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Cinco anos de Covid-19

"Pandemia agravou" perda de qualidade no ensino em Portugal

11 mar, 2025 - 07:03 • Cristina Nascimento

Tese é defendida pelo antigo ministro da Educação, Nuno Crato. Cinco anos depois da Covid-19, o antigo governante garante que há aprendizagens que se perderam, mas não há estudos para saber se foram recuperadas. Também há falta de dados sobre se ainda subsiste o impacto na socialização durante a pandemia, mas a Ordem dos Psicólogos acredita que há sinais positivos.

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Ouça a reportagem: Cinco anos depois da Covid, há marcas que perduram na saúde mental, no ensino e no mundo do trabalho

O cenário parece tirado de um filme de ficção e, para muitos, já é uma memória que parece longínqua. Aconteceu há cinco anos. Escolas fechadas, alunos isolados em casa, assistindo a aulas online e entregues aos ecrãs nos tempos livres. Foi assim que milhares de crianças, adolescentes e jovens viveram parte do seu percurso escolar, por causa da Covid-19.

Volvido este tempo, na área da educação, não se sabe ao certo o que ficou dessa época. É o que argumenta o antigo ministro da Educação, Nuno Crato, quando questionado pela Renascença sobre se os alunos portugueses já conseguiram recuperar as aprendizagens perdidas durante a pandemia.

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É quase impossível responder a essa pergunta”, diz, acrescentando que “é um problema importantíssimo, mas, infelizmente, em Portugal, não temos um sistema de avaliação fiável ao longo dos anos”.

Nuno Crato faz uma viagem no tempo até 2015/2016, “quando se aboliram as provas finais de 4.º e 6.º ano de escolaridade e quando se introduziram provas de aferição sobre assuntos variáveis”. Argumenta este governante que, com estas mudanças, “é impossível ver o que se passa”.

Crato, que foi ministro entre 2011 e 2015, quando Pedro Passos Coelho liderava o Governo, refere ainda que a Portugal resta confiar nos grandes estudos internacionais, como o PISA ou TIMSS. Problema: só se realizam a cada três ou quatro anos.

Desde a Covid-19 para cá, o PISA concluiu que, entre 2018-2022 os alunos portugueses pioraram no desempenho a matemática (-20.6 pontos), leitura (-15.2) e ciência (-7.3). Dados mais recentes não existem.

"Já vínhamos em queda. Pandemia agravou dificuldades"

Voltamos ao agora investigador da Universidade de Lisboa Nuno Crato, que nos últimos meses participou num estudo em 12 países sobre as consequências da Covid nos sistemas de ensino.

Crato mostra-se preocupado também com outras mudanças que aconteceram em 2016. “Passámos a ter um currículo muito vago, as metas curriculares que existiam foram abolidas em função de uma coisa chamada ‘aprendizagens essenciais’ que é um conjunto desconexo de tópicos a serem conhecidos pelos estudantes”, critica.

Somadas estas alterações, conclui, “temos há quase 10 anos uma descida continuada dos nossos resultados, o que é extremamente preocupante”. “O ensino em Portugal, desde 2016, tem vindo a piorar, sempre, sempre, sempre”, reforça.

Então, questionamos, qual é o papel da pandemia? “Quando a pandemia começou já vínhamos em queda. A pandemia agravou as dificuldades e agravou mais do que nos outros países”, assegura.

Na socialização outra incógnita, mas psicólogos estão otimistas

Aprendizagens e estudos académicos à parte, há outro lado da vida das crianças, adolescentes e jovens que foi afetada: a socialização. Com o encerramento das escolas, os mais novos viram-se privados do convívio presencial com os seus pares.

“A escola constitui-se como um fator muito importante para garantir, por assim dizer, alguma socialização”, diz à Renascença Joana Alexandre, psicóloga e membro da direção da Ordem dos Psicólogos Portugueses. O encerramento das escolas deu origem a consequências diferentes, consoante as idades.

Por exemplo, os bebés até aos três anos tiveram uma evolução da aprendizagem diferente. Com os jovens e os pré-universitários, outro exemplo, “ficou comprometida a experiência, os momentos de celebração e socialização direta que estes jovens têm habitualmente quando entram nesta etapa da sua vida”.

Joana Alexandre sabe que foram afetados, mas “faltam estudos” que “consigam precisar se alguns dos impactos se mantém”.

Vai valendo a experiência de terreno. “Eu diria que nós assistimos alguns impactos mais no imediato, no tal curto prazo, mas diria que, hoje em dia, os nossos jovens e jovens adultos começaram a retomar ou tentar recriar algumas das suas atividades, algum padrão de comportamento que, no fundo, seria expectável e seria aquilo que era normativo antes da pandemia”.

Apesar da falta de estudos, esta especialista está otimista e acredita que a pandemia trouxe outro aspeto positivo.

“Houve um aumento da própria literacia em saúde psicológica”, refere Joana Alexandre.

Esta psicóloga acredita que, “globalmente, as pessoas estão mais atentas aquilo que é o bem-estar e a importância do bem-estar”.

“Tem havido um movimento grande, seja ao nível das empresas, seja ao nível pessoal, ligado às estratégias de autocuidado, da importância do autocuidado para o nosso bem-estar geral. Se continuarmos a promover estes bons hábitos, de algum modo ganharemos estes anos aquilo que a pandemia nos tirou”, remata.

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