23 nov, 2024 - 01:10 • Susana Madureira Martins
“Começou o tempo de manifestação dos candidatos, ainda não começou o tempo da decisão dos partidos”. É com esta frase dita à Renascença que um influente elemento da direção do PS tira pressão às movimentações de António José Seguro, que esta quinta-feira à noite admitiu à CNN estar a ponderar uma candidatura à Presidência da República.
A direção nacional do PS tenta jogar ao máximo com o calendário, adiando uma posição oficial sobre potenciais candidatos à corrida a Belém. De resto, o líder socialista Pedro Nuno Santos, em declarações à Antena 1, já tinha deixado claro o quanto é prematuro falar de presidenciais.
"Nós não estamos ainda nessa fase neste momento. Todas as personalidades - nomeadamente da área do PS, mas não só - que desejem ou estejam a ponderar ser candidatos terão ainda o seu tempo para fazer isso. O PS terá o seu tempo para tomar decisões", respondeu o líder socialista à rádio pública.
Num momento em que o partido está a tentar sair de um traumático processo orçamental e a querer centrar-se nos Estados Gerais e nas autárquicas, a direção nacional do PS quer tirar o foco das presidenciais de 2026.
Para além de relativizar a movimentação do ex-secretário-geral do partido, a direção nacional socialista recusa que o avanço de Seguro tenha resultado das declarações de Pedro Nuno Santos, que, recentemente, numa entrevista à CNN, apontou, entre outros, o nome do ex-líder do PS como presidenciável.
“Não foi lançado, foi referido, tal como outros”, diz um dirigente do partido à Renascença. Outro membro da direção atalha mesmo com um “isso é desculpa de mau pagador”.
Depois de, há dez anos, Seguro ter sido apeado da liderança do PS por António Costa com o apoio do atual secretário-geral do partido, Pedro Nuno Santos, a atual direção tenta tirar carga a esta vontade do ex-líder de, pelo menos, ponderar. “Não vejo problema algum”, admite mesmo à Renascença um dirigente socialista já citado.
Mas também há a consciência na direção nacional do PS que, antes de uma posição formal de apoio a um candidato da área socialista, não é possível impedir Seguro de fazer o que bem quiser. Na cúpula do partido o entendimento é que “os partidos não determinam a consciência individual, cada um fará o que melhor entender”.
A direção do PS há muito que vinha estando atenta às movimentações de Seguro, sendo que em maio de 2023 o ex-líder do partido não excluiu o regresso à política. Agora, um dirigente socialista assume mesmo: “Não me apanhou de surpresa”, considerando que, na entrevista à CNN, Seguro se mostrou “igual ao de sempre” e que “ao fim de dez anos não melhorou”.
Francisco Assis foi dos primeiros a vir a terreiro dar conforto a António José Seguro. À Renascença, o eurodeputado disse que gostaria de ver o PS a apoiar uma eventual candidatura de António José Seguro à Presidência da República.
Assis defende que Seguro “reúne todas as condições para ser, não apenas um candidato a Presidente da República, mas também um grande Presidente da República”.
Evitando fazer recomendações à direção do PS quanto a um possível apoio a uma candidatura do ex-líder do partido a Belém, o eurodeputado diz estar “convencido de que a maioria dos socialistas estará contente com o que ouviu”.
Entre os apoiantes de Seguro acredita-se que o ex-líder só avançará se tiver o apoio do PS e que nunca avançará contra outro candidato que a direção nacional venha a apoiar. Um antigo dirigente "segurista" acredita mesmo que “ele próprio terá isso na cabeça”.
Acredita-se ainda entre os "seguristas" que o ex-líder está naquela fase de auscultação, quer do PS quer da opinião pública, sobre o que o ex-secretário-geral socialista realmente vale. A tal fase de ponderação em que Seguro diz estar “é uma coisa de auscultação”, diz à Renascença um seu apoiante de sempre.
