Renascença em Roma

Entrevista a D. Américo Aguiar: Igreja não pode fazer "marcha-atrás" depois de Francisco

25 abr, 2025 - 00:30 • Ana Catarina André , Beatriz Pereira (enviadas da Renascença a Roma)

Em entrevista à Renascença, em Roma, o cardeal português defende que "temos que continuar, como diz o Papa: ‘Adelante’”. D. Américo Aguiar afirma que, com a morte de Francisco, o mundo fica em "'sede vacante' no que significa uma voz respeitada, querida, amada, ouvida".

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D. Américo Aguiar: Igreja não pode fazer "marcha-atrás" depois de Francisco
D. Américo Aguiar: Igreja não pode fazer "marcha-atrás" depois de Francisco

O cardeal D. Américo Aguiar considera que a escolha do próximo Papa não poderá ser sinónimo de retrocesso para a Igreja.

Em entrevista à Renascença, o também bispo de Setúbal, que em breve participará no Conclave para a eleição do sucessor de Francisco, diz que, no que depender de si, não haverá “marcha-atrás”.

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“O Espírito Santo leva sempre a Igreja para a frente, não tem retrovisor, não tem essa tentação de voltar atrás. Não tem, não pode ter e, daquilo que depende de mim, não terá, obrigatoriamente. Nós temos que continuar, como diz o Papa: ‘Adelante’”, afirma D. Américo Aguiar.

Francisco era atualmente, segundo o cardeal português, a única figura respeitada num mundo mergulhado em várias crises. O próximo Papa terá necessariamente de considerar a atual situação geopolítica internacional, sublinha D. Américo Aguiar.

Conhecendo bem o pontificado do Papa Francisco e o seu legado, quais são os aspetos que considera serem fundamentais no próximo pontificado?

Eu preferia traduzir este pontificado arriscando uma palavra: fraternidade.

O Papa Francisco, do primeiro dia até aos últimos momentos, provocou-nos, convidou-nos, exortou-nos e testemunhou, junto de cada um de nós e da humanidade inteira, a urgência da fraternidade universal. Descobrirmo-nos, irmãos, o bem comum.

Estou convencido que muitos problemas do mundo de hoje, da guerra à guerra económica e tantos outros, se resolverão quando eu olhar para quem está do outro lado da mesa, para eu olhar para quem está a viver aquele problema, não como uma ameaça, não como um problema, mas como um irmão. E a partir daí as coisas resolvem-se.

Este foi, desde o primeiro momento, a marca essencial deste legado do Papa Francisco. Depois pode ter várias variantes, seja a questão da [encíclica] Laudato Si, seja a questão do seu último documento, da devoção ao Sagrado Coração de Jesus, mais o núcleo espiritual, mas sempre nesta coerência da fraternidade universal. Fratelli tutti. Estou convencido que foi e estou convencido, totalmente, que tem que continuar a ser.

Ou seja, essa será uma característica fundamental no próximo Papa?

Sim, independentemente de quem seja. Eu estou convencido que o Espírito Santo nestas coisas não tem marcha atrás. O Espírito Santo leva sempre a Igreja para a frente. Não tem retrovisor, não tem essa tentação de voltar atrás, de fazer marcha atrás. Não tem e não pode ter.

E daquilo que depende de mim, não terá, obrigatoriamente. Nós temos de continuar, como dizia o Papa: "Adelante!".

O Papa Francisco defendeu um conjunto de causas: os pobres, os migrantes, a questão ecológica. Nestas conversas prévias que vão tendo os cardeais, estes já são temas que estão a ser discutidos?

Nós não nos podemos pronunciar sobre os conteúdos das reuniões. Eu gostava de repetir algo que disse há dias que acho que é importante para os portugueses e para Portugal, até atendendo a que o tema é muito usado politicamente e a nível partidário. O nosso muito querido e já saudoso Papa Francisco falou-nos dos migrantes com o coração de alguém que viveu na primeira pessoa a situação de migrante.

Nós não podemos esquecer que ele é filho e neto familiar de pessoas que foram migrantes da Itália para a Argentina. E quando temos a oportunidade de ler a biografia do Papa, "Esperança", nós ficámos a entender ainda melhor porque razão é que os migrantes tiveram um lugar tão especial no coração do Papa Francisco.

E é exatamente a tal fraternidade. Nós, se olharmos para estes irmãos e irmãs do Mediterrâneo, da Ásia, da África, da América Latina, sejam de onde forem, e formos capazes de um afeto por um irmão, todos os problemas que temos elencado desaparecem imediatamente e fraternalmente tentamos resolver.

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Destas crises que o mundo hoje enfrenta, as guerras e as questões económicas, qual pode ser mais desafiante para o exercício do próximo pontificado?

O mundo e a Europa, de modo especial, tem um défice de figuras a quem a humanidade ouça de modo transversal. E a única figura que o mundo recentemente tinha era Francisco. Significa que estamos aqui numa "sede vacante" também no que significa uma voz respeitada, querida, amada, ouvida.

A situação que vivemos atualmente, geopolítica de guerra, de economia, da sociedade, do reajustamento das potências, tudo isto será certamente um grande desafio, um enorme desafio de Pedro, independentemente de quem seja, independentemente de quem vem. Mas, segundo aquilo que é a nossa fé, nós acreditamos que quando Deus entrega um desafio, também entrega as capacidades e as forças necessárias para o seu desempenho. Por isso, total confiança e esperança naquilo que o Espírito Santo nos vai dizer.

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