O que aprendemos com o apagão? Os testemunhos de 30 figuras da sociedade portuguesa

Às 11h33 de segunda-feira, 28 de abril, as luzes apagaram-se em Portugal. O dia foi passado sem eletricidade, sem acesso a redes de telemóvel ou internet. As comunicações tornaram-se quase impossíveis, as corridas aos supermercados e às gasolineiras fizeram lembrar os tempos da pandemia. No final, que lição pode o país retirar do que aconteceu?

30 abr, 2025 - 07:00 • Ana Kotowicz , Cristina Nascimento , Diogo Camilo , Liliana Monteiro , Olímpia Mairos , Sandra Afonso



Apagão de eletricidade em Lisboa - Um passageiro apanha um autocarro no Campo Grande às escuras. Foto: António Pedro Santos/Lusa
 

A pouco e pouco, à medida que a noite ia tomando conta do país, a generalidade de Portugal recuperou a energia que tinha perdido a meio da manhã. Foi apenas a pouco minutos das 23h30 que, segundo a REN, a eletricidade voltou em pleno a todas as regiões do território nacional. Durante todo o dia, as notícias — a que muitos portugueses só tinham acesso através das rádios ouvidas em aparelhos a pilhas — davam conta de hospitais a funcionar a geradores, consultas adiadas, escolas em risco de fechar, metropolitanos parados em túneis, corridas a supermercados que deixavam para trás apenas as prateleiras vazias.

Um dia depois, chamemos-lhe o da reflexão, o que aprendemos com o apagão? A Renascença ouviu 30 protagonistas de diferentes setores que aceitaram partilhar a sua opinião.

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"Aprendemos a importância da rádio e de ter um transístor em casa. O cuidado com as notícias de que não se sabe a origem. A necessidade de ter em casa bens essenciais e não confiar excessivamente na Internet porque pode ir facilmente abaixo. Evitar acreditar em propaganda disfarçada de informação.

Aproveitar o tempo disponível e o silêncio inerente para ler e meditar."

Eduardo Ferro Rodrigues, antigo Presidente da Assembleia da República e antigo ministro do Trabalho e da Solidariedade


"Aprendemos que estamos mais dependentes e impacientes do que no tempo do apagão da cegonha, que desligar tem coisas boas e que a rádio continua a ser a fonte de notícias mais confiável."

João Costa, antigo ministro da Educação


“Aprendemos, ou tivemos mais consciência, de que o nosso modo de vida é, afinal, muito frágil. Assente no bem-estar e na tecnologia, depende da perfeição tecnológica (que não existe). O episódio teve, porém, vários méritos.

Teve um custo económico que agora será melhor estimado. Chamou a atenção para a possibilidade realíssima de ciberataques dirigidos contra infraestruturas críticas, sendo sempre necessária uma capacidade defensiva competente e evolutiva, mas também a criação de redundâncias que atenuem os potenciais efeitos danosos de uma falha, ou de uma falha causada por outrem (que pode sempre acontecer). Finalmente, do mal o menos. Foram longas horas, mas não passaram de horas.

Há quem, por esse mundo fora, encare a falta de eletricidade, de comida e de bebida como algo de ‘normal’, por vontade de quem tem o poder, e a vontade de fazer mal ao diferente. Por isso, até para de forma serena relativizarmos o que aconteceu ontem, imaginemo-nos em Gaza, ou até em certas partes da Ucrânia, sem esperança de que a luz volte ou de que a comida ou água estejam disponíveis.”

Azeredo Lopes, antigo ministro da Defesa Nacional de Portugal


"A necessidade de termos um plano de contingência que nos permita restabelecer rapidamente a eletricidade com geradores equipados com black start em casos em que problemas na rede espanhola levem esta a ser desligada da portuguesa."

Luís Mira Amaral, antigo ministro da Indústria e da Energia


“Aprendemos que não estamos suficientemente preparados para a gestão de crises. Temos de ser mais resilientes e robustos.

