10 fev, 2025 • Jorge Faustino e Rosário Pinto Correia
Todos os anos, em cada semestre, invariavelmente, no primeiro dia de aulas, somos quase excomungados pelos alunos.
Não pelo conteúdo da disciplina.
Não pelo sistema de avaliação.
Nem pelo horário, pouco comum...
Mas sim porque não permitimos que os alunos estejam online enquanto duram as aulas! Nem telemóvel, nem computador, nem tablet... nem nada que esteja de alguma forma conectado.
Olham para nós como se fôssemos extraterrestres e temos sempre de repetir várias vezes o que estamos a dizer, tal o grau de incredulidade que provoca.
Questionam-nos sobre como podem tomar notas se não tiverem o computador ligado e ficam estupefactos quando lhes dizemos que usem papel e caneta.
Reclamam, porque se a cadeira se chama "Marketing in the New Era" e hoje em dia o marketing é, em grande parte, digital... como é possível que, nas aulas, não possam estar online?
Tentamos mostrar que não há razão para FOMO (Fear of missing out) – as aulas duram 75 minutos, tudo estará online quando acabar... e, numa emergência, a escola sabe onde estamos e pode chamar-nos.
Explicamos, depois, que se trata de uma questão de respeito – por quem está a falar para eles, quer sejam os restantes alunos, quer sejam os convidados que lhes vêm fazer palestras pelo puro prazer de lhes transmitir o que sabem, ou mesmo por nós. Atenção não dividida é o mínimo que podemos dar a quem se esforça por partilhar connosco o que sabe ou descobriu no âmbito de um qualquer trabalho.
Mas, mais do que isso, trata-se de uma questão básica da aprendizagem.
Dividir a atenção cria dispersão, e de cada vez que um ping ou luz acesa num qualquer suporte digital nos chama, lá se vai a nossa concentração.
Assim, para que possamos aproveitar ao máximo o que estamos a viver, não podemos estar em multitasking permanente, sobretudo quando o que nos distrai não é vital para a nossa vida ou sobrevivência.
E com esta explicação, felizmente, cada vez temos mais cabeças a acenar e alunos a concordar connosco.
Cada vez mais percebem as vantagens da maior concentração que o "desligar" permite.
Estão cada vez mais conscientes dos malefícios de uma presença online permanente.
E, desde o ano passado, até começámos a receber, nas avaliações de fim de semestre, agradecimentos de alunos que reconhecem a vantagem de terem estado a 100% nas aulas!
Desde há uns anos que temos consciência desta dispersão que a ligação online provoca. Há um excelente vídeo (de apresentação de um fantástico livro de Nicolas Carr, já de 2010, onde a dinâmica das distrações e os desafios da presença online na construção do conhecimento são apresentados de forma clara, e que desafiamos todos a ver.
Felizmente, o reconhecimento destes danos é cada vez maior, e assistimos, um pouco por todo o mundo, ao aparecimento de legislação ou recomendações sobre a redução (ou mesmo a proibição...) do uso de telemóveis nas aulas, sobre a substituição de livros digitais por livros físicos e, em geral, sobre medidas que ajudem quem aprende a concentrar-se no conhecimento que lhes está a ser transmitido, deixando de lado os "shallows" do mundo digital.
O reconhecimento de todos os benefícios que o mundo digital nos traz não pode, em momento algum, impedir-nos de reconhecer também os riscos que acarreta.
Nomeadamente na aprendizagem, onde a concentração é fulcral, os desafios e solicitações da presença online podem ser fatais para a absorção e consolidação de conhecimento.
Na nossa cadeira, declaramos combate ao FOMO e impedimos os alunos de estarem online, tentando, com isso, dar o nosso contributo para esta batalha contra a dispersão!
Rosário Pinto Correia e Jorge Faustino - Docentes da Católica Lisbon School of Business and Economics
Este espaço de opinião é uma colaboração entre a Renascença e a Católica-Lisbon School of Business and Economics