Melhor escola pública do país pôs o elevador social a funcionar e construiu uma “família” que é craque a matemática

A EBS Dr. Ferreira da Silva fica em Cucujães, Oliveira de Azeméis, e alcançou o 32.º lugar do ranking geral. A pequena dimensão da escola permite aproximar alunos e professores, mas a condição periférica e semi-urbana acarreta também desafios.

04 abr, 2025 - 00:00 • Miguel Marques Ribeiro



Vídeo: Veja como funciona a melhor escola pública, que tem uma dimensão quase familiar

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“Aqui na escola é como se estivesse em casa”, diz Miguel Costa. Tem 17 anos e é aluno na melhor escola secundária pública do país em 2023/24, segundo os cálculos feitos pela Renascença.

A Escola Básica e Secundária Dr. Ferreira da Silva, situada em Oliveira de Azeméis, no distrito de Aveiro, ficou em 32.º lugar nos rankings — dominados, mais uma vez, pelas escolas privadas.

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Esta “é a minha gente, gente da minha terra”, reforça o estudante de sócio-económicas com aspirações a seguir gestão ou economia no ensino superior, no próximo ano letivo.

E não são só os atuais alunos que sublinham a dimensão quase familiar desta escola que serve a Vila de Cucujães. Em 2023/24, Rita Assunção conquistou notas de excelência que lhe permitiram entrar no curso de Gestão da Faculdade de Economia da Universidade do Porto.

“Acabamos por achar que nas grandes cidades é que são atingidos os melhores resultados”, declara. A escola Dr. Ferreira da Silva, porém, é a prova de que nem sempre tal acontece.


O resultados a Matemática A foram particularmente brilhantes na escola de Cucujães. Foto: Miguel Marques Ribeiro/ RR
O resultados a Matemática A foram particularmente brilhantes na escola de Cucujães. Foto: Miguel Marques Ribeiro/ RR
Às horas normais de aulas são acrescentados dois tempos extra durante todo o ano letivo, para a preparação para o exame. Foto: Miguel Marques Ribeiro/ RR
Às horas normais de aulas são acrescentados dois tempos extra durante todo o ano letivo, para a preparação para o exame. Foto: Miguel Marques Ribeiro/ RR


O facto de ser uma escola “pequenina” ajuda a promover uma proximidade entre todos, acredita a professora Marta Cruz. Foto: Miguel Marques Ribeiro/ RR
O facto de ser uma escola “pequenina” ajuda a promover uma proximidade entre todos, acredita a professora Marta Cruz. Foto: Miguel Marques Ribeiro/ RR

O diretor da escola sublinha a importância da palavra “acompanhamento” no desenvolvimento das metodologias da escola. Um processo feito com grande “proximidade” e “muito cuidado”, sublinha António Figueiredo.

É o que acontece, por exemplo, com Miguel Costa, cuja turma do 12.º ano da área de Sócio-Económicas é composta por apenas 17 alunos. “Os professores acompanham-nos mais” e podem focar-se em cada aluno em particular. “Sabem os nossos pontos fortes e os nossos pontos fracos”, explica o estudante.

Umas das melhores escolas na matemática

O resultados na Matemática A foram particularmente brilhantes. A escola destacou-se como a 4.ª melhor do país, com uma média de 17,54 valores, acima, por exemplo, da 1.ª e 2.ª do ranking geral — respetivamente, o Grande Colégio Universal e o Colégio Nossa Senhora do Rosário, ambos localizados no Porto.


“Temos uma empatia muito grande com os nossos alunos, [somos] quase que como família”, afirma Marta Cruz, professora de Matemática

Os ajustes que são feitos na forma como está organizado o trabalho escolar são determinantes para o sucesso nesta disciplina. Às horas normais de aulas são acrescentados dois tempos extra durante todo o ano letivo para a preparação para o exame. Algo que não é comum à generalidade das escolas, garante a professora Marta Cruz.

Todo este trabalho deu frutos excepcionais no ano letivo anterior, mas o ponto de partida para este crescimento já vem de trás. Se a escola não entrou no Ranking das Escolas da Renascença nos últimos três anos foi por ter menos de 100 provas realizadas nas oito disciplinas com mais provas.


Marta Cruz, professora de Matemática. Foto: Miguel Marques Ribeiro/ RR
Marta Cruz, professora de Matemática. Foto: Miguel Marques Ribeiro/ RR
António Figueiredo, diretor. Foto: Miguel Marques Ribeiro/ RR
António Figueiredo, diretor. Foto: Miguel Marques Ribeiro/ RR


Liliana Silva, psicóloga. Foto: Miguel Marques Ribeiro/ RR
Liliana Silva, psicóloga. Foto: Miguel Marques Ribeiro/ RR
Rodrigo Rebelo, antigo aluno da escola Dr. Ferreira da Silva. Foto: Miguel Marques Ribeiro/ RR
Rodrigo Rebelo, antigo aluno da escola Dr. Ferreira da Silva. Foto: Miguel Marques Ribeiro/ RR


