a mão-de-obra e sobre os recursos fazem parte da nossa história humana. Esta é uma das razões pelas quais as pessoas construíram cidades, para encontrar melhores formas, não apenas de cooperar, mas de viver de formas mais otimizadas.
Compromisso Verde
Presidente da Agência Espacial Portuguesa esteve n(...)
Veja, no Hinduísmo, as intercessões com as divindades hindus para que as chuvas cheguem e as monções cheguem. Tem poemas e canções que são gloriosos, explicando a emoção e a alegria com que viram a Terra voltar à vida quando as chuvas chegaram. Quando pensamos no Budismo hoje, não é ao estilo de Hollywood, onde as pessoas apenas cantam e tornam-se uma pessoa melhor. Nos ensinamentos iniciais budistas, nada neste mundo existe. Tudo morre, por isso deve estar preparado para a reencarnação cíclica. A vida não é fazer algumas orações e depois ir surfar. Trata-se de reconhecer a decadência e reconhecer a profunda tristeza e morte da vida que nos rodeia.
Suponho que não seja surpreendente que os nossos eco-activistas de hoje, aos meus olhos, pareçam uma 'religião' moderna onde são prometidas as mesmas histórias do apocalipse, e as mesmas expressões do motivo pelo qual estamos a enfrentar a extinção, são porque as pessoas são estúpidas, egoístas e gastam demasiado. Dizem que a culpa é dos ricos e que devíamos olhar para os pobres e para as pessoas que são menos responsáveis pelo clima.
Estudo
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E é isso que traz hoje um legado que requer, penso eu, um pouco de reflexão. Não só por causa das igualdades de outras partes do mundo e dos legados do que os europeus fizeram, mas também, à medida que vemos o mundo começar a mudar, começamos a questionar-nos como estamos agora numa posição em que as pessoas vêm para locais como Lisboa e aqui compram propriedades e imóveis, adquirem fábricas e bancos, compram sistemas de água e privatizam serviços básicos.