Ir à China sem sair de Lisboa. Cores, tambores e dança nos preparativos do Ano Novo Chinês

Há dois meses que os alunos de uma escola chinesa, em Lisboa, se preparam para um grande dia. Por entre a azáfama dos ensaios, esta comunidade de Arroios quer trazer um pouco da China até Lisboa.

28 jan, 2025 - 06:39 • Lara Castro



Ir à China sem sair de Lisboa. Cores, tambores e dança nos preparativos do Ano Novo Chinês

Ouve-se tambores e pratos. Para os alunos do Centro de Línguas e Culturas Shumin, em Lisboa, é mais um domingo de ensaios para as marchas de abertura do Ano Novo chinês, que começa a 29 de janeiro de 2025.

Pouco passa da hora de almoço e na Alameda, que cruza a avenida Almirante Reis, Paulo Zhou ensina os passos de uma dança guerreira do sul da China — Yingee, que em mandarim se escreve “英歌舞”.

Elsa tem 13 anos e aprende, pela primeira vez, os movimentos de uma coreografia “que é muito especial”. Ao lado, Lúcia está pela terceira vez a ensaiar para as marchas e quer partilhar com as pessoas a alegria que sente com a chegada do novo ano.

A chuva miudinha ameaça o ensaio, que decorre no local onde, este fim de semana, se vai celebrar o Ano da Serpente. Quando a intensidade dos chuviscos aumenta, o professor encaminha o grupo de 27 para se abrigar junto a um restaurante asiático. Em escassos minutos, o segurança do metro convida-os a continuar as danças dentro da estação da Alameda.


Elsa e Lúcia querem partilhar com as pessoas a alegria que sentem com a chegada do novo ano. Foto: Lara Castro/RR
Elsa e Lúcia querem partilhar com as pessoas a alegria que sentem com a chegada do novo ano. Foto: Lara Castro/RR
A chuva transformou a estação de metro da Alameda numa pequena sala de ensaios. Foto: Lara Castro/RR
A chuva transformou a estação de metro da Alameda numa pequena sala de ensaios. Foto: Lara Castro/RR


O espaço transforma-se numa pequena sala de ensaios, onde, por entre o chiar das linhas metálicas e o som das chegadas e partidas, se cruzam as indicações do professor Paulo Zhou. Falta o som dos tambores e pratos, mas o entusiasmo não esmorece.

Aproxima-se um fim de semana de "festa e muitas prendas” para os mais novos. Para Daniel Hu, o melhor da tradição “é entrar pela segunda vez no ano novo”.


Este fim de semana celebra-se o Ano da Serpente. Foto: Lara Castro/RR
Este fim de semana celebra-se o Ano da Serpente. Foto: Lara Castro/RR

A abertura do ano chinês começou por ser celebrada no Martim Moniz e a partir de 2019 transferiu-se para a Alameda. Foto: Lara Castro/RR
A abertura do ano chinês começou por ser celebrada no Martim Moniz e a partir de 2019 transferiu-se para a Alameda. Foto: Lara Castro/RR
Paulo Zhou ensina ábaco e xadrez chinês. Para o Ano Novo aprendeu as danças por videochamada. Foto: Lara Castro/RR
Paulo Zhou ensina ábaco e xadrez chinês. Para o Ano Novo aprendeu as danças por videochamada. Foto: Lara Castro/RR


Daniel tem 14 anos e já nasceu em Portugal. Mantém a tradição por dois motivos: não se quer “esquecer dos costumes” do país de origem e quer que “os portugueses também conheçam a tradição chinesa”.

O jovem explica que nesse dia quase todos os chineses comem “Nian Gao”, um bolo feito de arroz glutinoso, que é símbolo de crescimento e ascensão na vida, e “Jiaozi”, bolinhos de massa que representam a prosperidade.

Para os chineses, o Ano Novo é também o festival da primavera e representa “o início de todas as coisas”. Para o professor Paulo Zhou, que tem 32 anos e já nasceu em Portugal, o novo ano é o momento de “reunião da família”, e celebrá-lo aqui “é especial” porque “aproxima as culturas”.

