07 fev, 2025 - 21:03 • Salomé Esteves
O rendimento médio mensal líquido dos portugueses bateu dois recordes em 2024. Subiu 100 euros entre 2023 e 2024, mas por outro lado o fosso entre homens e mulheres também aumentou e ultrapassou pela primeira vez os 200 euros.
Os dados foram divulgados na quinta-feira, pelo Instituto Nacional de Estatística (INE).
Com um aumento histórico de 9,6% no último ano, o rendimento médio líquido cresceu de 1.042 para 1.142 euros por mês.
Já segue a Informação da Renascença no WhatsApp? É só clicar aqui
Ao detalhe, os dados revelam que os homens receberam, em média, mais 115 euros do que em 2023, enquanto as mulheres receberam mais 87. A diferença foi de 28 euros.
A subida sem paralelo do rendimento médio acontece à boleia dos profissionais das Forças Armadas, em que se registou uma valorização salarial de 21,7% face a 2023. Em 2024, os militares receberam mais, por mês, porque aumentou o suplemento de Condição Militar de 100 para 300 euros. Este suplemento voltou a ser aumentado a 1 de janeiro de 2025, para 350 euros.
Mas o aumento de rendimento nas Forças Armadas acontece apenas quando se analisa o conjunto. O ano passado é o primeiro ano em que há registo, no INE, de rendimento mensal líquido de mulheres nas Forças Armadas. Este valor único aponta para um rendimento médio de 1.280 euros, consideravelmente abaixo (menos 20%) dos 1.607 euros que um homem militar recebe, em média.
Em 2024, Portugal também assistiu a uma subida acentuada do salário mínimo nacional de 760 euros para 820 (7,9%) e a vários aumentos na função pública: desde a subida da base remuneratória da Administração Pública a incrementos específicos para enfermeiros, professores e forças de segurança. Em 2025, estas medidas prolongam-se o que poderá fazer subir novamente o rendimento líquido médio.
O economista Eugénio Rosa explica à Renascença que estes números só podem ser avaliados à luz da inflação. E mesmo após estes cálculos, a desigualdade persiste. Em 2023, ambos os sexos perderam poder de compra e, em 2024, ambos ganharam. Mas, feitas as contas, as mulheres perderam mais em 2023 e ganharam menos em 2024. Este rendimento não equivale a um salário, apenas, mas inclui suplementos, prémios e, inclusive, o subsídio de alimentação.
Foi na área da Agricultura e Pescas que se registou o segundo maior aumento, de 10% face a 2023. Contudo, os trabalhadores qualificados da agricultura, da pesca e da floresta receberam, em média, o equivalente ao salário mínimo nacional. Depois de descontos e impostos, o salário líquido médio foi de 823 euros, em 2024, e de 776 euros em 2023.
Também os técnicos e profissionais de nível intermédio tiveram um aumento do rendimento médio a rondar os 10% (9,8%). Ao contrário de agricultores e pescadores, estes trabalhadores recebem acima da média dos restantes, com 1225 euros.
As diferenças salariais entre homens e mulheres são uma tendência há vários anos. Estatisticamente, como demonstra o Índice para a Igualdade de Género (Gender Equality Index) há consideravelmente menos mulheres do que homens em posições de chefia e de liderança, tradicionalmente mais bem pagas. Apenas 35% das administrações das grandes empresas são compostas por mulheres, revela o mesmo índice.
Eugénio Rosa reforça que o estreitamento das diferenças na remuneração entre homens e mulheres tem sido muito ligeiro nos últimos anos. E não deixa de sublinhar que a diferença é tão maior quanto mais alto for o nível de especialização e de instrução.
O economista acrescenta que a diferença de rendimento entre homens e mulheres pode ser um "ganho muito importante" para as empresas. "Se as mulheres ganharem menos 200 ou 300 euros, se multiplicarmos isso pelo número de mulheres que trabalham e por 14 meses" as empresas podem poupar milhões de euros.
Maria Bandeira Palma, Senior Manager of People & Culture Consulting da Cegoc, lembra que são precisas "políticas rigorosas dentro das empresas para combater" a disparidade de rendimentos, porque faltam "critérios específicos para definir as remunerações e os aumentos". A especialista em igualdade de género das organizações não deixa de sublinhar que muitas empresas não apercebem que "precisamos de atualizar as nossas categorias profissionais" para que se identifiquem e combatam diferenças salariais.
Na tabela de remunerações médias líquidas dos portugueses, de acordo com o INE, existem grupos que, depois de descontos e impostos, recebem, em média, menos do que o salário mínimo nacional que, em 2024, era de 820 euros. E em todas as situações, são mulheres.
Entre os 800 e os 820 euros de salário médio líquido estão as trabalhadoras da indústria, construção e artífices e operadores de instalações e máquinas e trabalhadores da montagem.
Abaixo dos 800 euros, seguem as trabalhadoras dos serviços pessoais, de proteção e segurança e vendedoras que recebem, em média, um salário líquido de 797 euros e as mulheres empregadas na agricultura e nas pescas, que recebem 722 euros.
Por último, as trabalhadoras não qualificadas são as pessoas que recebem menos pelo seu trabalho: 633 euros mensais, enquanto um homem na mesma categoria recebe 846 euros líquidos por mês. Esta é uma diferença de 25%, a maior de todos grupos, a par com os operadores de instalações e máquinas e trabalhadores da montagem.
Ou seja, o homem que recebe, em média, menos entre os seus pares - o trabalhador não qualificado - recebe mais, em média, do que uma mulher nestes grupos.
Maria Bandeira Palma, especialista em igualdade de género nas organizações, explica à Renascença que, muitas "em setores de atividades menos estruturadas, com menos regulamentação" as "práticas de recursos humanos estão menos desenvolvidas" e há menos atenção a questões de igualdade em remuneração.