António Nunes, presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses


"O Governo demorou tempo a reagir. Faltaram instruções claras/precisas em tempo útil. Escolas tiveram de decidir sem qualquer orientação da tutela, tendo sob a sua responsabilidade centenas de alunos, cada uma. Respondendo agora à questão: não estamos preparados para situações deste tipo. É absolutamente fundamental construir um plano que permita reagir rapidamente em cenários semelhantes. A ausência desse plano deixou vulnerável toda a população e, mais especificamente, uma população estudantil, que ronda os 1,5 milhões de jovens."

José Feliciano Costa, presidente do Sindicato dos Professores da Grande Lisboa


"O maior apagão do século mostrou como está vulnerável a nossa rede elétrica, da qual estamos cada vez mais dependentes. Portugal e Espanha são dois casos de sucesso a nível mundial no investimento e produção de energia renovável, sendo dos países da Europa com maior produção de eletricidade a partir de energia renováveis e onde a eletricidade é mais barata. Mas o apagão mostrou que isso pode ter tornado a rede elétrica mais vulnerável. Tornou também evidente as enormes necessidades de investimento na rede elétrica que não acompanhou o grande investimento feito na capacidade de produção de eletricidade. Investimento necessário não só para fazer face ao forte crescimento esperado do consumo de eletricidade, mas também para tornar a rede elétrica mais resiliente face a geração de eletricidade a partir de energias renováveis. Esta geração é por natureza intermitente e muito dispersa pelo território, o que coloca maiores desafios na gestão da rede elétrica.

O apagão também mostrou que o Estado precisa de garantir que estamos todos mais bem preparados e que se investe bastante mais para podermos fazer face a momentos de emergência, que, por serem raros, o setor privado não tem naturalmente incentivo em investir. Os efeitos das alterações climáticas e a nova realidade geopolítica a nível mundial podem tornar estes momentos de emergência mais frequentes. Precisamos de mais investimento em sistema redundâncias e de recuperação e de armazenamento de eletricidade. Investimento e preparação não só no setor energia, mas também em outros setores e infraestruturas críticas, alguns dos quais também falharam durante o apagão."

João Leão, antigo ministro das Finanças


"Em situações de crise, é crucial haver coesão institucional, prontidão na resposta e comunicação eficaz. Reconhecer e aprender com os erros, corrigir as falhas tendo em vista reforçar a resiliência do pais para responder a futuras emergências. Urge resolver as insuficiências de comunicação com os cidadãos de forma direta."

Adalberto Campos Fernandes, antigo ministro da Saúde


"Relativamente ao assunto, cumpre informar que a situação ocorrida, permitiu ao Exército:

  • Atestar que os sistemas de emergência energéticos previstos nos planos de segurança das Unidades, Estabelecimentos e Órgãos do Exército, foram acionados de forma automática, conforme o previsto, possibilitando que as missões e atividades no Exército se desenvolvessem sem limitações.
  • Acionar de forma preventiva as capacidades previstas no âmbito do apoio militar de emergência, para situações de contingência desta natureza, em apoio às autoridades competentes."

Resposta do exército, gabinete do Chefe de Estado Maior do Exército


“Os tribunais e os serviços do Ministério Público sem eletricidade não conseguem funcionar dado que precisam de utilizar os sistemas informáticos de suporte para a sua atividade, nomeadamente o Citius. É importante, no futuro, dotar estes serviços de geradores que possam permitir num contexto semelhante a continuidade dos serviços prestados pelo sistema de justiça aos cidadãos.”

Paulo Lona, presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público


“O apagão revelou fragilidades graves no sistema judicial, como a paralisação dos tribunais e falhas nas comunicações internas, devido à falta de planos de emergência. É essencial criar estratégias que garantam serviços mínimos e sistemas alternativos de energia e comunicação para proteger os direitos dos cidadãos em situações de crise.

A Justiça não pode funcionar apenas em normalidade. É preciso antecipar riscos e investir em soluções energéticas alternativas para garantir os direitos fundamentais mesmo em situações de emergência.”