A mesma fonte admite que Seguro “está menos molengão” do que há dez anos quando era líder do PS, mas lamenta que, sendo “um nome forte” do partido, “não devia ter cortado tão radicalmente a vida pública e política”, tendo perdido visibilidade.
É ainda consensual entre os seguristas que o ex-líder do partido “não arriscou” na entrevista à CNN, deixando agora os apoiantes na expectativa sobre o espaço de comentário semanal que vai manter naquela estação. “Vamos ver se vai arriscar semanalmente”, diz um apoiante à Renascença.
Sobre o espaço político em que Seguro poderá entrar se, de facto avançar para Belém, os "seguristas" não têm dúvidas. “O PS só tem possibilidade de ter alguém dentro da área do centro” que possa seduzir “o pequeno comerciante, o pequeno proprietário”, assume a mesma fonte já citada.
Outro apoiante de longa data de Seguro diz à Renascença que o ex-secretário-geral “é uma das personalidades que tem currículo à esquerda”, que eleitoralmente cobre “a área do socialismo democrático” e tem hoje “um conjunto de coisas que as pessoas gostam, o distanciamento da vida partidária”, por exemplo. “Foi à vida dele”, resume esta fonte socialista e agora “anda há semanas a apalpar” terreno.
A mais de um ano das eleições presidenciais de 2026, este é, portanto, um tempo de felinos, de espera a ver quem apresenta as melhores condições para avançar e melhor perceção pública. António Vitorino, na entrevista que deu esta semana à Renascença e ao Público, foi claro sobre isso.
“A questão é a conjugação de dois fatores – um é a vontade do candidato, é um cargo unipessoal; o segundo é também a leitura do que é que o país pode desejar no exercício da função presidencial. E isso, a meu entender, veremos mais claro no ano que vem”, disse o ex-ministro da Defesa.
O mesmo se passa agora com António José Seguro, que está a “ponderar” e em situação idêntica está Mário Centeno, o governador do Banco de Portugal e ex-ministro das Finanças que já foi definido por Pedro Nuno Santos como um “bom candidato”.
No PS há quem veja em Centeno um verdadeiro “tampão” face às movimentações de António José Seguro. Em conversa com a Renascença, um dirigente socialista diz que “cabe agora à maioria sensata do PS fazer tampão a isto”, salientando-se que no PSD “faz-se tampão falando de vários” potenciais candidatos a Belém.
O mesmo dirigente do PS desafia Centeno a vir rapidamente a terreiro dizer ao que vem. “Está na hora de Centeno dizer que também está a ponderar, até porque está”, garante esta fonte, que carrega na pressa: “Antes que isto se torne numa onda incontrolável”, receando que um eventual atraso do governador possa dar gás a Seguro.
Entre os "seguristas" foi, de resto, percetível que a movimentação do ex-líder deixou desconfortável uma fatia do partido. “Um conjunto de pessoas do PS ficou assustado”, admite um apoiante de Seguro.
A mesma fonte admite, também, que a ponderação de Seguro pode servir para chamar Centeno a jogo: “Pode precipitar uma posição e acho bem que pondere. O Ano Novo pode trazer coisas novas”, sentencia.
Este socialista considera mesmo que Centeno pode vir a ser candidato, ao passo que outro "segurista" defende que o governador do Banco de Portugal “não tem sabor”.
A Renascença sabe que Centeno está, de facto, a ponderar sobre uma eventual corrida a Belém, tendo, provavelmente a consciência de que o mais certo é não ser reconduzido no Banco de Portugal. De resto, o governador tem feito saber aos seus mais próximos que uma eventual candidatura à Presidência da República é uma “decisão pessoal”.
Esta chamada a jogo de Mário Centeno traz, contudo, um problema de calendário, pelo menos no imediato. O governador do Banco de Portugal tem um conselho de governadores marcado para 12 de dezembro e nos dez dias anteriores está inibido de dar entrevistas ou fazer declarações públicas de fundo. Afinal, qual é a pressa?