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Duarte Afonso Silva
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Opinião Católica-Lisbon

Os líderes criam equipas (in)dependentes

25 nov, 2024 • Duarte Afonso Silva • Opinião de Duarte Afonso Silva


Os líderes devem ver para lá ‘do que sempre foi’. Ver para lá da performance habitual e do passado. É mais fácil manter os colaboradores na ‘caixinha’ típica da avaliação anual, do que acreditar no potencial.

Muitos líderes queixam-se de que as suas equipas são dependentes de si. Referem não saber exatamente como promover autonomia, ainda que tenham feito algumas tentativas. No fundo, a realidade é que muitos líderes criam culturas de dependência.

Edwin Hollander, psicólogo social e organizacional que faleceu em 2020, dedicou-se a estudar os fenómenos da liderança, sobretudo de um ponto de vista grupal, e nas organizações.

Num estudo que desenvolveu, foi selecionado um líder que atuava de forma diferente perante grupos distintos. Numas equipas, o líder assumia um estilo inclusivo, incentivando a partilha de ideias e a responsabilização conjunta. Noutras, o líder optava por uma abordagem mais autoritária, dando instruções diretas.

De uma perspetiva do que se pôde observar, as equipas que experienciaram uma liderança autoritária esperavam que o líder resolvesse todos os problemas que surgiam e tomasse todas as decisões, demonstrando uma elevada dependência. Nas outras equipas, lideradas de uma forma mais inclusiva, os membros partilhavam mais as suas ideias e tomavam decisões em conjunto. Havia menor necessidade de validação junto do líder, demonstrando menor dependência.

O que é frequentemente visível na forma como as organizações olham para determinados conceitos, como a aprendizagem, a análise qualitativa, entre outros, é que o fator tempo tem prioridade e é assumido como absolutamente central face ao resto. Assim, os líderes julgam que é mais rápido dizer o que fazer (ou acabando por fazer eles mesmos determinada tarefa), e atuando de forma diretiva, ou até mesmo ditatorial, do que empoderar as suas equipas.

Quando perguntamos aos líderes que abordagens foram utilizadas no sentido de gerar maior autonomia nas equipas, a maioria responde que já tentou, por exemplo, debater, ou até dar total liberdade, quase se distanciando da função de liderança, evaporando-se temporariamente. Nenhuma das abordagens funciona, além de que são alternativas associadas sobretudo a um estilo mais tradicional de gestão. No primeiro caso, debater implica muitas vezes um gasto grande de tempo e conduz frequentemente à indecisão. No segundo caso, se o líder desaparece de cena, muitos colaboradores desconhecem a direção e o contexto do que é exigido. Observamos, por consequência, um decréscimo na performance e um aumento do stress, até porque muitos indivíduos se sentem pressionados para assumir o comando, quase sem escolha.

O colaborador que faz porque é obrigado não aprende e não aporta valor. Pode inclusivamente boicotar o processo. Não se desenvolve e não acredita em si, porque o sucesso do seu trabalho não resultou diretamente do seu esforço.

Em alturas de instabilidade, ansiedade e ambiguidade, as pessoas procuram o líder. Querem fazer parte do todo, sentir-se com propósito, e dar sentido à sua existência. Isto implica que muitos líderes saiam da sua zona de conforto. Sabemos que mudar é assustador, mas ver as coisas de uma outra forma é uma escolha. É possível escolher o mindset, as lentes com que observamos determinadas realidades, e a forma como vemos o outro. Para isso, é relevante parar para refletir, fora da aceleração e das solicitações constantes com as quais vivemos todos os dias.

Os líderes devem ver para lá ‘do que sempre foi’. Ver para lá da performance habitual e do passado. É mais fácil manter os colaboradores na ‘caixinha’ típica da avaliação anual, do que acreditar no potencial. A estabilidade é apetecível, mas já não vivemos num mundo estável e previsível. A abordagem única para qualquer que seja a coisa, não funciona. É mandatória a adaptação e a personalização ou, se quisermos, a humanização.

Muitos líderes receiam a perda de controlo, o crescimento do desconhecimento face ao que se passa, a perda de respeito. Contudo, adotar uma atitude de empoderamento produz precisamente o contrário. Empoderar é perguntar com intenção, curiosidade, e de forma poderosa. O líder que questiona, sabe o que se passa, é respeitado, e contribui para o aumento da performance.

Promover escolha e liberdade, criando uma cultura de confiança onde as pessoas são desafiadas e encorajadas é o caminho. Tal implica que se vivencie uma dinâmica relacional de igual para igual, embora muitos líderes ainda não se sintam preparados para tal e não consigam conceber tal ideia, dado o medo e a perspetiva que têm do que é poder.

Os estudos demonstram que o comportamento de uma determinada pessoa vai resultar da expressão daquilo que penso de si, mas também da expetativa que tenho. Se estou preso no que sempre foi, se não acredito na sua capacidade, o seu comportamento não muda e vai refletir precisamente isso.

É importante olhar o futuro e ver para lá do que temos à frente, no presente. Acreditemos no potencial. Muitos líderes gabam-se da sua capacidade de criar, inovar, alterar paradigmas, e de mudar. Não se trata de um paradoxo? Promover a mudança e o crescimento no outro não é também responsabilidade sua?

Quando alguém acredita em si, é capaz de coisas extraordinárias, graças à motivação. E sem motivação, não há performance. Tal como não levamos as nossas organizações a bom porto sozinhos. Voltando a Edwin Hollander, “façamos as coisas com as pessoas, e não para as pessoas”.


Duarte Afonso Silva, Development Manager Executive Education na Católica Lisbon Business School & Economics

Este espaço de opinião é uma colaboração entre a Renascença e a Católica-Lisbon School of Business and Economics

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  • Antonio Cardoso
    25 nov, 2024 Lisboa 17:28
    Artigo muito pertinente. infelizmente os lideres do agora pensam como os Antigos, preocupam-se mais com a sua propria motivaçao e com o medo que o empowerment da equipa possa comprometer a sua posicao. Literatura como o Sr Jornalista apresenta aqui poderia abrir a mente de muitos