07 fev, 2025 - 11:20 • João Malheiro
Há duas semanas, "Emilia Pérez" assumia-se como um dos filmes em maior destaque nos Óscares, liderando a lista da 97.ª edição com 13 nomeações. Hoje, o filme está envolto em polémica e as casas de apostas começam a apontar a longa-metragem como uma das maiores prováveis derrotadas da cerimónia.
O que é que aconteceu para uma mudança tão brusca? A descoberta de declarações polémicas da protagonista do filme, Karla Sofía Gascón, nomeada para Melhor Atriz, que está a ser acusada de racismo e xenofobia.
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Nas suas redes sociais, a atriz espanhola classificou muçulmanos como "retardados" e "energúmenos", o Islão como "uma infeção" e pediu a expulsão de "mouros" de Espanha. Karla Sofía Gascón referiu-se, também, a George Floyd - afro-americano morto por um polícia em 2020 - como um "drogado". E, em 2021, classificou a edição dos Óscares desse ano como "um festival afro-coreano".
A pandemia da Covid-19 levou a artista a manifestar posições próximas das ondas negacionistas da época, considerando que "a vacina chinesa" poderia implementar chips em quem a tomasse. Em 2019, defendendo as suas opiniões controversas, escreveu, de forma irónica: "É a minha opinião e têm de a respeitar. Não entendo tanta guerra mundial contra Hitler, ele simplesmente tinha a sua opinião sobre os judeus".
A publicação mais caricata terá sido uma crítica à vida amorosa de Selena Gomez em que chamou a cantora de "ratazana rica". Anos mais tarde, seriam colegas de elenco em "Emilia Pérez".
A verdade é que esta já não é a primeira polémica em que Karla Sofía Gascón se envolve desde o início da época de prémios em Hollywood. Na semana passada, a atriz criticou a equipa da brasileira de Fernanda Torres, que também está na corrida para a estatueta de Melhor Atriz, alegando estar a ser alvo de cyberbullying.
A declaração rapidamente ganhou eco nas redes sociais, levantando questões sobre a postura da atriz espanhola e até sobre a possibilidade de a sua nomeação para Melhor Atriz ser anulada. Os candidatos não podem fazer campanha contra outros filmes. No entanto, a Academia de Cinema norte-americana não tomou medidas punitivas.
Quer "Emilia Peréz" e "Ainda Estou Aqui" estão nomeados nas categorias de Melhor Atriz, Melhor Filme e Melhor Filme Internacional na cerimónia de entrega de prémios. E foi, precisamente, na sequência deste duelo, que vários cibernautas acabaram por desenterrar as publicações mais polémicas da protagonista de "Emilia Pérez".
Desde então, Karla Sofía Gascón negou a veracidade das publicações mais polémicas, mas a verdade é que de facto existiam e vários utilizadores do X (antigo Twitter) conseguiram repartilhá-las, antes do perfil da atriz ter sido apagado pela própria.
A transmissão está marcada para a meia-noite de 3 (...)
A reação da artista não ficou por aí. Sem qualquer coordenação com a Netflix - que promove a campanha promocional e distribuição mundial do filme - Karla Sofía Gascón deu uma entrevista de quase uma hora à CNN espanhola em que recusou as acusações de racismo e alegou estar a ser alvo de uma campanha de ódio.
A atriz espanhola, que é uma mulher transgénero, garantiu ser solidária com os desafios que outras minorias enfrentam e manifestou "as mais sinceras desculpas a quem possa ter sido ofendido pela forma como me posso expressar no passado, no presente e no futuro". A entrevista não convenceu e as reações nas redes sociais foram amplamente negativas. Nos bastidores, a indústria especializada refere que houve grande choque e desconforto pelo facto de Karla Sofía Gascón ter reagido à polémica sem ter avisado ninguém da equipa de "Emilia Pérez".
Um dos momentos mais criticados da entrevista foi quando a atriz espanhola disse que não podia ser racista, pois trabalhou com Zoë Saldaña durante a rodagem do filme. E foi, precisamente, a atriz com ascendência porto-riquenha e dominicana, que também está nomeada para os Óscares e é apontada como favorita na categoria de Melhor Atriz Secundária, a primeira pessoa a condenar publicamente Karla Sofía Gascón.
"Estou muito triste e desapontada. Não apoio ódio ou racismo contra qualquer grupo. É isso que defendo", referiu, questionada pelos jornalistas sobre o tema.
Esta semana, a Netflix lançou novas imagens a promover o filme na campanha até aos Óscares e, notavelmente, não faz qualquer referência a Karla Sofía Gascón, focando-se apenas no resto do elenco. Segundo o "The Hollywood Reporter", há uma enorme tensão entre a equipa da atriz espanhola e a empresa de streaming e as duas partes estão de comunicações praticamente cortadas.
A mais recente reação à polémica de Karla Sofía Gascón veio do realizador de "Emilia Pérez" que, à imprensa, referiu que ainda não falou com a sua atriz principal "nem quer".
Jacques Audiard considera que a artista espanhola "está num percurso de autodestruição" e não "pode desculpar" as suas declarações e ações.
Já esta sexta-feira, numa publicação no seu Instagram, Karla Sofía Gascón diz que "compreende" a entrevista do realizador da longa-metragem e anuncia que vai ficar em silêncio e ausentar-se de futuras galas e eventos de promoção do filme.
"Decidi que o trabalho pode falar por si, esperando que o meu silêncio permita que o filme seja apreciado pelo que é", escreveu.
A presença da atriz era esperada nos prémios Goya - os Óscares espanhóis - este fim de semana, mas tal já não deve acontecer. O resto do elenco e da equipa de "Emilia Pérez" deve continuar a marcar presença em vários eventos.