A+ / A-

“Vilar Formoso ajudou muito os refugiados do regime nazi”

08 mai, 2025 - 08:30 • Liliana Carona

Cerca de 15 mil visitantes, a maioria portugueses, passam todos os anos pela ‘Fronteira da paz’, o museu sedeado em Vilar Formoso dedicado aos refugiados e ao Cônsul Aristides de Sousa Mendes. Ali encontram-se centenas de passaportes, fotografias e até vídeo do momento em que Vilar Formoso recebeu quem fugia da II Guerra Mundial.

A+ / A-
Reportagem Museu da Paz - Liliana Carona

O Parlamento Europeu assinalou, em Estrasburgo, o 80.º aniversário do fim da Segunda Guerra Mundial com diversas homenagens a sobreviventes da guerra. Mas há um espaço em Portugal que diariamente celebra a paz alcançada nessa altura.

Já segue a Informação da Renascença no WhatsApp? É só clicar aqui.

O espaço museológico e Memorial "Vilar Formoso Fronteira da Paz" está localizado no lardo da Estação, em Vilar Formoso, concelho de Almeida, mesmo junto à fronteira.

Com uma média anual de 15 mil visitantes, tem tido cada vez mais procura, “principalmente por parte das escolas, com cada vez mais solicitações”, sublinha Fernanda Cruz, chefe de divisão do turismo da autarquia local, entidade que idealizou a criação de um museu a partir de dois pavilhões da Infraestruturas de Portugal, que estavam ao abandono.

À entrada, é a valsa de Carlos Paredes que nos guia até às imagens registadas em vídeo pelo documentarista russo George Rony em Vilar Formoso, em 1940.

É apenas uma das muitas provas do “Início do pesadelo”, uma das secções do "Fronteira da Paz", onde Manuela Carvalho, 53 anos, conduz as visitas desde 2017, data de inauguração. Não lhe faltam momentos, histórias que a marcaram.

“Duas irmãs vieram cá trazer os passaportes dos pais, uma tinha um ano e a outra tinha três aninhos quando passaram por aqui e, há pouco tempo, deram-nos o passaporte original dos pais”, conta, assumindo que enquanto moradora local, tem consciência de que “Vilar Formoso ajudou muito os refugiados do regime nazi”.

‘Comboio maldito’ esteve 10 dias parado em Vilar Formoso

Nas paredes do Memorial Vilar Formoso Fronteira da Paz estão centenas de passaportes e fotografias de refugiados salvos pelo cônsul Aristides de Sousa Mendes, mas também registos de quem não teve sorte e entrou no "Comboio maldito" de 11 de novembro de 1940.

“A 11 de novembro de 1940, um comboio com cerca de 300 judeus provenientes do Luxemburgo chega à Vila Formoso. A escoltá-lo vêm vários elementos fardados da Gestapo. Serão detidos na fronteira por se terem recusado a entregar as suas armas. Quanto aos passageiros, ficaram fechados durante 10 dias no interior dessas carruagens. Ficou aqui retido o comboio maldito, e a população de Vilar-Formoso, ia às carruagens e ajudava com pão, água e café. A 19 de novembro, o comboio é obrigado a regressar à França. Voltaram para trás, para um campo de extermínio. Algumas conseguiram fugir, mas outras foram mortas”, lamenta a assistente técnica do Memorial, mostrando o livro de registos de enterramentos que está exposto como prova, de que uma refugiada acabaria por falecer em Vilar Formoso, nesse comboio.

Escritores, pintores, artistas passaram pela fronteira de Vilar Formoso

“Pãezinhos portugueses redondos e dourados, acabados de fazer, ainda quentes, a sair do forno. O melhor pão branco do mundo, como viemos a descobrir. Latas deliciosas e enormes de sardinhas, barras de chocolate, as senhoras distribuíam biscoitos, doces e latas de leite condensado às crianças. Enquanto vivermos, não nos esquecemos das autoridades portuguesas de Vila Formoso”, escreveu o escritor americano, nascido na Hungria, Eugene Bagger.

“Estava a chover e quando atravessámos a fronteira, poucos minutos depois, o sol apareceu com um sorriso de boas-vindas”, recorda outro depoimento, lido por Manuela Carvalho.

Não esquecem o passado, os descendentes dos refugiados da II Guerra Mundial que vão passando a palavra.

De todo o mundo chegam turistas como Glennie Lindenberg, do Toronto, Canadá, 71 anos. “O fascismo, nazismo começou com discursos de ódio, começou com palavras e por isso é tão importante, principalmente para os jovens, vir aqui e aprender sobre a brutalidade que começa com os discursos de ódio e o quão importante é combater os discursos de ódio”, diz.

O museu apresenta seis núcleos expositivos: “Pessoas como nós”, “Início do pesadelo”, “A viagem”, “Vilar Formoso – Fronteira da Paz”, “Por terras de Portugal” e “A partida”.

A entrada tem o preço de 3€ e no final são muitos os que tiram uma foto junto à emblemática frase proferida por Aristides de Sousa Mendes: “Era realmente meu objetivo salvar toda aquela gente, cuja aflição era indescritível”.

Comentários
Tem 1500 caracteres disponíveis
Todos os campos são de preenchimento obrigatório.

Termos e Condições Todos os comentários são mediados, pelo que a sua publicação pode demorar algum tempo. Os comentários enviados devem cumprir os critérios de publicação estabelecidos pela direcção de Informação da Renascença: não violar os princípios fundamentais dos Direitos do Homem; não ofender o bom nome de terceiros; não conter acusações sobre a vida privada de terceiros; não conter linguagem imprópria. Os comentários que desrespeitarem estes pontos não serão publicados.

Destaques V+