João Massano, bastonário da Ordem dos Advogados




Foto: António Pedro Santos/Lusa
Foto: António Pedro Santos/Lusa

“Já sabia que a vida nos surpreende sempre. Mas aprendi que não podemos dar como certas as comunicações fixas e móveis, o acesso à internet e a todos os serviços que nos oferece. O digital apagou-se com o apagão.”

Carlos Fiolhais, físico, ensaísta e professor universitário jubilado


"De repente, de forma totalmente inesperada, fomos confrontados com algo inédito nas nossas vidas: uma falta geral e total de energia elétrica, um recurso que não vemos, mas que afinal é fundamental no nosso dia a dia, para as mais pequenas coisas.

Foi surpreendente e obrigou a uma paragem forçada, seja das comunicações, seja do trabalho com computador. Mas no fim - salvo alguma aflição por não ter uma ligação imediata com os meus filhos que estão fora e com a minha mãe de 93 anos - ficou a oportunidade de uma reflexão sobre o valor que atribuímos aos bens de que usufruímos sem lhes atribuir o real valor que revestem e, ainda, sobre a forma como pensamos que estar sempre ligados nos preenche e ocupa.

Para mim foi uma oportunidade também de fazer várias coisas que já não fazia há algum tempo e ainda de dar ainda mais valor ao dia a dia de tantas pessoas, em vários países, em guerra, com menos recursos ou desenvolvimento de infraestruturas, para quem a falta de eletricidade é a realidade diária.

Além disso, felizmente, não duvidei nunca que a situação seria ultrapassada e que, como espero, dela se retirem ilações para o futuro, pela vulnerabilidade que existe e que pode ser minorada com mais cooperação internacional nesta matéria."

Isabel Jonet, Presidente do Banco Alimentar Contra a Fome


"Aprendemos que importa investir na educação e formação cívica para promover comportamentos conscientes, solidários e preparados para lidar com crises coletivas."

Pedro Barreiros, secretário-Geral da Federação Nacional da Educação (FNE)


“Relativamente ao papel da Guarda Nacional Republicana, durante o apagão de ontem, importa destacar que esta situação deixou uma importante lição sobre a forma como devemos agir em contextos de emergência: manter a calma e evitar o pânico é essencial.

Importa igualmente reforçar a necessidade de nos informarmos através de fontes oficiais, evitando a disseminação de rumores ou alarmismos nas redes sociais, que em nada contribuem para a segurança e estabilidade da população.

Além disso, durante as falhas de energia, é fundamental evitar deslocações desnecessárias, especialmente em zonas pouco iluminadas. Por fim, sublinha-se a importância de aumentar a atenção na travessia de passadeiras e na condução, uma vez que a sinalização luminosa poderá encontrar-se desligada, sendo essencial cumprir as demais leis rodoviárias em vigor e garantir a segurança de todos os utentes da via.”

Comando da GNR liderado pelo tenente general Rui Veloso


"Aprendemos que temos que estar sempre preparados para os desafios."

Paula Franco, bastonária da Ordem dos Contabilistas Certificados


“Confirmou-se, acima de tudo, que a PSP demonstra grande capacidade de resiliência, adaptação e profissionalismo ao serviço da segurança dos nossos concidadãos.

Este fenómeno, extraordinário, serviu, também, para concluir que é muito importante que as estruturas do Estado, incluindo a PSP, devem apostar em manter reservas estratégicas de energia, alimentação, comunicações e outros apoios logísticos, situações que, desde a pandemia em 2020, têm vindo a ser acauteladas e melhoradas, sendo que se pretende continuar a investir no futuro.”

Direção Nacional da PSP liderada por Luís Carrilho




Foto: Tiago Petinga/Lusa
Foto: Tiago Petinga/Lusa

“Um valor que emergiu foi o valor da solidariedade. As escolas foram solidárias umas com as outras, as crianças, os alunos, os professores, os diretores, os pais, atuámos todos com este valor que nós, no dia a dia, ensinamos aos nossos alunos. É evidente que isto também nos traz outros ensinamentos.

