15 abr, 2025 - 07:00 • Tomás Anjinho Chagas , Diogo Camilo , Filipa Ribeiro
O que é um indeciso? Como é que pode ser interpretado? São alvos eleitorais para as máquinas partidárias ou não são relevantes? São perguntas justas que todos podemos fazer quando lemos as sondagens que saem todas as semanas, em contrarrelógio para as eleições legislativas de 2025.
A primeira sondagem publicada já depois de convocadas as eleições antecipadas, publicada pelo Expresso a 21 de março, apontava para quase 40% de indecisos, a quase dois meses das eleições de 18 de maio.
Uma análise da Renascença às 18 sondagens publicadas desde o início do ano, com o mesmo método da Sondagem das Sondagens, mostra que 14% dos eleitores não sabem em quem votar e que a percentagem de indecisos cresceu três pontos no último mês, com a queda do Governo.
"O número de indecisos não é extraordinário, é normal", considera Luís Paixão Martins, consultor de comunicação e fundador da LPM, empresa de consultoria de comunicação. Em declarações à Renascença, o autor do livro "Como mentem as sondagens" não considera que estejamos perante valores demasiado altos nesta altura do campeonato.
João Villalobos, managing partner da OrbiConsulting, empresa de consultoria de comunicação, alerta que por detrás deste indicador pode haver uma ilação mais preocupante: os indecisos podem ser pessoas que estão desinteressadas ou que podem nem sequer chegar a votar. Mas já lá vamos.
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Villalobos também está alinhado com a ideia de um valor normal de indecisos e lembra que no ano passado, por esta altura, o número de indecisos estava perto dos 14% e considera, por isso, que "estamos essencialmente com o mesmo número de indecisos".
O especialista em comunicação fala num "cenário muito semelhante" àquele a que assistimos nos meses que antecederam as legislativas de 10 de março de 2024.
A questão é sensível e não tem respostas óbvias. Devemos, aliás, desconfiar de quem se pronuncia sobre o assunto com demasiada certeza. Luís Paixão Martins considera que os indecisos são "os eleitores que se interessam pela política sempre que há eleições". Ou seja, interpreta este indicador como eleitores que participam mas que estão ainda no processo de escolha.
"Os debates vão ser muito importantes para atrair os eleitores que querem ter uma opinião atualizada e fundamentada sobre a sua decisão", explica o especialista em comunicação, que esteve envolvido nas campanhas eleitorais que levaram às maiorias absolutas de Cavaco Silva, José Sócrates e António Costa.
Mas João Villalobos tem uma visão diferente deste indicador: "Estamos a falar de pessoas que ainda não decidiram, mas também estamos a falar de pessoas que já decidiram que não votam". Este especialista, olha para os indecisos como potenciais abstencionistas.
"Pode estar indeciso entre partidos ou está indeciso para a abstenção", conclui o especialista em comunicação. Villalobos considera que Paixão Martins "percebe muito mais de sondagens" do que ele próprio, mas não concorda que os indecisos sejam os eleitores mais informados.
Para este especialista, "a informação leva a uma decisão" e por isso, os indecisos englobam "aqueles que estão afastados da política" - que muitas vezes nem sabem quem são os líderes partidários - e os que "se afastaram" devido à cascata de crises políticas.
Esta é a resposta que reúne maior consenso: em grande parte sim, a campanha é desenhada especialmente a pensar nos indecisos.
Luís Paixão Martins, que também escreveu um livro chamado "Como perder uma eleição", e que esteve envolvido em várias campanhas eleitorais do PS e PSD, é perentório: "As campanhas são só feitas para os indecisos, muitas vezes os eleitores habituais até ficam insatisfeitos".
O especialista em comunicação política vinca que é para essa franja do eleitorado que as campanhas são direcionadas. É uma pesca de linha, e não uma pesca de arrasto: "São dedicadas exclusivamente a atrair eleitores indecisos".
