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Festival Tribeca

De Niro com elogios a Lisboa e a pedir uma "arte pela verdade" que combata Trump. Já começou o Tribeca Lisboa

18 out, 2024 - 16:31 • Alexandre Abrantes Neves

A primeira edição do festival de cinema em Lisboa trouxe muitos recados políticos por parte do ator e fundador do festival, que quer armas e bagagens a combater o "mundo polarizado que precisa de empatia e diversidade". Carlos Moedas marcou presença e não esclareceu se vai haver uma segunda edição na cidade - mas prometeu estudar uma redução do preço dos bilhetes no futuro.

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Reportagem Alexandre Abrantes Neves Tribeca 18 outubro 2024
Ouça aqui a reportagem da Renascença. Foto: José Sena Goulão/Lusa

A máquina demorou a aquecer. Pelas 11 horas, já cerca de sessenta minutos depois da abertura de portas, nas ruas do Beato Innovation District ainda se aprontavam os últimos detalhes e era pouco o movimento que se fazia sentir entre o detalhe e a harmonia estética dos edifícios restaurados e onde há muitas décadas houve fábricas de pão e centrais elétricas.

A timidez do arranque lá passou e, assim que o fundador do festival chegou ao recinto, ouviu-se do palco o pontapé de saída da primeira edição do festival Tribeca em Lisboa: “Robert De Niro enters the room” (em português, Robert De Niro entrou na sala).

Atrasado para este evento de arranque com a imprensa, De Niro não se esqueceu do sentido de humor e puxou logo por ele nos primeiros minutos, depois de lhe perguntarem que memórias guarda de viagens passadas a Lisboa: “o que se passa em Portugal, fica em Portugal”.

Mas, para além da boa disposição, o Al Capone de “Os Intocáveis” trazia uma série de recados políticos no bolso.

Já na tenda principal – onde eram raras as cadeiras livres (a organização espera 1.500 pessoas este fim de semana), quase todas ocupadas não por anónimos, mas por personalidades do audiovisual português –, o ator norte-americano voltou a criticar os extremismos políticos e apontou a mira para um alvo que conhece bem: Donald Trump.

“A verdade é a verdade. A mentira é a mentira. No início, Donald Trump falava de factos alternativos – mas o que é isso? (...). Há pessoas que acreditam que o 6 de janeiro foi uma festa de amor. Trump disse isso, mas não foi – eles estavam a tentar atacar o capitólio. Ponto final”, criticou, entre uma ovação de palmas da plateia.

Perante o cenário “assustador” de que estes discursos podem “convencer e intimidar as pessoas a acreditarem em algo que sabem que não aconteceu”, De Niro deixou claro que o papel da arte – mesmo quando é ficção – passa “sempre” por contar a verdade, com uma “mensagem com a qual as pessoas se identifiquem e vejam que é verdadeira e válida”.

Logo ao lado, Jane Rosenthal, a sócia que construiu com De Niro o sonho de um festival para reerguer Manhattan depois dos atentados do 11 de setembro, concordou que “a empatia tem de vencer sempre” e que um festival de cinema como Tribeca tem o poder de combater o mundo polarizado.

“Estes festivais são uma fantásticos para vermos histórias de diferentes pontos de vista. Deixarmos as pessoas ouvirem-se – em vez de estarem sempre a gritar umas com as outras. (...) A arte pode ser um veículo de mudança social, mas é importante não nos esquecermos de que, em entretenimento, tudo é sobre contar histórias. Se conseguirmos fazer as duas coisas é o ideal”, defendeu.

Portugal é o "local ideal para o Tribeca"

Sobre o “salto de fé”, de trazer o festival para fora dos Estados Unidos 22 anos depois da primeira edição, Robert De Niro não deixou margem para dúvida – Portugal é “local perfeito para atividades culturais, é extraordinário”.

Jane Rosenthal alinha nesta posição e acredita que em Lisboa se vai continuar o espírito e até aprofundar as bases de um festival que hoje engloba muito mais do que cinema e quer “contar histórias em várias plataformas”.

Os valores do Tribeca já existem, mas ao juntarmo-nos aqui temos uma oportunidade para ir mais longe e construir algo novo. Vai ser algo muito especial. Estamos verdadeiramente gratos e felizes por estar aqui convosco”, confessou.

Ainda assim, o futuro do Tribeca, seja em Lisboa ou noutras geografias, não ficou esclarecido: “o que interessa é o que vamos fazer aqui hoje e amanhã”, rematou a produtora de filmes como “Bohemian Rapsody” ou “Marvin’s Room” (em Portugal, “Duas Irmãs”).

Próxima edição não é certa, mas fica compromisso de baixar o preço

Presente no arranque do festival, Carlos Moedas insistiu que trazer o Tribeca para Lisboa é uma forma de “abertura e diversidade” – especialmente, por se realizar junto às zonas do Beato e de Marvila é “especialmente relevante”, por estas serem “duas das freguesias com mais dificuldades” e por o festival se situar perto de um centro de acolhimento de sem abrigo.

Questionado pelos jornalistas se a abertura não fica comprometida pelo preço dos bilhetes – 70€ para um dia e 135€ para os dois –, o autarca lisboeta sublinha que “as portas vão abrir de forma gratuita a partir das 19h30” e que esse é um assunto a avaliar numa possível futura edição.

“Isso é uma responsabilidade do evento. Este evento tem uma fórmula que vem de um país que já testou, que está aqui e que nós temos que respeitar. Nós temos lutado e, por isso, foi aberto a todos estes concertos a partir de certa hora. É a primeira vez que se faz, é a primeira vez que o trazemos para Portugal, portanto vamos, sem dúvida, melhorar”, respondeu.

O presidente da Câmara Municipal de Lisboa não esclarece, no entanto, se o festival vai regressar à capital para uma segunda edição – mas “se tudo correr bem”, Moedas vê no Tribeca uma excelente oportunidade para a cidade.

“A génese do festival é a interseção entre a cultura, a arte e a tecnologia, que é algo muito forte. As áreas da criatividade e da inovação são as que mudam as cidades e são elas que fazem das cidades produtoras de emprego e também de condição de vida para as pessoas. E eu queria muito que fosse neste espaço e, portanto, lutei muito, sempre com um grande apoio, obviamente, da organização”, rematou.

Até sábado, o programa do Tribeca conta com mais do que sessões de cinema. Estão previstas sessões de debate e de conversa, gravação ao vivo de episódios de podcast, exibição de filmes e séries e concertos - Dino d’Santiago ou Gisela João são alguns dos nomes que vão passar pelo Beato Innovation District. O programa dos dois dias de festival está disponível aqui.

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