Era importante que nas escolas existissem, na verdade, protocolos de emergência para estes casos concretos. E também era importante equipar as escolas com geradores de emergência e sistemas de backup para poderem mitigar os efeitos de futuros apagões (que nós não desejamos). Mas, de facto, se tiver de avaliar a atuação destas entidades, das comunidades educativas, das escolas, do Ministério da Educação, através da DGEstE e da Proteção Civil, através das câmaras municipais, dou nota 20 à atuação de todos.”

Filinto Lima, presidente da ANDAEP (Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas)


"Aprendemos que ao mudarmos o paradigma das fontes de produção estáveis coma as centrais a gás para fontes instáveis como as renováveis sem investir em soluções tecnológicas para controlar as redes e armazenamento em baterias para equilibrar as redes estes apagões podem repetir-se."

Mário Jorge Machado, presidente da Associação Têxtil e Vestuário de Portugal


"Aprendi várias coisas, tais como:

  1. Não é aconselhável uma concentração e dependência excessiva de qualquer fonte energética para fins básicos, tais como a mobilidade, aquecimento, etc;
  2. Que o gás ou mesmo os combustíveis fósseis, desde que convenientemente mitigados, devem fazer parte do nosso portfólio de segurança;
  3. Que não estamos tão bem ensaiados como deveríamos estar quanto ao que fazer em caso de apagão das comunicações;
  4. Que a diversificação também se deve manter nos meios de pagamento como o dinheiro no formato de moeda ou papel;
  5. Que ou o crédito pessoal, isto é, aquele que é só baseado no conhecimento da pessoa no café ou no restaurante do bairro, pode ser um elemento importante na ausência de meios eletrónicos;
  6. Que devíamos trabalhar mais em comum no sentido de mapearmos os meios privados que possam ser utilizáveis para salvação e apoio em caso de calamidade;
  7. Que a calma ajuda a decisão rápida e segura;
  8. Relembrei que a vida também se pode fazer em condições mais hostis, que a beleza de uma manhã de sol não precisa de telemóvel para ser captada, nem de internet para a passarmos aos amigos."

João Duque, economista e comentador da Renascença


"A principal coisa que aprendi com o apagão da passada segunda-feira é a enorme vulnerabilidade que temos como sociedade devido à cascata de dependências da grande maioria dos sistemas face à rede elétrica centralizada. Semáforos, tráfego aéreo, telecomunicações, meios de pagamento, avisos à população, a própria possibilidade de chamar o 112: quase tudo depende de um único sistema vulnerável e com insuficientes redundâncias. Consequentemente, estamos sempre demasiado perto do colapso. Numa altura em que tanto se fala de aumentar a despesa em armamento, faríamos melhor em avaliar e responder mais racionalmente àquelas que são as nossas verdadeiras vulnerabilidades enquanto sociedade."

Alexandre Abreu, professor de economia e estudos de desenvolvimento no ISEG


"O apagão fez-me ponderar a necessidade de estratégias para ultrapassar algumas excessivas dependências que temos na organização do nosso dia a dia, nomeadamente as derivadas do uso de telemóveis. A quase incapacidade de contacto para gerir logísticas familiares como quem vai buscar crianças foi especialmente difícil. Tenho refletido sobre a necessidade de alinhamento de planos em caso de falhas, o que implica uma gestão quase diária de consideração de agendas; a determinação de que o ponto de encontro dos adultos é sempre em casa. Para além disso vou ter especial atenção a que os automóveis não estejam com menos de meio depósito ou que exista dinheiro em casa. Num plano positivo, ficou patente a solidariedade entre os pais da escola, e vizinhos, até de alguns estabelecimentos de restauração no bairro onde vivo que se mantiveram abertos. Louvo, mais uma vez a atitude das forças e serviços de segurança, do Governo que, como sempre, foram o nosso porto seguro."