Assim que a mãe de uma das crianças grita as palavras mágicas — “Já não chove!” —, o grupo regressa à Alameda e a coreografia revela-se um misto entre dança e artes marciais.


Aproxima-se um fim de semana de "festa e muitas prendas” para os mais novos. Foto: Lara Castro/RR
Aproxima-se um fim de semana de "festa e muitas prendas” para os mais novos. Foto: Lara Castro/RR
Para os chineses, o Ano Novo é também o festival da primavera e representa “o início de todas as coisas”. Foto: Lara Castro/RR
Para os chineses, o Ano Novo é também o festival da primavera e representa “o início de todas as coisas”. Foto: Lara Castro/RR


Dois apitos dão o sinal para um grito de guerra, que se dissolve em risos. Foto: Lara Castro/RR
Dois apitos dão o sinal para um grito de guerra, que se dissolve em risos. Foto: Lara Castro/RR

Os alunos colocam-se a postos, o professor faz a contagem — “Sān, Èr, Yī”— , os instrumentos sinalizam o começo, ouvem-se as madeiras soar, combinadas com movimentos do corpo. Dois apitos dão o sinal para um grito de guerra, que se dissolve em risos.

Normalmente, Paulo Zhou é professor de ábaco e xadrez chinês, mas desta vez está a orientar os passos por procuração. Os docentes que dominam a dança estão na China e, “como não têm oportunidade de vir a Portugal para ensinar”, aprendeu tudo por videochamada. Há dois meses que pratica com as turmas.


Paulo Zhou é porfessor de xadrez chinês na escola, para o Ano Novo ensina os passos de uma dança guerreira do sul da China — Yingee. Foto: Lara Castro/RR
Paulo Zhou é porfessor de xadrez chinês na escola, para o Ano Novo ensina os passos de uma dança guerreira do sul da China — Yingee. Foto: Lara Castro/RR
O grupo de vinte e sete ensaia uma dança tradicional chinesa para apresentar este fim de semana, no jardim da Alameda. Foto: Lara Castro/RR
O grupo de vinte e sete ensaia uma dança tradicional chinesa para apresentar este fim de semana, no jardim da Alameda. Foto: Lara Castro/RR


Mesmo com chuva, os alunos não perdem o entusiamo. Foto: Lara Castro/RR
Mesmo com chuva, os alunos não perdem o entusiamo. Foto: Lara Castro/RR

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A coreografia repete-se vezes sem conta, até à última, que marca o fim do ensaio. A turma divide-se em grupos mais pequenos, que caminham debaixo de aguaceiros fracos. Cerca de 500 metros depois chegam ao Centro de Línguas e Culturas Shumin, em Arroios.

Na escola, que frequentam entre sábado e domingo, aprendem Mandarim, mas também vários estilos dança, desenho, e até dama, uma espécie de xadrez tradicional na china. Mas por estes dias a azáfama deixa adivinhar o grande momento.

Xiao Jing tem dois filhos na escola e, apesar de ambos terem nascido em Portugal, quer “preservar a cultura chinesa”. Pedro, o mais novo, tem nove anos e é a primeira vez que vai participar nas marchas. Para já, o que mais gosta nos ensaios é “jogar futebol e cartas”.


Pedro tem nove anos, é o mais novo da turma de vinte e sete. Foto: Lara Castro/RR
Pedro tem nove anos, é o mais novo da turma de vinte e sete. Foto: Lara Castro/RR
É a primeira vez que Pedro vai participar nas marchas. Para já, o que mais gosta nos ensaios é “jogar futebol e cartas”. Foto: Lara Castro/RR
É a primeira vez que Pedro vai participar nas marchas. Para já, o que mais gosta nos ensaios é “jogar futebol e cartas”. Foto: Lara Castro/RR


A abertura do ano chinês em Lisboa acontece desde 2014, mas a pandemia obrigou a interromper a celebração pública. Este fim de semana, a festa regressa às ruas. Foto: Lara Castro/RR
A abertura do ano chinês em Lisboa acontece desde 2014, mas a pandemia obrigou a interromper a celebração pública. Este fim de semana, a festa regressa às ruas. Foto: Lara Castro/RR

Da sala de dança da escola chegam sons de percussão dessincronizados. Por entre a porta entreaberta, o espelho reflete um grande grupo de crianças vestidas com fatos detalhados, onde o vermelho e dourado sobressaem.

