Ali ao lado, sentado num banco de jardim de Valverde, a capital de El Hierro, Rodrigo Quintero defende que a convivência com os que chegam não podia ser melhor. “Para mim, é fabulosa. Alegra-me os olhos quando os vejo a jogar futebol no campo, com os miúdos daqui. Quando vão à escola e se integram.”
Já a falta de soluções é uma preocupação para Guillermo Sanchez, residente na ilha. “Eu sou muito emocional e dá-me pena, porque todos neste mundo fomos imigrantes noutros países, também. Vejo que as coisas estão a complicar-se cada vez mais, e não sei que medidas podem ser tomadas”, desabafa, antes de interromper a conversa para ir atrás do neto, com pouco mais de três anos, que insiste em fugir do avô e dos pais.
Mudar a lei para distribuir os menores?
A distribuição de migrantes menores não acompanhados desencadeou uma enorme luta política entre o governo das Canárias e o governo de Espanha. Roberto Garcia, residente na ilha de Gran Canária, não compreende.
“Sentem-se no Parlamento e debatam isto. Se tiver de ser durante 12 horas, que seja. Encontrem uma solução", pede. "Às vezes não estão de acordo para angariar e somar votos? Pois que solucionem este problema.”
Já Rodrigo Quintero considera que é tempo de acabar com discussões “que não levam a lado nenhum”.
“Que é competência da comunidade autónoma das Canárias a questão da imigração? Sim”, acredita este “herreño”. Mas dado o fenómeno que se está a produzir, “devem mudar essa competência”, defende, confessando-se triste com o espetáculo a que tem assistido. “Eu acompanho as notícias e o que vejo são políticos a discutir uns com uns outros, no Parlamento e no Congresso, a insultarem-se. 'Tu fizeste melhor ou pior, não foi culpa minha, não é minha competência…' A competência é do ser humano”, entende.
Sentado numa esplanada de um café de Valverde, o joalheiro artesanal Mário Comas toma o pequeno-almoço sob o olhar atento do seu cão Majorero, raça nativa das Canárias.
“Incomoda-me que a Europa não tome conta do assunto, sendo estas ilhas tão pequenas", atira. "Que a Europa não seja capaz de dizer 'vamos repartir todos, dar-lhes asilo'”, explica, enquanto dá mais um gole num café com leite.
“Chegam aqui muitos europeus e não incomoda. Porquê? São loiros, branquinhos, de olhos claros. E estes são todos negros.”
O joalheiro questiona: “Quando começou a guerra na Ucrânia, quantos foram recebidos na Europa, sem problema? Porque não se recebe de igual forma os africanos?”
A “hipocrisia política face à questão da imigração nas Canárias tem aumentado”, afirma Alpidio Armas. É presidente do Cabildo de El Hierro — uma instituição governamental e administrativa, existente em cada uma das ilhas do arquipélago, em que o presidente eleito tem um nível de autoridade entre a ilha e a comunidade autónoma das Canárias.
“Os grandes partidos nacionais, e em particular o Partido Popular, está a obstruir a aprovação de uma lei para que se possa abordar a transferência dos imigrantes menores. E isto não é compreensível”, sustenta o presidente do Cabildo, eleito pelo PSOE.