07 out, 2025 - 06:00 • Henry Galsky com Vanessa Barata
Do outro lado da fronteira, a guerra já provocou mais de 65 mil mortos palestinianos. Israel estima que entre 20 mil e 25 mil sejam combatentes do Hamas. As autoridades da Faixa de Gaza, controlada pelo grupo palestiniano, divulgam os números sem distinguir entre civis e membros de grupos armados.
Alon Lee é codiretor e cofundador da organização Standing Together, o maior movimento popular árabe-judaico de Israel, que se opõe à ocupação dos territórios palestinianos e defende a paz, a igualdade e a justiça para todos os que vivem entre o rio Jordão e o mar Mediterrâneo.
Em entrevista à Renascença, afirma que a comunicação social israelita não mostra imagens suficientes da fome em Gaza. “É preciso mostrá-las”, diz. Em julho deste ano, após manifestações organizadas pela Standing Together, isso começou a mudar.
O movimento desencadeou uma série de debates internos entre jornalistas dos canais de televisão israelitas. Numa troca de mensagens que acabou por se tornar pública, um dos repórteres reconheceu a necessidade de mudar de abordagem.
“O 7 de Outubro causou um trauma tão grande na população que as pessoas perderam a empatia”
“Recebo muitas críticas por não haver reportagens sobre esse assunto [a fome em Gaza] e, na minha opinião, essas críticas são justificadas. Mesmo que os sobreviventes do cativeiro do Hamas e as famílias dos reféns, com quem mantenho contacto próximo, não sintam empatia pelo que se passa lá, essa não deve ser a medida.”
Nos dias seguintes, o tema deixou de ser tabu. Ohad Hemo, um dos jornalistas mais populares do Canal 12 — o de maior audiência em Israel —, foi assertivo durante a edição do principal telejornal noturno do país. “É preciso dizer alto e bom som: há fome na Faixa de Gaza”, afirmou.
Para João Miragaya, mestre em História pela Universidade de Telavive e cofundador do podcast Do Lado Esquerdo do Muro, “o 7 de Outubro causou um trauma tão grande na população que as pessoas perderam a empatia”. E acrescenta: “a imprensa local é parte da sociedade”.
“Divido a população israelita em três grandes grupos: os negacionistas ou vingativos, que mantêm sede de vingança; outro grupo que põe em dúvida as informações, atribuindo-as ao Hamas; e um terceiro que diz: ‘é uma pena o que acontece, mas é guerra, e na guerra isso acontece’. São pessoas que sentem alguma empatia, mas não o suficiente para se revoltar”, afirma.
Para o historiador, “sem meios de comunicação críticos e com os israelitas a ‘remoer’ o 7 de Outubro constantemente, a população não demonstra empatia para com os palestinianos”.
Para Mia Baran, gerente de programas da organização Combatentes pela Paz, a resposta da sociedade israelita contém elementos de negação. Na sua perspetiva, os israelitas entendem que “acreditar na crise de fome na Faixa de Gaza seria como acreditar nos relatos do Hamas”.
“É muito difícil ver essas imagens e não pensar que temos relação com elas. Como qualquer povo no mundo, as pessoas querem ver-se como boas, éticas. E é difícil manter esse posicionamento diante dessas imagens, sabendo que somos nós que causamos isto”, afirma.
“Os israelitas também se apoiam em afirmações do género: ‘se o Hamas parar de roubar a comida, haverá ajuda humanitária para a população’. De facto, o Hamas rouba carregamentos, mas a verdade é que chega pouca comida”, acrescenta.
No final de setembro, uma marcha com cerca de mil pessoas em Telavive dirigiu-se à sede do Likud, partido do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, para exigir o fim da guerra. Entre os manifestantes estavam pais de soldados destacados na Faixa de Gaza.
O movimento contra a guerra é hoje uma realidade em Israel. Segundo uma sondagem do Instituto Agam e da Universidade Hebraica de Jerusalém, 71% dos israelitas apoiaram o plano apresentado pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.