Preso às vestes está um pequeno tambor e em cada mão está uma baqueta rematada com um laço.


Há dois meses que os alunos de uma escola chinesa, em Lisboa, se preparam para um grande dia. Foto: Lara Castro/RR
Há dois meses que os alunos de uma escola chinesa, em Lisboa, se preparam para um grande dia. Foto: Lara Castro/RR

Preso às vestes está um pequeno tambor e em cada mão está uma baqueta rematada com um laço. Foto: Lara Castro/RR
Preso às vestes está um pequeno tambor e em cada mão está uma baqueta rematada com um laço. Foto: Lara Castro/RR
Por entre a porta entreaberta, o espelho reflete um grande grupo de crianças vestidas com fatos detalhados, onde o vermelho e dourado sobressaem. Foto: Lara Castro/RR
Por entre a porta entreaberta, o espelho reflete um grande grupo de crianças vestidas com fatos detalhados, onde o vermelho e dourado sobressaem. Foto: Lara Castro/RR


A reitora traz sapatinhos vermelhos e, num piscar de olhos, fica rodeada de alunos que se apressam a calçá-los. Entra então a professora Leonor. É portuguesa e há dois anos que dá aulas de dança contemporânea na escola, mas é a primeira vez que ensina dança chinesa na preparação para o Ano Novo.

“Um, dois, um, dois, três.” Ao ritmo da música e das orientações de Leonor, começa mais um ensaio para o grande dia.


O vermelho é essencial durante as comemorações do Ano Novo Chinês. A cor está associada à sorte e properidade. Foto: Lara Castro/RR
O vermelho é essencial durante as comemorações do Ano Novo Chinês. A cor está associada à sorte e properidade. Foto: Lara Castro/RR

A reitora traz sapatinhos vermelhos e, num piscar de olhos, fica rodeada de alunos que se apressam a calçá-los. Foto: Lara Castro/RR
A reitora traz sapatinhos vermelhos e, num piscar de olhos, fica rodeada de alunos que se apressam a calçá-los. Foto: Lara Castro/RR
“Um, dois, um, dois, três.” Ao ritmo da música e das orientações de Leonor, começa mais um ensaio para o grande dia. Foto: Lara Castro/RR
“Um, dois, um, dois, três.” Ao ritmo da música e das orientações de Leonor, começa mais um ensaio para o grande dia. Foto: Lara Castro/RR


Leonor é portuguesa e há dois anos que dá aulas de dança contemporânea na escola, mas é a primeira vez que ensina dança chinesa. Foto: Lara Castro/RR
Leonor é portuguesa e há dois anos que dá aulas de dança contemporânea na escola, mas é a primeira vez que ensina dança chinesa. Foto: Lara Castro/RR

Por entre a azáfama dos ensaios, esta comunidade de Arroios quer trazer um pouco da China até Lisboa. Foto: Lara Castro/RR
Por entre a azáfama dos ensaios, esta comunidade de Arroios quer trazer um pouco da China até Lisboa. Foto: Lara Castro/RR
Aproxima-se um fim de semana de "festa e muitas prendas” para os mais novos. Foto: Lara Castro/RR
Aproxima-se um fim de semana de "festa e muitas prendas” para os mais novos. Foto: Lara Castro/RR


A abertura do ano chinês em Lisboa acontece desde 2014. Começou por ser celebrada no Martim Moniz e, a partir de 2019, transferiu-se para a Alameda. Em 2021, a pandemia obrigou a interromper a celebração pública.

Este fim de semana, a festa regressa às ruas e a cultura chinesa volta a desfilar no centro de Lisboa. As festividades arrancam a meio da manhã do dia 1 de fevereiro, com um desfile ao redor do jardim da Alameda. Durante a tarde desse dia e do seguinte, o palco vai receber apresentações de várias escolas.


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