15 mai, 2025 - 13:40 • Diogo Camilo
No final da semana passada, a "tracking poll" da Pitagórica colocava o PS em “mínimos históricos” e o Chega em queda. As notícias são manifestamente exageradas e basta olhar para a amostra dos inquiridos que levou a esse resultado: 36,7% dos que responderam ao inquérito para TVI, CNN Portugal, Jornal de Notícias e TSF disseram ter votado na AD nas últimas eleições, quando a coligação do Governo teve apenas 29,5% dos votos em território nacional; já o PS e o Chega tiveram apenas 27% e 13% de eleitores a responderem à sondagem, respetivamente, quando os seus resultados nacionais nas eleições foram de 28,7% e 18,1%.
Este não foi um caso isolado: em todas as sondagens da Pitagórica desde o início do ano, o número de pessoas que diz ter votado na AD nas últimas eleições é sempre muito superior ao que realmente aconteceu a 10 de março de 2024.
Sondagens
Coligação entre PSD e CDS tem alargado vantagem pa(...)
E isso reflete-se nas intenções de voto que são mostradas: dos 10 melhores resultados da AD em sondagens este ano, sete são barómetros da Pitagórica ou renovações da sua “tracking poll".
Este maior número de eleitores da AD nas sondagens está a fazer com que as intenções de voto da coligação sejam favorecidas, em média, em mais de quatro pontos nos estudos de opinião da Pitagórica, calculou a Renascença, enquanto o PS está a ser subestimado em cinco décimas - um desvio médio de 4,6 pontos que faz com que a grande vantagem da coligação de PSD e CDS nos últimos barómetros da empresa se torne um empate técnico bem renhido com socialistas.
Nas seis sondagens e três vagas da "tracking poll" divulgadas pela Pitagórica este ano, a percentagem de pessoas que disse ter votado na AD variou entre os 33% e os 37,6%, apesar da percentagem real que a coligação teve nas últimas eleições ter sido de 29,5%.
A sobrerrepresentação de eleitores da AD nas sondagens desta empresa pode ser explicada de duas maneiras: ou a maneira como a amostra é recolhida tem algum problema, o que é improvável, ou tal poderá significar que quem votou na AD está mais predisposto a responder a inquéritos da Pitagórica que eleitores de outros partidos.
Questionada sobre esta questão pela Renascença, a Pitagórica argumenta que “há tendência para dizer que se votou AD”, por ser a força política que está no poder, mas admite que “pode estar a acontecer” uma sobrerrepresentação de eleitores da AD, em comparação com os do Chega ou do PS.
Legislativas 2025
"Tracking poll" da Pitagórica muda pouco na Sondag(...)
Alexandre Picoto, o administrador da Pitagórica, afirma que a empresa opta por “manter a regra da aleatoriedade” na amostra, por assumir que existe “volatilidade do eleitorado”, mesmo admitindo que possa ser pouca por terem acontecido eleições há pouco mais de um ano.
“O voto passado nunca é bom conselheiro. Muitas vezes, quando um eleitor muda de intenção de voto no presente, fá-lo no passado”, explica.
Para a sua sondagem, a empresa entrevista as pessoas por telefone (método conhecido por CATI) e preenche quotas de inquiridos com base na região, sexo e idade, mas deixa de parte o voto anterior como critério para a ponderação das intenções.
No entanto, há quem faça de forma diferente.
No caso dos estudos do Centro de Estudos e Sondagens de Opinião (CESOP), a sondagem também é realizada por CATI, mas a amostra é completamente aleatória e é depois estratificada com base na população por regiões, sexo, idade e pelo voto nas últimas eleições.
O diretor do CESOP, João António, assume à Renascença que "não há uma forma melhor de fazer as coisas" no que toca a sondagens, com todas as empresas a terem diferentes formas de distribuir indecisos, decidir amostras ou tipos de inquérito, referindo que é necessário assumir que os barómetros são "instrumentos com erro" associado.
O exercício que a Renascença fez foi simples: o número de inquiridos pela Pitagórica que disse ter votado em cada partido nas últimas legislativas foi ajustado tendo em conta o resultado real da respetiva força política nas eleições de 2024, à semelhança do que a Universidade Católica fez para as sondagens para a RTP, Antena 1 e Público.
Os cálculos não invalidam o trabalho realizado pela empresa de sondagens, apenas oferecem uma nova perspectiva, ponderando a amostra com base no voto de eleições passadas.
Ajustando os números aos resultados reais das legislativas do ano passado, a Renascença conclui que as intenções de voto na AD estão a ser sobrestimadas em 4,1 pontos nas sondagens da Pitagórica, enquanto o PS é subestimado, em média, em cinco décimas: apesar das intenções de voto estarem inflacionadas numa das sondagens, os eleitores do PS estão subrepresentados em outros sete barómetros ou vagas da "tracking poll".
Em quatro dos inquéritos, a AD surge favorecida em cinco ou mais pontos percentuais. Na última vaga da tracking poll, por exemplo, a AD surge com 33,7% das intenções de voto, após a distribuição de indecisos, enquanto o PS tem apenas 25,9% - um fosso de quase oito pontos.
Reconvertendo as intenções de voto com base no voto nas últimas legislativas, a percentagem da AD passa a ser de 28,3% - mais do que os 26,6% do PS, mas uma diferença de menos de dois pontos.
