06 out, 2025 - 01:23 • João Maldonado
São 22h40: a hora marcada para a aterragem dos quatro portugueses. À sua espera, na entrada do aeroporto Humberto Delgado, estão milhares. Levantam bandeiras da Palestina e cartazes - cartolinas onde escreveram: “Obrigado” e “Bem-vindos heróis”. Os gritos são de euforia e vêm acompanhados pela música de apoio em coro. Não baixam o tom.
Passam agora 10 minutos das 23h e um passageiro diz à Renascença: “Vim com eles no avião." É a certeza de que o momento por que todos esperam está mesmo aí à porta. Por esta altura, a linha de jornalistas de todos os meios já está colocada em cima do corredor de saída dos voos. A confusão é tanta e a polícia tão pouca que quase parece possível, se alguém o desejar, dar uns passos e entrar na zona da recolha de bagagens.
Passados demasiado minutos há um necessário reforço policial. É que já não são apenas os jornalistas que estão tremendamente perto das portas. Dos milhares de apoiantes dos deportados por Israel há neste momento grupos a aproximarem-se também do mesmo local, saltando a barreira de proteção.
A confusão é abismal: falar com o colega do lado e ouvir a resposta é realmente difícil. Estamos quase em cima das 0h00 quando Mariana Mortágua, Sofia Aparício, Miguel Duarte e Diogo Chaves chegam à parte pública do aeroporto. A euforia atinge níveis que ainda não se tinham visto. Mais de uma hora de músicas - “Viva a Palestina!” -, mas a satisfação pelas chegadas nunca reduziu.
Com os quatro ali mesmo à beira, os jornalistas tentam aproximar-se e, naturalmente, fazer perguntas. Mas a polícia, reforçada, não o permite e há muitos empurrões. A barafunda é total entre fotógrafos, câmaras de televisão, gravadores e manifestantes.
O grupo é liderado pela deputada, com o mandato suspenso, Mariana Mortágua. É dada a indicação de que todos falarão na parte de fora do edifício. E só aí a polícia permite fazer questões. Chegados cá fora, a líder do Bloco de Esquerda começa por explicar o que viveram na cadeia em solo israelita, relatando as “experiências de ver camaradas a ser espancados, de várias horas algemados e de ser provocados por um ministro israelita”.
Lá diz que é clara “a diferença entre ser europeus e palestinos”, com tratamentos díspares dados pelos guardas: “Por muito que tenha havido abusos, dá-nos a ideia do tipo de impunidade israelita."
O relato vai sendo muitas vezes interrompido pelos cânticos que ecoam em redor do círculo onde são prestadas declarações. “Paulo Rangel pau-mandado de Israel” é um dos mais usados.
Não tendo qualquer crítica a apontar ao apoio consular que lhe foi prestado, Mortágua sublinha que “quem devia estar a furar o cerco humanitário e a proteger a lei internacional deviam ser os nossos governos que se dizem democracias” - apelando a sanções mais severas.
Miguel Duarte é o segundo a falar, clarificado que “todos nós passámos fome e sede, fomos algemados e vendados” em celas que “estavam absolutamente sobrelotadas”. Diz que houve quem não tivesse acesso a comida ou a água durante 48 horas. “Não existem direitos de prisioneiros nas prisões israelitas”, reforça.
Já Sofia Aparício revela que a todos terão sido apresentados “documentos escritos em hebraico”. A ideia, conta, seria assinarem para que Israel tivesse um papel que branqueava as detenções.
Quatro dias depois da detenção, Diogo Chaves remata as declarações salientando o dilema que tiveram na hora de deixar o país que os reteve: “Custa sair da prisão e deixar camaradas para trás, foi algo que debatemos, podíamos ter ficado mais tempo para apoiar os nossos camaradas, mas viemos para casa lutar”.
É em novo forte aplauso que terminam estes 15 minutos de perguntas e respostas. Os 4 retornados descansam agora, deixando a promessa de nunca deixarem adormecer a causa palestiniana.