18 jan, 2016
No ato de lançamento do livro do Papa Francisco “O Nome de Deus é Misericórdia”, realizado na semana passada no Vaticano, não sei o que toca mais: se o testemunho de Zhang Agostino Jianqing, um jovem chinês condenado a 20 anos de pena, que se converteu ao cristianismo na prisão, ou o espectáculo de alegria e vivacidade do realizador e ator Roberto Benigni.
O recluso, batizado em 2015, depois de um processo de descoberta da alegria do Evangelho, sobretudo através de um compatriota igualmente detido, testemunhou como a misericórdia de Deus mudou a sua vida e agradeceu a “atenção particular” e permanente do Papa Francisco para com os presos.
O realizador de “A vida é bela” referiu-se ao Papa como “uma cascata de misericórdia”, que não pára de correr, que toma a misericórdia como o mapa pelo qual procura conduzir a Igreja para um lugar “esquecido: o cristianismo”.
A alegria de Benigni poderia parecer despropositada, num contexto em que o assunto era a misericórdia. Mas isso só pode ser motivo de estranhamento para quem, na misericórdia, olha apenas para os males, as desgraças e os pecados – na vida individual e na sociedade política. A perspetiva do livro de Francisco é toda outra: para ele, como salientou logo no Angelus inicial do pontificado, a misericórdia “muda tudo, muda o mundo”, porque o torna “menos frio e mais justo”. Para ele, “a Igreja não está no mundo para condenar, mas para permitir o encontro com aquele amor visceral que é a misericórdia de Deus”. E “para que isso aconteça (…) é necessário sair. Sair das igrejas e das paróquias, sair e ir procurar as pessoas onde elas vivem, sofrem, esperam”.
A alegria de Benigni provém justamente desta atitude de descentramento. De saída de si, dos espaços de conforto, de certeza e de estabilidade, para estar “onde se combate”, onde são necessários os primeiros socorros e o “hospital de campanha”. Isso passa por abrir as portas e mantê-las abertas, como observou o cardeal Parolin, no lançamento do livro do Papa. Abertas para sair, mas também para (os que querem) entrar.
Já não é a primeira vez que Francisco partilha o sentimento que tem quando visita detidos: “Porquê eles e não eu?”. Uma pergunta que poderia ser transposta para tantas outras situações dos nossos dias, do desemprego ao terrorismo. Sim, porquê eles e não eu? Porquê?