Rita Assunção, antiga aluna da Escola Dr. Ferreira da Silva. Foto: Miguel Marques Ribeiro/ RR
Rita Assunção, antiga aluna da Escola Dr. Ferreira da Silva. Foto: Miguel Marques Ribeiro/ RR
Miguel Costa e Maria, atuais alunos. Foto: Miguel Marques Ribeiro/ RR
Miguel Costa e Maria, atuais alunos. Foto: Miguel Marques Ribeiro/ RR


A seu lado, Rodrigo Rebelo — outro antigo aluno que entrou, no final do ano letivo passado, no Instituto Superior de Engenharia do Porto, para estudar Engenharia Mecânica Automóvel — acha que a chave do sucesso está “exatamente na diferença que esta escola faz em relação a escolas de grandes dimensões, de grandes centros urbanos”.

A escola periférica que é quase como uma família

A escola tem cerca de 180 alunos no ensino secundário, distribuídos por seis turmas de cursos de ensino geral e três de cursos profissionais. A menor dimensão ajuda a promover um maior acompanhamento dos estudantes.

“Temos uma empatia muito grande com os nossos alunos, [somos] quase que como família”, admite Marta Cruz, uma professora de matemática recém-chegada à equipa. O facto de ser uma escola “pequenina” ajuda a promover uma proximidade entre todos. “Então eles não têm receio de recorrer a nós, de nos pedir ajuda.” A vergonha de não saber fazer “não existe”.


"A nossa ambição é estar entre os melhores. Acho que os nossos alunos merecem”, considera o diretor, António Figueiredo

O contexto, explica o diretor do Agrupamento de Escolas Dr. Ferreira da Silva, é essencialmente “um desafio”. “Somos uma escola periférica. Não somos de centro cidade, nem de grande cidade”, diz António Figueiredo, que caracteriza a zona como estando algures entre o rural e o industrial.

“É um contexto social médio”, com uma escolaridade média das mães (um preditor relevante para aferir do sucesso académico futuro dos alunos) que não ultrapassava os 9,32 anos em 2022/23.

A EBS tenta ainda assim cumprir o papel de “elevador social”. “Acho que a escola deve acrescentar valor aos nossos alunos, independentemente das suas condições sócio económicas”, sublinha o professor formado em Geografia.


É a “relação genuína de entrega, tanto dos professores, como de toda a equipa, [que] faz a diferença”, assegura a psicóloga responsável pela orientação vocacional. Foto: Miguel Marques Ribeiro/ RR
É a “relação genuína de entrega, tanto dos professores, como de toda a equipa, [que] faz a diferença”, assegura a psicóloga responsável pela orientação vocacional. Foto: Miguel Marques Ribeiro/ RR

“Há uns anos integrámos o grupo das 100 melhores escolas públicas do país e depois o grupo das 50. E o ano passado ficámos classificados também em quarto lugar a nível nacional. Portanto, nossa ambição é estar entre os melhores. Acho que os nossos alunos merecem”, recapitula o diretor, à frente dos destinos do estabelecimento desde 2001.

Conhecer os alunos e ajudá-los a conhecer-se

Para o resultado final, contribui também, e de forma determinante, a aposta na orientação vocacional, que começa ainda durante o ensino básico.

Desde o 8.º, 9.º ano que nós temos acompanhamento vocacional”, refere Maria Antunes, uma aluna do 12.º ano de Ciências e Tecnologia. Isso permitiu-lhe fazer “uma escolha mais assegurada, uma escolha certa” para o caminho a seguir no futuro. “Eu acho que esta escola prepara-nos muito bem nesse âmbito”, defende a estudante.

O apoio vocacional aos alunos do ensino secundário é feito por Liliana Silva. A psicóloga refere que “a orientação não é a mera escolha de um curso, não é a mera escolha de uma área, tem a ver com a pessoa”.


"Mais do que todas as técnicas, a relação [com os alunos] é que produz mais mudança”, considera Liliana Silva, psicóloga

Mais uma vez, a proximidade com os jovens é fundamental: “Eu tenho que os conhecer e tenho de os ajudar a conhecer-se”, adianta a profissional.

A relação humana desempenha assim um papel central no desenvolvimento dos alunos. “Mais do que todas as técnicas e todas as estratégias que se usem, a relação é que produz mais mudança”, garante Liliana Silva. Assim, é precisamente a “relação genuína de entrega, tanto dos professores, como de toda a equipa, [que] faz a diferença”.

Com todas estas ferramentas à disposição, o estabelecimento procura assegurar uma formação integral, que prepare cada aluno para a vida em democracia. O objetivo é “formar cidadãos cultos, instruídos e que possam ser empreendedores, que sejam solidários, tenham um espírito crítico construtivo”, explica o diretor. A estas dimensões, a EBS Dr. Ferreira da Silva pretende associar o sucesso na obtenção de resultados escolares. “É isso que se espera de uma escola pública”, reforça António Figueiredo.


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