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Estudo indica que 20,4% dos votos nas últimas eleições não elegeram deputados

19 abr, 2025 - 10:04 • Lusa

Segundo o estudo, é nos círculos eleitorais mais pequenos que há uma maior "falta de representatividade"

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Um estudo indica que cerca de 1,2 milhões de votos nas últimas eleições legislativas foram "desperdiçados" e não serviram para eleger nenhum deputado, correspondendo a 20,4% do total, com os territórios do interior a serem particularmente prejudicados.

Este estudo, intitulado "Os votos sem representatividade", foi elaborado pelo matemático Henrique Oliveira, do Instituto Superior Técnico (IST), e trata-se de uma atualização de outro estudo que já tinha sido feito a propósito das eleições legislativas de 2024, mas que ainda não tinha contabilizado os votos dos círculos eleitorais da Europa e Fora da Europa.

"Encontrámos 1.263.334 votos sem representatividade no país, somando os restos de todos os círculos eleitorais analisados (sem brancos e nulos). Correspondem a 20,4% dos votos válidos", lê-se no estudo.

Em declarações à agência Lusa, Henrique Oliveira salientou que as principais conclusões do estudo são que "existe uma grande desigualdade no território e na emigração entre os grandes círculos e os pequenos".

"Uma pessoa que vote em Lisboa quase certamente elegerá um deputado com o seu voto, a não ser que vote num partido muito pequeno. Em Portalegre, só pode eleger duas forças políticas no máximo, tal como [no círculo] Fora da Europa ou da Europa", referiu.

Segundo o estudo, é nos círculos eleitorais mais pequenos que há uma maior "falta de representatividade": em Portalegre, por exemplo, 49,5% dos votos válidos nas últimas legislativas não elegeram nenhum mandato, seguindo-se Beja (48,4%), os círculos da Europa (46,8%) e Fora da Europa (45,6%).

"Quase metade dos votos de Portalegre não servem para eleger nenhum deputado, ao passo que cerca de 90% dos votos de Lisboa e de 84% no Porto servem para eleger deputados. É uma grande desigualdade territorial: o voto do interior, o voto do emigrante, vale menos do que o voto de Lisboa, Porto, Braga, de todos os grandes círculos", referiu Henrique Oliveira.

Outra conclusão do estudo, segundo o professor de matemática do IST, é que "os partidos que conseguem capitalizar mais o voto são os grandes partidos -- que conseguem ver 90% dos seus votos convertidos em mandatos" --, enquanto os pequenos "não conseguem passar dos 40 a 45%".

Segundo os dados do estudo, o PAN precisou de 126.805 votos para conseguir obter um mandato parlamentar, enquanto o PS só precisou de 23.237 votos para eleger um deputado - ou seja, como refere Henrique Oliveira, o PAN precisou de "cinco vezes mais votos do que o PS".

O PS é, de acordo com o estudo, a força política "mais eficiente" em termos de votos, com 92,4% dos votos nos socialistas a converterem-se em mandatos, seguindo pela AD (92%) e o Chega (90,7%).

À Lusa, Henrique Oliveira referiu que esta discrepância entre partidos é inerente ao sistema eleitoral português, que converte votos em mandatos através do método d"Hondt, mas o mesmo não se pode dizer quanto às desigualdades territoriais.

"É um défice que existe na democracia portuguesa: o interior já é, muitas vezes, esquecido, e ainda por cima vale menos, em termos democráticos, do que o litoral", referiu, salientando que há formas de tornar o sistema mais igualitário nessa matéria.

"Uma delas é criar um círculo de compensação nacional, o que iria ter um grande inconveniente, que era dificultar muito a criação de maiorias políticas. Outra maneira era agrupar os círculos do interior em grandes círculos -- por exemplo, podíamos juntar o Alentejo e o Algarve -- que elegeriam nove, dez mandatos", exemplificou.

Quanto a formas de corrigir desigualdades entre os partidos, Henrique Oliveira deu o exemplo do sistema eleitoral de Israel -- que tem um único círculo nacional, o que garante uma maior representatividade --, mas advertiu que teria o inconveniente de tornar "praticamente impossíveis" maiorias absolutas.

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  • António Guedes
    19 abr, 2025 Vila Nova de Gaia 19:22
    Uma reflexão importante: nas últimas eleições, mais de 20% dos votos não elegeram deputados. 🤯 Isto levanta questões sérias sobre como o nosso sistema eleitoral traduz a nossa vontade em representação. Será que estamos a ser todos ouvidos da mesma forma? 🤔 Acredito que precisamos de discutir isto e procurar formas de garantir que cada voto conte verdadeiramente. A nossa democracia merece o nosso debate e atenção! 🇵🇹
  • Afinal...
    19 abr, 2025 Tanta conversa e afinal... 10:37
    Então mas o argumento da "falta de representatividade" não é usado pela partidocracia existente para negar que passemos a votar em pessoas em vez de em partidos? Afinal já há "falta de representatividade"... Porque é que os partidos existentes não assumem que não querem alterações à Legislação Eleitoral porque estão a defender o seu tachinho e a borrifar-se para as pessoas?

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