Diogo Feio, antigo deputado do CDS


Apagão de eletricidade em Lisboa - habitação geral Foto: António Pedro Santos/Lusa
 

“O que nos ensinou, além de que é possível sobreviver sem internet…

  • A) recordou, uma vez mais, que tudo na vida tem de ser construído e conquistado. Nada pode ser dado por garantido!
  • B) recordou, em algumas ações, que o indivíduo pensa em si e desvaloriza o outro: outra vez filas para os combustíveis, supermercados e pouca confiança no serviço público (que mais uma vez não falhou).
  • C) manifestou, neste mundo assente em interdependências, a necessidade de encontrar respostas de emergência que valorizem a autonomia e a necessidade de acreditar em si próprio!
  • D) nestas respostas, as escolas terão, no futuro, de ser dotadas de painéis fotovoltaicos que permitam, nas situações de emergência, suportar as quebras de fornecimento de energia.
  • E) que as interdependências em que vivemos nos tornam dependentes. A falha da eletricidade tirou-nos as redes digitais, a água, os combustíveis, a alimentação, o dinheiro de plástico… em alternativa, foram as redes humanas que nos suportaram e apoiaram!
  • F) finalmente, na semana em que nos despedimos do Papa Francisco, deu-nos a oportunidade de revisitar os ensinamentos da encíclica “Fratelli Tutti”. A solução está em TODOS.”

Manuel Pereira, presidente da ANDE (Associação Nacional de Dirigentes Escolares)


“É necessário reforçar a prevenção e a capacitação a nível energético. O nosso concelho é um dos que gera mais energia renovável no país e não vê assegurado serviços mínimos de fornecimento na região. Queremos continuar a ser um concelho gerador, mas também autossuficiente no âmbito da energia.”

Ana Rita Dias, presidente da Câmara Municipal de Vila Pouca de Aguiar


“O apagão expôs fragilidades que não podemos ignorar. A saúde exige redundância, planeamento rigoroso e responsabilidade técnica e política porque a vida humana não pode ser deixada à mercê da sorte."

Carlos Cortes, bastonário da Ordem dos Médicos


"Ter equipas de proteção civil bem preparadas é essencial para minimizar os impactos de eventos inesperados, como o apagão de segunda-feira. A capacidade de resposta rápida e eficiente depende diretamente da qualificação dos profissionais, garantindo que saibam agir com precisão e segurança em momentos críticos. Investir continuamente na formação destas equipas não é apenas uma necessidade, mas uma estratégia que seguimos em Matosinhos e que se mostra fundamental para assegurar a resiliência da comunidade, protegendo vidas e infraestruturas com a máxima competência."

Luísa Salgueiro, presidente da Câmara Municipal de Matosinhos


Foto: Estela Silva/Lusa
Foto: Estela Silva/Lusa

“Desde logo, foi muito visível a necessidade e a mais-valia de ter fontes alternativas de energia que possam responder não apenas a cortes mais momentâneos de energia, mas que possam garantir o funcionamento durante mais tempo. Por isso, há um reforço em relação a esta estratégia que as farmácias já tinham de ter estas fontes alternativas.

“Por outro lado, a questão das comunicações — foi o mais difícil e o que mais causou constrangimentos durante o dia de ontem, nomeadamente no que se prende com a comunicação com a base de dados central das prescrições. Como é que nós podemos criar e robustecer sistemas de backup que permitam uma dispensa mesmo nestas circunstâncias e, por outro lado, a nível do reabastecimento das farmácias, como é que podemos ter outros sistemas que não apenas a questão das comunicações eletrónicas para fazer estas encomendas? São tudo oportunidades de melhoria que agora terão de ser analisadas.”

Ema Paulino, presidente da Associação Nacional de Farmácias


“O que a FNAM manifesta é uma preocupação pelas limitações que houve — porque acabou por haver — no acesso a cuidados de saúde e a diminuição de resposta que foi dada à população porque falhou algo muito básico, essencial: as comunicações. O SNS acabou por ficar exposto, porque estamos reféns de linhas telefónicas que no dia a dia funcionam mal e ainda mais numa altura de apagão.

