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Isabel Moreira denuncia ofensas do Chega a deputadas, Ventura pondera avançar na justiça

21 mai, 2024 - 20:10 • Ana Kotowicz , Ricardo Vieira

Depois da socialista, outras deputadas vieram confirmar aquela versão. Chega pondera avançar com queixa contra Isabel Moreira e pede que sejam exibidas provas.

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"Já ouvi coisas como vaca, mugidos ou nomes que normalmente se chamam a deputadas que são assumidamente lésbicas.” A denúncia de Isabel Moreira, feita na Rádio Observador, dirige-se à bancada do Chega. Segundo a deputada socialista, é comum ouvir-se nos corredores do Parlamento todo o tipo de ofensas verbais feitas especialmente a mulheres, quando "os microfones estão desligados". Outras deputadas, de diferentes partidos, confirmam os relatos de Isabel Moreira, enquanto o Chega pondera avançar na justiça contra a parlamentar, caso não sejam apresentadas provas.

“Há um quotidiano infernal, ingerível, de se ficar com os ouvidos verdadeiramente afetados, e uma ofensa e uma injúria permanente”, afirmou a deputada socialista, sublinhando que os alvos das ofensas “são sempre mulheres, ou quase sempre mulheres".

Isabel Moreira relata que tudo se passa quando as deputadas estão sem companhia: "Fazem nos corredores quando estamos sozinhas e ninguém está a ouvir ou dizem coisas absolutamente insuportáveis. Fazem as piores ofensas, intimidações, etc., com o microfone fechado, para não serem ouvidos e para serem só ouvidos pela pessoa que estão a injuriar”.

Além de misoginia, a socialista fala também em racismo: “Já ouvi, por exemplo, a uma deputada negra, ao meio-dia dizerem: ‘boa noite’, senhora deputada, que é uma coisa normal de se dizer ao meio-dia uma pessoa negra." A ofensa em causa foi confirmada por Romualda Fernandes, antiga deputada do PS.

Inês Sousa Real, do PAN, e Alma Rivera, do PCP, confirmaram a existência de ofensas verbais, enquanto Cristina Rodrigues, do Chega (e já depois das declarações do líder do seu partido) disse nunca ter visto "ninguém a insultar ninguém". Além disso, assegurou que o Chega pondera denunciar a situação, já que, no entender do partido, Isabel Moreira incorreu no crime de difamação.

Também Paulo Muacho, do Livre, disse à SIC Notícias que já ouviu alguns dos exemplos relatados de insultos a deputados na Assembleia da República. “Têm acontecido situações que podem roçar alguma falta de decoro. Já ouvi deputados que fazem mugidos quando algumas senhoras deputadas se levantam para discursar. É claro que no plenário, muitas vezes, é difícil conseguirmos perceber quem está a fazer esses sons, mas a verdade é que acontece, inclusivamente gestos que são feitos”, afirma o deputado.

A situação não é de agora, defende Alma Rivera, ex-deputada do PCP, que adianta que os insultos já existiam na anterior legislatura e não se dirigiam apenas a mulheres. “Foram-me relatados na altura em que aconteceram alguns destes episódios que entretanto foram tornados públicos, algo que envergonha qualquer pessoa”, disse Alma Rivera à SIC Notícias.

Os insultos não são apenas dirigidos a mulheres. “Esta atitude rufia e imatura, de gente que não sabe estar, não é algo que se direcione só às mulheres. Embora tenha particularmente acontecido com mulheres, mas também sei de situações de deputados homens em que há provocações constantes e gestos impróprios”, sublinha a antiga deputada do Partido Comunista.

O dever dos deputados perante estas situações é de se "insurgir", defende, por seu turno, Inês de Sousa Real. "Recordo-me de uma das primeiras vezes, porque fiquei escandalizada. É do conhecimento público que dei uma queda [em Maio de 2021] e fraturei duas vértebras e disseram-me: Vê lá se não cais outra vez", disse ao Público, acrescentando que, na legislatura passada, ouviu uma deputada do Chega chamar "senil" à socialista Edite Estrela.

