​Brasil. A guerra de poder entre gangues que explica a onda de mortes nas cadeias

​Brasil. A guerra de poder entre gangues que explica a onda de mortes nas cadeias

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07 jan, 2017 - 09:30

As cadeias brasileiras explodiram esta semana numa espiral de violência. Dezenas de mortes que são resultado de uma luta entre gangues rivais na conquista de poder. Uma guerra em que as forças de segurança nem sempre estão do lado da lei.

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A morte de quase 90 pessoas em motins dentro de prisões brasileiras, nesta semana, é fruto de uma guerra pelo controlo do tráfico de drogas no Brasil por duas facções que dominam o crime organizado. Um sistema que junta delinquentes, advogados e até juízes do mesmo lado da barricada, o dos fora da lei.

Os líderes destes grupos estão detidos nas cadeias. “Eles exercem o controlo do crime organizado de dentro das prisões. As disputas pelos pontos de tráfico de drogas resultam em confrontos e mortes. No caso Amazonas [cadeia onde morreram 56 detidos esta semana] o motivo da disputa foram as rotas do comércio de tráfico de drogas, porque está perto da fronteira da Bolívia e Colômbia, países produtores de cocaína”, explica à Renascença Roberto da Silva, especialista no sistema penitenciário brasileiro.

Para o professor na Universidade de S. Paulo, os assassinatos são o início de um conflito mais amplo dentro do Brasil.

Roberto da Silva identifica dois blocos em confronto: o Comando Vermelho, grupo do Rio de Janeiro, e o Primeiro Comando da Capital (PCC), da cidade de São Paulo.

Em Manaus, no domingo passado, um terceiro grupo, a Família do Norte, ligado ao Comando Vermelho, causou o motim para matar os rivais do PCC. Como resposta, membros do PCC mataram pelo menos 33 pessoas num motim na cidade de Roraima nesta sexta-feira. As vítimas tinham, na sua maioria, ligação ao Comando Vermelho.

Estes grupos ganharam força no Brasil por causa da fragilidade das forças de segurança locais, tendo inclusive a capacidade de controlar o tráfico de droga a partir do interior das prisões.

“De mais de 1.800 unidades prisionais do Brasil, menos de 30% tem bloqueadores de telemóvel ou aparelhos de identificação de metal”, afirma o professor da Universidade de S. Paulo.

Roberto da Silva acrescenta que há ainda falta de interesse por parte das forças de segurança locais em restringir a acção dos prisioneiros. E sugere duas causas: interesse estratégico ou corrupção.

“Para as polícias não seria interessante retirar os telemóveis de dentro da prisão porque as escutas com autorização judicial são o principal meio de investigação para saber o que acontece dentro das prisões”, começa por explicar o especialista.

“Há ainda os juízes desembargadores que são cúmplices destas facções criminosas, o que facilita a transferência deles entre prisões e a saída em liberdade”, acrescenta.

Os advogados dos arguidos desempenham também um papel importante dentro deste esquema. Muitas vezes, tornam-se o elo de ligação entre os cabecilhas que estão detidos e os operacionais que actuam nas ruas das principais cidades brasileiras.

Sobrelotação e condições precárias

A história do Comando Vermelho e do PCC está intimamente ligada às condições precárias nas cadeias no Brasil. Actualmente, o país conta com mais de 600 mil detidos, distribuídos por cerca de 1.800 prisões.

“Pela legislação internacional, as celas deveriam ser individuais, mas na maioria das prisões brasileiras as celas são colectivas. Por exemplo, uma cela que tem capacidade para oito presos pode ter até 60 presos”, afirma o professor Roberto da Silva.

O grande número de presos resulta sobretudo da lentidão do sistema judicial brasileiro. Em 2015, 39% da população prisional brasileira encontrava-se em condição de prisão preventiva, na grande maioria por causa de pequenos delitos relacionados ao tráfico de droga.

“Eles não são grandes traficantes, são pequenos traficantes, que no Brasil chamamos de aviãozinho ou mula, porque são meros transportadores de drogas”, explicou Roberto da Silva.

Na opinião do professor, as más condições combinadas com a falta de actividades sociais dentro das prisões, são responsáveis por situações como a de Amazonas e Roraima.

“A ociosidade é a regra dentro das prisões brasileiras. Não há trabalho, não há educação nem actividade desportivas. Sobra tempo para pensar em fugas e planear outros crimes”, remata Roberto da Silva.

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  • José
    07 jan, 2017 lousada 11:27
    A inação das autoridades deixa cair a justiça na rua.
  • Lekas
    07 jan, 2017 Lisboa 10:50
    Nada de anormal num país altamente corrupto e corruptor,irem-se matando uns aos outros é melhor para o mundo,devem é incluir na eliminação também os carolas que fora das prisões comandam o sistema,gente de poder e do poder

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