Neste episódio do apagão, exatamente como na pandemia, foram os profissionais de saúde em geral, e os médicos também, que garantiram o essencial com todo o profissionalismo, mesmo quando todos os meios faltaram.

O que nós temos a aprender aqui é que não podemos estar sempre dependentes apenas da boa-fé e do esforço de quem está no terreno a trabalhar e a dar tudo. Ou seja, o SNS tem de ter outras alternativas, tem de ter mecanismos e estruturas mais robustas. As comunicações devem ser seguras e tem de haver alternativas, não se pode confiar num sistema que está limitado a estas linhas telefónicas.

Acima de tudo, exigimos responsabilidade ao Ministério da Saúde, ainda da Ana Paula Martins, que esteja também à altura dos utentes, dos doentes e dos profissionais que demonstraram, uma vez mais, estar à altura. Não temos a certeza de que os governantes estejam.”

Joana Bordalo e Sá, presidente da FNAM


Foto: Tiago Petinga/EPA
Foto: Tiago Petinga/EPA

"No sector da Logística, todas as encomendas prioritárias foram entregues (como os medicamentos). Na Indústrias Agroalimentar, registaram-se graves prejuízos no que diz respeito aos produtos perecíveis (exemplo dos produtos lácteos). Tanto em produtos finais, como em produtos em processamento e transformação. A longa paragem das linhas de produção obrigou à destruição de muitos produtos. As principais dificuldades: falta de interlocutores nas primeiras horas; falta de procedimentos estabelecidos para situações que já não são únicas nas nossas vidas. Existe uma enorme probabilidade destes acontecimentos, os similares, se repetirem pelo que é essencial:

  • 1) Melhorar a comunicação com o público em situações deste tipo;
  • 2) Reforçar as estratégias de preparação para eventos disruptivos — especialmente face ao elevado potencial de desinformação.

No vazio de ontem, nas primeiras horas, germinou o medo. Cada um agiu por instinto e pelo nível de confiança que atribuiu à informação que lhe foi chegando. No vazio de informação, o pânico instala-se e a desinformação cresce e assusta.

Quando não há informação, a imaginação ocupa o vazio. A imaginação no poder da nossa mente, nem sempre é uma boa ideia. Quem diria que iríamos passar por uma pandemia e que teríamos de ficar confinados? Ou que teríamos novamente guerra na Europa? Ou que que um dia a luz podia faltar em praticamente toda a Península Ibérica?

O que aprendemos com o apagão?

Talvez nunca estejamos verdadeiramente preparados para estas coisas. Mas temos que aprender a lidar melhor com a ansiedade. Mas ainda temos muito para andar enquanto Nação, até deixarmos de colocar no topo das nossas prioridades, as conservas, os garrafões de água e o papel higiénico, logo que a nossa ansiedade toca a rebate."

Armindo Monteiro, presidente da CIP (Confederação Empresarial de Portugal)


"Não podemos subestimar o episódio “apagão”, sobretudo porque ficámos a saber que há a probabilidade de poder acontecer novamente e que não há uma metodologia segura para resolver o problema no mais curto espaço de tempo. Os prejuízos também são consideráveis na Indústria. No caso da produção de componentes para a Indústria Automóvel, a perda de um dia de faturação representa cerca de 70 milhões de euros e terá repercussões na potencial paragem de várias linhas de produção dos clientes. O que põe em causa a confiança dos clientes nos seus fornecedores. Mas teremos de acrescentar custos de reativação dos processos de produção das empresas que laboram no território nacional.
Há, por certo, vários exemplos deste tipo, o que demonstra uma afetação negativa para a economia nacional. Foi um dia de paragem de produção e se fossem mais… Está em causa a valia competitiva do país."

José Couto, presidente da AFIA, Associação de Fabricantes para o Setor Automóvel




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