Paixão Martins admite que há uma pequena parte da comunicação dos partidos tem como objetivo mobilizar o eleitorado já fiel (que vota sempre no mesmo partido), mas salienta que o grosso da campanha é mesmo para convencer aqueles que ainda não estão decididos.
João Villalobos concorda que os indecisos podem ser a diferença entre ganhar ou perder as eleições: "A reta final da campanha vai ser decisiva para muitas pessoas", assume o especialista em comunicação.
"Sabemos que os últimos dias, a última semana, são extremamente decisivos, é por isso que os principais momentos da campanha são concentrados aí", vinca Villalobos.
Nas ruas de Moura, no Alentejo, Lina Caeiro, de 49 anos, assume estar desapontada com a crise política que precipitou o país para eleições. Normalmente vota PS, mas acredita que Luís Montenegro "até estava a fazer um bom trabalho". E por isso enquadra-se no grupo dos indecisos.
"Normalmente voto sempre no mesmo partido, mas por enquanto [Pedro Nuno Santos] não me inspira muita confiança", explica à Renascença.
Funcionária pública, assume que as dúvidas não são só sobre em quem vai votar, mas se sequer participar no dia 18 de maio: "Nem sei ainda se vou votar, temos de assentar as águas. Estou a pensar seriamente se vou ou não".
Mais acima no território nacional, em Lisboa, Hipólito João, 31 anos, treinador de futebol, assume que ao dia de hoje tem menos certezas sobre o seu voto do que tinha no ano passado.
"Estou mais indeciso sobre em quem vou votar agora do que nas últimas eleições porque o partido em que eu votei não fez jus ao programa", revela à Renascença.
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Ainda assim, este caso é o de alguém que teve as expectativas defraudadas com o seu voto no último ano, mas não é o caso de alguém que admita abster-se.
"Estou com mais vontade porque precisamos de votos, precisamos que todos os portugueses possam exprimir a sua intenção", desafia.
Já reformada, Conceição Gouveia, também residente em Lisboa, diz que não gosta de Luís Montenegro "nem um bocadinho". Os 88 anos permitem-lhe conter-se menos nas palavras: "O homem não me convence, tem andado a fugir às entrevista, não quer dispor-se", critica, referindo-se ao caso Spinumviva, que levou o país a novas eleições.
"O último ano não ajuda nada, não clarificaram nada, continuo nas minhas dúvidas, se calhar até piores". Assume estar desiludida e ainda não tem uma decisão fechada.
"Estou muito indecisa", assume. Num primeiro momento, admite que não tem grande vontade de participar, mas logo se corrige e lembra que "votar é uma obrigação". Nem sempre foi assim.
"Há um ano não estava indeciso, votei sem problemas, agora não sei. Ir votar vou sempre, porque é uma obrigação, mas não sei em quem votar", assume Conceição Gouveia.
O número de pessoas que se sentem desgastadas com as notícias de novas eleições também é visível nas sondagens. Até ao início deste ano, a percentagem de indecisos estava relativamente estável: em 11 sondagens publicadas até à moção de confiança que ditou a queda do Governo, apenas três registaram mais de 15% de indecisos.
Desde então, a história é diferente: com eleições à vista, em sete sondagens divulgadas desde 11 de março, cinco mostram os indecisos acima dos 15% - e uma delas, a primeira após o Governo cair, chegou quase aos 40% de indecisos.
A Renascença aplicou o mesmo método matemático da Sondagem das Sondagens aos estudos de opinião antes de ser feita a distribuição de indecisos, para todas as sondagens de 2025, e observou que a percentagem de eleitores hesitantes cresceu mais de três pontos no último mês, estando agora perto dos 14%.
A percentagem é significante e seria o suficiente para os indecisos serem a terceira força política no país, segundo as sondagens, caso fossem considerados um partido.
A coligação da AD continuaria a liderar neste cenário, com 25,2%, enquanto o PS tem 23,4% sem a distribuição de indecisos e o Chega estaria ao lado dos indecisos, com 13,7% das intenções de voto.
