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Polémica nos Açores

Pesca de Salto e Vara. Uma tempestade na rede de áreas marinhas protegidas dos Açores?

14 jun, 2025 - 10:30 • José Pedro Frazão

Os Açores foram elevados em Nice a exemplo cimeiro na proteção do Oceano. Mas a maior área marinha protegida do Atlântico Norte pode sofrer um revés se falharem negociações entre o Governo regional e o PS Açores sobre uma prática de pesca artesanal que os socialistas não querem ver excluída das áreas marinhas de máxima proteção.

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Chama-se "pesca de salto e vara" e é um método artesanal de pesca que permite, por exemplo, fazer capturas de atum na superfície com isco vivo. Em março deste ano, o PS Açores apresentou uma alteração legislativa para permitir que se possa pescar com esta técnica nas áreas com proteção máxima.

Entre outros argumentos, o PS Açores argumenta que desta forma “o pescador pode selecionar o peixe que captura, evitando peixes mais jovens ou espécies não comerciais”.

O tema tem causado polémica nos Açores onde em outubro foi aprovada uma Rede de Áreas Marinhas Protegidas (conhecida como RAMPA) em que o governo regional social-democrata contou com o apoio do PS açoriano para culminar cinco anos de trabalhos técnicos.

A proposta de alteração socialista deve ser apreciada em setembro no parlamento regional, a menos que o diálogo em curso entre o Governo e os socialistas chegue a bom porto.

Governo regional não mexe no projeto

Em Nice, à margem da Conferência dos Oceanos da ONU, José Manuel Bolieiro reafirmou a intenção de manter a proposta original, em nome do “prestígio e bom nome” da região autónoma, conservando a “consistência” do projeto aprovado em 2024.

“O ideal é manter o decidido, porque isto é que nos dá credibilidade e prestígio global”, sublinhou o líder do governo regional, reconhecendo que há diálogo com o PS sobre o assunto. “Estou convencido que o Partido Socialista saberá avaliar com melhor precisão os impactos da sua proposta intempestiva”, complementou à margem de uma visita à ‘zona verde’ da Conferência dos Oceanos de Nice.

Bolieiro apela ao PS como “partido responsável, que foi poderoso e que poderá ser poderoso, porque nas alternâncias democráticas é previsível que haja essa alteração da solução de poder”.

Milhões para indemnizações

Em defesa da Rede há um trunfo jogado por Bolieiro e pelos Executivos de Lisboa e Ponta Delgada. A aprovação da Rede de Áreas Marinhas Protegidas nos Açores prevê um pacote financeiro para pagamento de compensações aos pescadores afetados pela proibição de pescar nas áreas protegidas. São 10 milhões de euros que saem do Orçamento nacional por via do Fundo Ambiental.

Bolieiro chama-lhe "um bom compromisso do Governo de Portugal, pela Ministra do Ambiente, que assegura o financiamento suficiente para as indemnizações compensatórias de perdas de rendimento demonstradas", sublinhando que esta garantia "é muito confortável".

Entrevistada pela Renascença, a ministra Maria da Graça Carvalho promete assinar "muito rapidamente" um protocolo entre o Governo Regional dos Açores e o Fundo Ambiental, para financiar com 10 milhões de euros a "compensação pela perda de rendimentos dos pescadores devido à classificação daquela área".

A governante afirma que o objetivo do Governo é "manter a integridade" da Rede de Áreas Marinhas Protegidas dos Açores. Graça Carvalho fala numa "compensação temporária" porque é também "uma perda temporária de rendimento" para os pescadores.

"Estas áreas marinhas protegidas são autênticas maternidades de peixe. Existem para que daqui relativamente a pouco tempo haja muito mais peixe em todo o mundo e naquelas regiões. Isto é feito para proteger as espécies e para que no futuro haja muito mais peixe", explica a titular da pasta do ambiente à Renascença.

Graça Carvalho acrescenta que a medida também "protege o futuro da pesca e dos pescadores, para que não se pesque tudo agora e depois acabem completamente as espécies no Oceano"

Esperança em Lisboa

A ministra do ambiente manifesta o desejo de que as negociações entre Governo Regional e PS Açores terminem num entendimento cuja solução final não quebre a integridade da área marinha protegida.

" O PS, em geral, tem sido um partido que tem defendido, desde o seu início, as políticas de conservação da natureza, e nomeadamente nos oceanos. E a proposta inicial, em muitas destas áreas marinhas protegidas, veio já dos governos PS", reconhece a ministra do PSD, alertando que a RAMPA "tem sido descrita em todo o mundo como um bom exemplo a seguir, que colocam os Açores na agenda internacional do ambiente e da conservação da natureza".

"Um erro enorme"

Parceira do Governo Regional em todo o processo, a Fundação Oceano Azul criticou a proposta de alteração do PS Açores desde que foi conhecida.

Em março, Tiago Pitta e Cunha considerou que a proposta era "incompreensível", sublinhando a participação de centenas de pessoas na consulta pública e alertando que o atum migra para outras zonas onde pode ser pescado.

Em Nice, três meses depois, respondendo a uma pergunta da Renascença, o presidente executivo da Fundação sediada em Lisboa lembrou que está em causa a alteração do grau de proteção.

" É um erro enorme, desde logo por causa da reputação. Os Açores tornaram-se um campeão nas reuniões dos oceanos dos últimos anos. Isto traz aos Açores uma credibilidade internacional e uma valorização do seu território que vai ter um enorme impacto em toda a economia e desenvolvimento social dessa região", defendeu Pitta e Cunha em Nice.

O homem forte da Fundação Oceano Azul diz esperar que "todas as forças políticas da região dos Açores" compreendam o que foi "absolutamente visível" na Conferência das Nações Unidas para os Oceanos.

Pitta e Cunha recorda que quando as áreas marinhas protegidas dos Açores foram de novo anunciadas, agora em Nice, toda a sala se levantou em palmas.

"Parecia que Portugal, e neste caso os Açores, tinham ganho a Liga das Nações outra vez".

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