Guerra no Médio Oriente

"Seria a altura ideal para uma mudança de regime no Irão", acredita especialista

13 jun, 2025 - 23:22 • Alexandre Abrantes Neves , Diogo Camilo

A investigadora Maria João Tomás acredita que os ataques de Israel servem de manobra de distração às fragilidades do governo de Netanyahu e que, se o aiatolá Khamenei não der uma resposta forte, o Irão poderá conhecer uma mudança de regime.

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Ouça a entrevista a Maria João Tomás. Foto: EPA

Os ataques de Israel ao Irão podem levar à queda do regime dos aiatolás e servem de "manobra para desviar atenções" da fragilidade do governo israelita de Benjamin Netanyahu.

Em entrevista à Renascença, Maria João Tomás, investigadora, professora universitária no ISCTE e especialista em Geopolítica e Geoeconomia, com enfoque no Médio Oriente, acredita que, se o Irão não der uma resposta forte a Israel, "vai ficar ainda mais fragilizado internamente" e que isso poderá levar a uma mudança do regime.

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"Seria a altura certa para uma tentativa de mudança de regime. Portanto, se isto correr mal, se o Irão não mostrar uma resposta firme a Israel, as coisas podem ser muito complicadas para o regime iraniano dos aiatolás. Há uma divisão interna grave no Irão. Por um lado, na fação mais da linha dura - que não está contente com a sucessão quase que dinástica que Khamenei quer fazer, porque isso é algo que não cabe no conceito de república criado em 1979. E depois temos os saudosistas do Xá Reza Pahlavi, da dinastia Pahlavi, que querem a volta do filho do Xá e são monárquicos e são dinásticos. Portanto, há uma fragilidade que é perigosa dentro da linha dura que apoia Khamenei", explica.

Assim, acredita, esta será a "altura ideal para uma mudança de regime" no Irão.


Perante estes ataques entre Israel e o Irão, o governo de Netanyahu apresentou dois argumentos para ter lançado os ataques de ontem: a escalada do poder nuclear de Teerão e um possível ataque por parte do Irão, semelhante ao que foi feito pelo Hamas em outubro de 2023. São justificações plausíveis, reais?

Esta última é hilariante, de que o Irão estava pronto a atacar como um ataque de 7 de outubro. Esta é hilariante, porque neste momento o Irão está muito fragilizado internamente por várias lutas internas, e claro que não ia fazer uma coisa dessas, além de que também está enfraquecido com os seus proxis [aliados], porque como sabemos o Bashar al-Assad foi substituído pelo Ahmed al-Sharaa, que é sunita, é da Irmandade Muçulmana e é de um grupo terrorista ligado à Al-Qaeda, e era importante a Síria estar ali, não é? Depois temos o Hezbollah que foi decapitado nas suas forças mais importantes, temos o Hamas como está, os únicos que ainda estão a operacionar são os Huthis, portanto o Irão nunca, nesta altura de campeonato, iria fazer um ataque de que ordem fosse. Só se fosse obrigado, como é o caso. Portanto, esse argumento Netanyahu é hilariante.

Em relação ao urânio enriquecido, aí as coisas já são mais complicadas, porque o Irão quer realmente ter armamento nuclear e precisa dele, portanto esse é um argumento importante, até porque já sabe que aparentemente havia urânio enriquecido suficiente ao ponto de poder fazer um armamento nuclear.

E perante este ataque de Israel essa ameaça nuclear fica resolvida?

Não, claro que não. Só os Estados Unidos é que têm equipamento suficiente para ir abaixo dos 90 metros onde está escondido [o urânio], portanto claro que o Irão não tem meios para isso, os Estados Unidos sim. Vamos ver até que ponto é que o Trump se vai envolver ou não.

E até que ponto é que os EUA se vão envolver?

Sinceramente, não sei até que ponto é que Trump se vai envolver. Ele tem essa possibilidade, está neste momento com uma situação muito complicada internamente. Os Estados Unidos e os americanos estão a começar a perceber qual é o rumo que Trump está a dar à democracia dos Estados Unidos e vão sair para a rua, portanto seria muito conveniente que os Estados Unidos amanhã atuassem para ajudar Israel a acabar com o armamento nuclear iraniano, ou pelo menos o equipamento nuclear que está a ser escondido a 90 metros de profundidade, e que só os Estados Unidos é que podem ter esse equipamento para atingir a tal profundidade.

Israel lança ataque ao Irão. Netanyahu promete eliminar ameaça nuclear
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Isso reforça a popularidade de Trump?

A popularidade não digo, mas distrai. Na próxima semana será discutida a Big Beautiful Law, aquela coisa estranha que Trump já passou na Câmara Baixa [Câmara dos Representantes] e agora vai passar esta semana na Câmara Alta [Senado], e há uma linha que limita o poder judicial às atuações de Trump. Se houver várias distrações, pode ser que passe.

Concorda com o Presidente da República que hoje disse que o governo israelita pode estar a querer desviar atenções do conflito na Faixa de Gaza?

Claro que sim, como é óbvio que está a distrair do que se está a passar na Faixa de Gaza, dos colunatos, da situação interna, porque o partido dos ultraortodoxos pôs uma moção de censura no Knesset [parlamento israelita] contra Netanyahu mas o Governo poderá não escapar na próxima.

A situação interna não está boa para Netanyahu e esta é mais uma manobra para desviar atenções da fragilidade do governo de Netanyahu, que tem de sobreviver a todo o custo. E depois talvez a razão mais importante disto tudo seja porque o Irão descobriu os segredos nucleares de Israel, que até agora, como nós sabemos, têm estado nos segredos dos deuses, até porque Israel não aderiu ao tratado de não proliferação nuclear e o Irão já disse que iria publicar esses segredos nucleares de Israel.

Que influência podem ter estes ataques na guerra com o Hamas?

Coitados do Hamas e coitados dos palestinianos. Infelizmente vai acentuar e desviar atenções para não olharmos para eles e ainda fazerem pior.

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