A subida da percentagem de indecisos nas sondagens do último mês coincide com a descida do PS, que cai dois pontos desde a queda do Governo. Os socialistas tinham 25,4% das intenções de voto nas sondagens a 11 de março, descendo para os 23,4% agora. E a descida não é tão grande porque os últimos dois barómetros dão vitória ao PS. Até à semana passada, a queda era superior a três pontos.
A AD também desceu nas intenções de voto com a subida dos indecisos, mas menos: tinha 26,5% das intenções de voto no dia da moção de confiança que levou à queda do Governo de Luís Montenegro, caindo 1,3 pontos percentuais - a segunda maior descida entre todos os partidos.
O Chega caiu quase um ponto com a subida dos indecisos, enquanto a Iniciativa Liberal desceu meio ponto. O Livre registou uma subida das intenções de voto, mesmo com o crescimento de indecisos: está agora nos 3,9%, em relação aos 2,6% de há um mês.
São seis as casas de sondagens a realizarem sondagens para as eleições legislativas de 18 de maio: ICS-ISCTE, CESOP-UCP, Intercampus, Consulmark2, Aximage e Pitagórica.
De todas, a Aximage destaca-se como tendo percentagens historicamente baixas de indecisos: das 18 sondagens divulgadas este ano por meios de comunicação, as três com números mais baixos de indecisos pertencem aos barómetros realizados para o Diário de Notícias - 7,8%, 5,1% e 7,8%.
Nas eleições do ano passado, a percentagem de eleitores que decidiram o voto no dia das eleições foi de 13%, o que representou mais de 800 mil pessoas - o suficiente para virar o resultado de uma eleição para qualquer lado.
Tendo em conta que nunca votaram tantas pessoas em legislativas como em 2024, este foi também o maior número de pessoas a decidirem o voto no dia de eleições desde que são realizados estudos pós-eleitorais.
Os estudos pós-eleitorais das últimas eleições mostram um padrão no eleitorado: o grupo que mais tinha o voto decidido ainda antes da campanha eleitoral era o dos maiores de 65 anos - 86% já sabia em quem ia votar um mês antes das legislativas.
Segundo a sondagem à boca das urnas do ICS/ISCTE, por esta altura no ano passado, um terço dos eleitores na faixa etária dos 18 aos 24 anos ainda não sabia em quem votar.
Os jovens e os que têm habilitações de Ensino Superior foram os mais indecisos, com diferenças também entre sexo: mais de 80% dos homens tinham o voto decidido um mês antes das eleições; nas mulheres, a percentagem era de 73%.
Por partidos, a força política com os eleitores mais decididos antes da campanha foi a CDU - 93% decidiu o voto mais de um mês antes de 10 de março de 2024. Já o Bloco de Esquerda teve 26% dos seus eleitores a decidir o voto no próprio dia das eleições.
O dia das legislativas mostrou-se também determinante na vitória: a AD conseguiu mais de 260 mil votos (14% do seu eleitorado) no derradeiro momento, enquanto apenas 6% do eleitorado do PS (cerca de 108 mil) admitiu ter decidido aí o seu voto.
A mais recente sondagem do CESOP, que foi também o barómetro com maior amostra a ser divulgado este ano, mostra 15% de indecisos.
Esta percentagem é maior em mulheres (18%) que em homens (11%) e também é maior nos mais jovens (18%) que nos idosos (10%).
Nas transferências de voto, vemos que há uma maior percentagem de eleitores indecisos entre os que votaram PS no ano passado (12%) do que entre os que votaram na AD (11%).
Na mesma sondagem, e apesar da AD liderar as intenções de voto, há uma maior percentagem de inquiridos a indicar ser “provável ou muito provável” votar PS do que votar AD, o que mostra que as duas forças podem estar mais próximas do que as sondagens fazem parecer.