Viseu

Joaquim Tavares, 56 anos, bombeiro voluntário

A cidade de Viseu, eleita em 2018 como o melhor município para ser feliz, é capital de um dos dois distritos que, este ano, perdeu um deputado. Hélder Amaral, do CDS, e Miguel Tiago, do PCP, ambos figuras conhecidas dos portugueses, candidatam-se pelo distrito com poucas hipóteses de serem eleitos. Nas legislativas de outubro, apenas oito deputados irão sentar-se no Parlamento pelo círculo eleitoral de Viseu.

Desde os incêndios florestais de 2017, em que 114 pessoas morreram, várias medidas de combate e de prevenção foram implementadas pelo Governo. Existem 30 mil bombeiros, 92% dos quais são voluntários e exercem a profissão nos tempos livres. Joaquim Tavares é o comandante dos Bombeiros Voluntários de Vouzela, concelho onde morreram oito pessoas a 15 de outubro de 2017.

Os bombeiros deviam ter algumas regalias fiscais

O voluntariado é uma grande riqueza que temos em Portugal e gostava que o próximo Governo, seja ele qual for, olhasse para o voluntariado com olhos de ver e criasse um conjunto de incentivos que faça com que os jovens venham e abracem ser bombeiros. Reconheço que é preciso profissionalização, porque hoje os bombeiros já não estão tão disponíveis. A entidade patronal não vê com bons olhos que os funcionários saiam a meio do trabalho para prestar serviço nos bombeiros. Por outro lado, são-lhes exigidas horas de formação por ano, horas mínimas de piquete, há muita exigência, e se o bombeiro chegar ao fim do ano e não tiver cumprido as horas, passa ao quadro de reserva. Os bombeiros dão muito tempo e esforço à sociedade e deviam ter algumas regalias fiscais por isso.

Fiquei indignado com o valor de 617 euros para as EIP

Foi-nos atribuída uma Equipa de Intervenção Permanente (EIP) após os incêndios de 2017. No entanto, na altura não conseguimos constituir a equipa porque o valor atribuído era de apenas 617 euros mensais. Fiquei indignado com o valor, por haver uma discrepância muito grande em relação a equipas de bombeiros sapadores que fazem o mesmo trabalho. Em julho deste ano, houve uma alteração na legislação e o valor passou para 730 euros, que continua a ser um vencimento muito baixo, mas que com subsídio de alimentação possivelmente já dá para viver. A equipa já está constituída, faltam apenas alguns pormenores dos contratos e, em princípio, entra em funcionamento no dia 1 de novembro.

Algumas medidas foram tomadas só para se dizer que se fez alguma coisa

A faixa de 10 metros que obrigaram a limpar junto às estradas não é significativa. Vemos que os fogos passam estradas, autoestradas, rios, albufeiras e não são faixas de 10 metros que vão resolver a situação. Algumas medidas de prevenção foram tomadas para se dizer que se fez alguma coisa. A solução passa por uma remodelação da nossa floresta. Eu sei que o eucalipto é necessário, mas terá de ser muito mais bem gerido e legislado. Não se pode plantar de qualquer forma.

Hoje quase é preciso ser-se doutor para se ser bombeiro

Vouzela contraria a tendência da região, de abandono da população, e o nosso quartel também é uma exceção no que respeita à participação dos voluntários no universo geral dos bombeiros. No ano passado, houve uma escola de estagiários da qual saíram 19 bombeiros. Este ano já há mais uma escola a funcionar com 15. Temos um grupo de voluntariado muito bom, mas cada vez é mais difícil entrar para bombeiro. Dantes, toda a instrução era dada no corpo de bombeiros, mas hoje quase é preciso ser-se doutor para se ser bombeiro. A forma de acesso à carreira de bombeiro voluntário devia ser simplificada e o acesso à promoção é que devia ser mais rigoroso.

Quando soar o alarme para as pessoas se juntarem, duvido que isso aconteça

A Aldeia Segura, a par do kit que traz as golas inflamáveis, é uma medida sobre a qual tenho muitas dúvidas, duvido que funcione numa altura aflitiva. Quando for dado o alarme para as pessoas se juntarem, duvido que isso aconteça, porque querem olhar pelas suas casas e pelos seus bens. Será muito difícil abandonarem os locais. Em 2017, tivemos situações em que os bombeiros e a GNR tiveram de retirar algumas pessoas dos locais.

As pessoas estão mais sensibilizadas

Vamos entrar agora no mês de outubro, que foi quando se deu a tragédia na nossa região, e está previsto novamente um clima semelhante ao que ocorreu nessa altura, com temperaturas acima dos 30 graus e com um furacão que vai afetar o arquipélago dos Açores. Não podemos esquecer que foi o furacão Ofélia que potenciou os incêndios de 15 de outubro. As pessoas estão mais sensibilizadas, já não se veem fogueiras em alturas complicadas e tem havido uma maior fiscalização por parte da GNR, que tem dado frutos, mas por vezes o excesso de avisos acaba por dar uma dica aos incendiários a dizer qual é o dia em que podem atuar.