Para a deputada única do PAN, a solução passa por pedir que todos os apartes que são feitos no Parlamento, e que não são ouvidos por quem está nas galerias porque os microfones estão desligados, passem a ficar nas atas. Essa será a sua estratégia e já a usou na passada semana, durante o debate sobre reparações às ex-colónias portuguesas, quando foi sucessivamente interrompida. E tal como Isabel Moreira, diz que os insultos são de todo o género, incluindo o "vociferar ou fazer vozes de animais".

Outro exemplo, da legislatura passada, foi apontado por Romualda Fernandes, ex-deputada do Partido Socialista, que denuncia ter sido alvo de um insulto racista nos corredores do Parlamento por parte de um elemento do Chega. Em declarações à SIC Notícias, Romualda Fernandes diz que não conhece o nome do deputado em causa, mas consegue identificá-lo se o encontrar.

“Confirmo que aconteceu e sou capaz de identificar o deputado que fez essas ofensas. Cruzando-me com ele no corredor da Assembleia, ia eu para uma reunião na sala das comissões quando abro a porta e, em pleno dia, olha para mim e diz: ‘boa noite’. Tomei aquilo como uma ofensa e eu percebi do que se estava a tratar. Pelo tom, pela forma jocosa como disse e prosseguiu rindo-se. Voltei a encontrar-me com essa pessoa na Comissão dos Negócios Estrangeiros, voltou a olhar para mim e riu-se”, recorda a antiga deputada.

De acordo com Romualda Fernandes, o grupo parlamentar do PS foi informado do incidente e terá reportado a situação na reunião da conferência de líderes parlamentares, sem consequências. “Senti como uma ofensa, com o intuito de me ofender pela cor da minha pele”, sublinha.

Chega pondera agir contra Isabel Moreira

André Ventura falou sobre o caso duas vezes, na manhã de terça-feira e à tarde numa ação de campanha a propósito das eleições na Madeira. Além de considerar que é ele o deputado mais insultado nos corredores do Parlamento, instou Isabel Moreira a provar as acusações que fez.

"Eu próprio já fui atacado de todas as maneiras por deputados do Bloco de Esquerda, por deputados do PS e por outros. Provavelmente ninguém é tão ofendido no país e no Parlamento como eu e não estou aqui a chorar à frente das câmaras", disse aos jornalistas na Assembleia da República.

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Ventura: Sem provas, "vamos avançar com um procedimento judicial"

Na Madeira, regressou ao assunto. "Foi grave dizer que o Chega tem este tipo de comportamento quando ela [Isabel Moreira] sabe perfeitamente que os seus colegas de partido têm um comportamento igual ou pior connosco, e comigo em particular", acrescentou. "Se houver provas nós cá estaremos para as analisar, agora não se faz acusações destas sem provas."

Caso não apresente provas, assegurou Ventura, o partido irá avançar com um processo judicial contra a deputada.

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  • Sónia Soares
    28 mai, 2024 Ermesinde, Alfena, Matosinhos, Porto 14:57
    É verdade, infelizmente . Se isso vem de pessoas ligadas ao " Chega ", é que desconheço por completo. Isso não posso afirmar , mas é uma situação que de que me tenho apercebido com bastante frequência há já algum tempo . Até pode ser por mera distração, mas tenho visto e ouvido isso acontecer . Não sou lésbica, nem de raça negra , mas isso também não é importante . As pessoas merecem ser tratadas com respeito e educação , seja qual for a sua orientação sexual , credo, religião., etc. Seja como for, há que considerar que , pelo menos o" Bom dia ", quando já é de tarde ou de noite ou o contrário , é o que tenho presenciado, o que me tem surpreendido bastante dada a sua frequência .Quanto ao resto das ofensas, isso nunca ouvi e nem presenciei. Não dou importãncia. Deduzo que quanto ao " fuso horário ", deva ser uma distração. Se calhar, até eu própria já o fiz e não foi com intenção, não me terei apercebido e terá sido por distração.

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