Como foram as legislativas? Noite longa à direita, noite fatal à esquerda

19 mai, 2025 - 03:43 • Fábio Monteiro

A AD – Coligação PSD/CDS venceu as eleições legislativas deste domingo, mas ficou longe da maioria absoluta. O PS sofreu a sua maior derrota desde 1987 e ainda pode ser ultrapassado pelo Chega em mandatos – quando se conhecerem os resultados dos círculos da emigração. Pedro Nuno Santos anunciou a demissão da liderança do partido. A esquerda teve o pior resultado conjunto desde o 25 de Abril.

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A noite eleitoral não ia ser favorável ao Partido Socialista: isso foi visível, quase desde o primeiro instante, este domingo, após o encerramento das urnas das segundas legislativas em dois anos.

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À chegada ao Hotel Altis, Pedro Nuno Santos apareceu de semblante carregado. Sem uma mensagem concreta, comentou apenas que as sondagens à boca das urnas “já falharam no passado” – porventura, mais para se convencer a si próprio do que os portugueses e tendo já conhecimento das projeções que as televisões iam avançar daí a pouco.

A imagem do secretário-geral do PS contrastou com a de Luís Montenegro, quando, minutos depois, chegou ao Hotel EPIC Sana Marquês. Entrou com tranquilidade e confiança, foi recebido com aplausos, não respondeu a perguntas. A atitude serena, todavia, deixava antever que sentia ter o terreno a seu favor.

E não estava enganado.

Sondagens acendem os alarmes no PS e chovem críticas

Às 20h00, as projeções divulgadas pelos principais canais televisivos precipitaram uma guinada no rumo da noite. Anteviram (com exatidão) uma vitória da AD, embora sem maioria absoluta. (Hugo Soares começou logo a falar em “vitória eleitoral reforçadíssima”.) Mas, mais surpreendente, as projeções revelaram um empate técnico entre PS e Chega.

No PS, o impacto foi imediato. A hipótese de o partido ser ultrapassado pelo Chega em número de votos ou mandatos congelou os ânimos.

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No espaço de minutos, a tensão transformou-se rapidamente em críticas internas. Sérgio Sousa Pinto foi dos primeiros a reagir, pedindo de forma clara a saída de Pedro Nuno Santos: “Ou o PS muda de direção, ou a direção acaba com o partido”.

Em declarações à Renascença, Mariana Vieira da Silva, ex-ministra da Presidência e candidata por Lisboa, assumiu uma postura autocrítica: “É uma derrota muito pesada. O PS falou pouco de futuro e legitimou demasiado as posições do Chega.” A dirigente reconheceu que os socialistas falharam na mobilização do eleitorado progressista e perderam espaço para a extrema-direita.

António Vitorino, putativo candidato do PS nas eleições presidenciais, falou, "na SIC", numa “alteração estrutural do sistema político”.

Vitória da AD, colapso da esquerda e ascensão do Chega

Finda a contagem nacional, os portugueses ficaram a saber: a Aliança Democrática elegeu 89 deputados. O PS e o Chega ficaram ambos com 58 mandatos. (Faltam ainda distribuir 4 deputados dos círculos da emigração.)

O Chega, que se estreou no Parlamento em 2019 com um deputado, cimentou, pois, a sua posição como força política nacional.

André Ventura reagiu com euforia, sublinhando que o resultado representa “o fim do bipartidarismo” e prometendo “exigir contas a todos os poderes em Portugal”.

A Iniciativa Liberal cresceu e também festejou – mas pouco. Elegeu nove deputados, apenas mais um do que na anterior legislatura. “O nosso papel será no Parlamento, continuando a defender as nossas ideias”, fez saber Rui Rocha. (Os partidos de direita em conjunto terão deputados suficientes para levar a cabo uma revisão constitucional, se o assim desejarem.)

À esquerda, o ambiente foi de tudo menos euforia. O Bloco de Esquerda perdeu elegeu apenas uma deputada, a líder do partido, Mariana Mortágua, por Lisboa. A dirigente assumiu: Foi uma grande derrota.” (Ainda assim, a coordenadora do BE anunciou que apresentará uma moção no próximo congresso para disputar novamente a liderança.)

A líder do PAN, Inês Sousa Real, provou ser uma sobrevivente. Foi eleita por Lisboa, voltando a ser a única deputada do partido. Assumiu que o resultado ficou aquém das expectativas, mas considerou importante manter presença no Parlamento: “Neste momento de tantas ameaças, a nossa voz não pode desaparecer.”

A CDU elegeu apenas três deputados, menos um que na anterior ida às urnas. Paulo Raimundo disse que é tempo de assumir "o caminho da resistência".

O Livre foi o único partido à esquerda a crescer: elegeu seis deputados. Rui Tavares destacou o simbolismo do resultado e prometeu lutar contra a radicalização da direita: “não baixamos os braços, nem achamos normal uma extrema-direita tão forte e uma esquerda a recuar.”

Houve ainda espaço para algo novo: o Juntos pelo Povo (JPP), partido madeirense que conseguiu eleger um deputado, aumentando para dez o número de forças políticas com assento parlamentar — um novo recorde na Assembleia da República.

Pedro Nuno Santos demite-se

Já passava da meia-noite quando Pedro Nuno Santos surgiu para discursar. O ar grave confirmou o que muitos no PS já antecipavam: o secretário-geral demitia-se da liderança do partido.

“Assumo as minhas responsabilidades, como sempre fiz. Vou, por isso, pedir eleições internas, às quais não serei candidato”, anunciou.

A decisão, explicou, visa não condicionar o futuro posicionamento do PS face ao novo Governo: “O partido tem de tomar decisões importantes e eu não quero ser um estorvo.”

Pedro Nuno Santos mostrou-se combativo nas palavras, mas resignado no gesto. Rejeitou qualquer apoio do PS ao futuro executivo de Luís Montenegro (deixando essa decisão nas mãos do próximo líder) e criticou o crescimento do Chega: “A extrema-direita tornou-se mais violenta, mais agressiva, mais mentirosa. Tem de ser combatida com firmeza, olhos nos olhos.”

Montenegro vence, governabilidade em aberto

Luís Montenegro subiu ao palco como vencedor da noite. Mas, cauteloso, reconheceu a ausência de maioria absoluta e apelou à responsabilidade das forças políticas para garantir a estabilidade.

“O povo falou com clareza. Quer este Governo e não quer outro. O programa é o da AD. O primeiro-ministro é o atual. E todos devem ser capazes de colocar o interesse nacional acima de qualquer outro”, afirmou.

Montenegro reiterou a exclusão de qualquer entendimento com o Chega e dirigiu-se diretamente ao PS, agora em transição interna, para assumir um papel responsável. Sobre os próximos passos, remeteu decisões para as audiências com o Presidente da República.

O caminho da governabilidade, todavia, continua incerto. Sem maioria com a Iniciativa Liberal e com o Chega excluído dos entendimentos, Montenegro terá de encontrar um equilíbrio político delicado para conseguir investir e sustentar o seu Governo.

Montenegro prometeu aos portugueses: “Nós vamos ser o Governo para todos, todos, todos.” E, até prova de contrário, terá de negociar com todos, todos, todos.

Afinal, Marcelo Rebelo de Sousaavisou: “O Presidente está à-vontade para nomear um Governo, tendo a certeza de que o Governo não é rejeitado imediatamente. Não está à-vontade para o nomear, não tendo essa certeza.” A noite deste domingo vai, pois, prolongar-se durante mais alguns dias ou mesmo semanas para a direita.

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