Somando as diferenças entre aquilo que a AD está a ser favorecida e o PS está a ser subestimado, obtemos desvios que estão acima dos seis pontos no início de maio.
De fora dos cálculos da Renascença ficou a última vaga da tracking poll da Pitagórica, que mostra uma aproximação do PS e do Chega e a AD a cair. A Renascença requisitou à Pitagórica o relatório desta vaga, com trabalho de campo entre 10 e 13 de maio, mas não recebeu resposta a tempo da publicação deste artigo.
O partido mais prejudicado, no entanto, é o Chega: em média, é subestimado em 2,8 pontos: em três sondagens, o partido tem menos quatro pontos do que deveria ter com ajustes à amostra.
Outros dois partidos que também têm sido beneficiados pelas sondagens da Pitagórica são a Iniciativa Liberal e o Livre, cujas intenções de voto foram sobrestimadas, em média, em 0,8 e 0,6 pontos - só num dos barómetros é que os liberais não foram beneficiados pela amostragem da casa de sondagens, enquanto o partido de Rui Tavares foi sobrestimado em todos.
Do lado contrário, o Bloco de Esquerda é o mais prejudicado, perdendo em média sete décimas, enquanto o PAN é subestimado em quatro décimas e a CDU perde três décimas.
A Renascença fez ainda o exercício hipotético de substituir as intenções de voto da Pitagórica pelos números ajustados das sondagens após ponderação na Sondagem das Sondagens e as diferenças no agregador mostram a AD a perder 1,8 pontos, caindo de 32,3% para 30,5% - o que colocaria ambos em empate técnico, pois o PS subiria de 26,6% para 27%.
O Chega seria o grande beneficiado, subindo de 17,4% para 18,6%, enquanto a Iniciativa Liberal cairia de 6,1% para 5,3%. Livre desceria ligeiramente, para os 3,5%, e ficaria colada a CDU e Bloco de Esquerdo, que cresceriam para os 3,4%.
Para o professor e coordenador do agregador de sondagens do Instituto Superior Técnico, Henrique Oliveira, a explicação desta sobrerrepresentação de eleitores da AD nas sondagens da Pitagórica e subrepresentação de eleitores do Chega e do PS pode ser explicada por algo que aconteceu no Reino Unido em 1992.
Com a saída de Margaret Thatcher do Partido Conservador britânico, John Major assumiu a liderança do partido e foi para eleições em desvantagem na grande maioria das sondagens. No dia das eleições, venceu por uma margem de 7,6 pontos percentuais em relação ao Partido Trabalhador.
“Há partidos que sistematicamente têm sido subestimados nas sondagens e depois têm um score [resultado] um bocadinho melhor nas eleições, ou mesmo bastante melhor. Um desses exemplos é o PS, não é? Com a maioria absoluta de António Costa. O Chega em várias eleições teve sempre, surpreendentemente, mais votos do que aquilo que estava anunciado”, exemplificou o matemático à Renascença.
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Henrique Oliveira lembra também que nas últimas eleições, as sondagens apontavam para uma vitória folgada da AD, que se veio a comprovar numa vitória marginal - por cerca de 50 mil votos.
Usando como exemplo a Sondagem das Sondagens, o agregador da Renascença, a AD surgia com 32,5% das intenções de voto antes das eleições, acabando por terminar com 29,5% em território nacional.
Já o PS, que registava 27,8% no agregador, veio a subir ligeiramente no dia de eleições, para os 28,7%.
Atualmente, AD e PS têm sensivelmente as mesmas intenções de voto que tinham há um ano: a coligação de PSD e CDS tem 32,2% e desceu três décimas, enquanto o PS tem 26,5% e desceu pouco mais de um ponto.
Os resultados das ponderações foram realizados tendo em conta as seis sondagens publicadas pela Pitagórica na página da ERC e as três vagas da "tracking poll" com amostra totalmente renovada, para um total de 6.255 inquiridos em sondagens realizadas com trabalho de campo entre os dias 28 de dezembro e 9 de maio. A Renascença requisitou, junto da Pitagórica, a mais recente vaga da tracking poll, mas não recebeu a resposta antes da divulgação deste artigo.
Para a ponderação, as respostas à pergunta "Nas eleições legislativas passadas em quem votou, sabendo que concorreram a Primeiro-ministro os seguintes candidatos?" e a intenção de voto em cada partido para estas eleições associadas foram ajustadas aos resultados em território nacional de cada partido nas últimas eleições legislativas.
Os resultados após ponderação têm o mesmo grau de confiança e margem de erro da respetiva sondagem (que varia entre os +/- 5 pontos nas primeiras três sondagens, aos +/- 3,16 nas sondagens com 1000 inquiridos em fim de março e abril e aos +/- 3,51% nas vagas da tracking poll).
A amostra da Pitagórica cumpre quotas por sexo, idade e distrito com base nos cadernos eleitorais no final de 2024, e foi recolhida através de entrevista telefónica (CATI), com a distribuição dos indecisos da Renascença a realizar-se de maneira proporcional, tal como nas sondagens originais.
Para este exercício foram apenas utilizadas as sondagens da Pitagórica por ser a única casa de sondagem que mostra valores entre o voto nas últimas legislativas e a intenção de voto atual.