01 mar, 2025 - 14:55 • Alexandre Abrantes Neves, enviado especial a Roma
Foi automático. Francisco ainda mal tinha aparecido na varanda central de São Pedro em março de 2013 e já Ana Vilaverde tinha elegido este Papa como o seu preferido.
“A minha filha, a Francisca, nasceu mais ou menos na altura em que ele se tornou Papa." A semelhança nos nomes foi uma “coincidência feliz” e, a partir daí, esta família de Vila Real colocou o Santo Padre no quadro de honra das figuras preferidas de lá de casa.
Com pena e por falta de ocasião, não conseguiram acompanhar o “Papa peregrino” durante a Jornada Mundial da Juventude em 2023. Mas isso não os impede de abrir a caixa de pandora e desenrolar um enorme fio de acontecimentos em que Francisco os marcou.
“A imagem que me vai ficar sempre é aquela imagem da quarentena, da Covid-19. Ele a atravessar esta praça sozinho. É uma imagem que irei recordar sempre dele”, relembra, numa das muitas memórias e reflexões que têm surgindo em catadupa nos últimos dias, desde que o estado de saúde do Papa se agravou.
A Renascença em Roma
Sábio, carinhoso, direto ao assunto. Preocupado co(...)
Ana é devota convicta de Nossa Senhora de Fátima: “Até já lhe pedi por uma reviravolta na saúde dele!” Hoje casada e com quatro filhos, precisa de puxar a fita atrás uns bons anos para nos contar esta ligação especial.
Ainda criança, os três pastorinhos eram tema de conversa habitual em casa, nomeadamente com o avô. O tempo foi passando, o avô envelheceu e, no final da vida, a demência já não permitia separar o amor aos netos pela devoção a Francisco, Jacinto e Lúcia.
“Quando estava para morrer, olhou para a nossa fotografia e disse os três nomes, mas dos três pastorinhos”.
O tom de voz embargado parece revelar o início de uma viagem a alta velocidade por uma espiral de memórias e emoções. A escapatória é regressar ao Papa: “[Acho que há] essa ligação com os três pastorinhos. A simplicidade, a humildade."
E não é a única por estas bandas a lembrar-se das aparições. A recitação do terço desta sexta-feira foi aquela que mais fiéis mobilizou até à Praça de São Pedro na última semana. Talvez também por isso se oiça ainda mais português.
“Sinto-me aqui como se me sentisse em Fátima. É um momento santo”. Rosa Neto está a passar o fim-de-semana em Roma com a filha, para celebrar o aniversário. O entusiasmo de estar pela primeira vez em Roma nota-se bem nos gestos acelerados e no ritmo de conversa que nunca quebra. Aterrou vinda de Paris e foi direta ao Vaticano para pedir que a “luz” dos três pastorinhos traga Francisco de novo à janela do Palácio Apostólico.
A Renascença em Roma
À terceira noite de recitação do terço no Vaticano(...)
Francisco – o apóstolo do “diálogo”, que não “olha a obstáculos” e que pede por todos “até por quem não tem fé” – encontra nas palavras de Rosa uma longa caminhada ainda por trilhar.
“Eu acho que Deus ainda não quer que o Papa Francisco vá. Onde ele está, há muitas multidões. Não é por nada, é a luz dele, a luz de Deus que vem através dele, para nos dar a nós”. E, quem sabe, pode ser esta a luz que se vê nos olhos de Rosa.
Em Espanha, a relação entre Marisol e a Igreja é mais distante. É raro ir à missa e não se envolve em movimentos católicos, mas, uma vez de férias em Roma com o marido e com amigos, não quis deixar de vir agradecer pelo Papa que personifica um “passo importante” para a Igreja.
“Coincidiu com um momento histórico, da convalescença do Papa. Viemos rezar por ele, (…) neste ambiente acolhedor e muito importante. É um Papa diferente, mente aberta, mais perto da juventude”.
As imagens dos últimos dias têm mostrado bem isso – e, até numa sexta-feira à noite, a Praça está recheada de adolescentes e jovens adultos. Um deles fez um caminho bem longo até aqui chegar. Walter veio de Siderno no sul de Itália para acender uma vela pela saúde de Francisco, o Papa que lhe “mudou a vida” ao recuperar-lhe a fé cristã.
“Lembro-me do primeiro dia, quando pediu para não nos esquecermos de rezar por ele. Desde o início, que se mostra como um homem como todos os outros. Está a trabalhar para deixar o mundo num lugar melhor, como o João Paulo II, mas ainda melhor”.
E, por isso, o que resta a Walter é mesmo é dizer "obrigado" vezes sem conta – e esperar que o esvoaçar frenético das gaivotas sob a Praça São Pedro traga finalmente boas novas.