28 abr, 2025 • João César das Neves
O Papa Francisco foi, sem dúvida, um grande Pontífice, que deixou profunda marca na Igreja e no mundo. Todos o disseram após a sua morte. Polémico desde o início, foi muito aclamado e atacado, considerado inovador e herético, revolucionário e impertinente. Não faltam os que o acusam de mudar a Igreja e aqueles que o exaltam precisamente pela mesma coisa. Isto chega para ver como foi incompreendido.
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A causa das confusões veio menos dele que do tempo paradoxal em que viveu. Chamado ao seu posto num momento crucial da história da humanidade, uma “era de mudança”, como lhe chamou, teve de responder a profundos e ambíguos desafios. A sua resposta foi precisamente o oposto da que lhe atribuem. Não foi inovadora nem herética, não foi revolucionária nem impertinente. Limitou-se a apresentar o Evangelho de Jesus Cristo, aquele que o mundo conhece há dois milénios, da melhor forma de que foi capaz a uma época que realmente o desconhece. A surpresa veio do desconhecimento, não da mensagem. Toda a inovação e controvérsia do Pontificado está presente no mundo desde a primeira Páscoa. Foi isso, e apenas isso, que tanto chocou, neste Papa como nos anteriores.
Duas linhas principais contribuíram para a magna incompreensão dos ensinamentos de Francisco. A primeira veio das refregas do tempo, motivando agendas próprias entre os adversários, cada um tentando capturar o Papa para o seu campo, seja para o cooptar ou para o condenar. Não faltaram os “donos do pensamento papal”, interpretadores oficiais, que pretenderam encaixar o sentido na forma que lhes interessa. As frases contundentes acerca da economia, por exemplo, serviram de munição a muita gente para combates muito diferentes dos papais. Houve quem quisesse mobilizar Francisco para campanhas anticapitalistas, enquanto outros o repudiavam precisamente pela mesma razão, sem nunca realmente entenderem o verdadeiro significado.
Nenhum desses quis aprender com o Papa, quis arrepender-se, converter a vida, mudar de hábitos. A finalidade era utilizá-lo como arma de arremesso nos eternos e repetitivos duelos em feudos contra adversários locais. Por muito que o exaltem, não pertencem ao rebanho do Papa; são antes lobos, que o querem pilhar a seu favor.
A segunda fonte de distorções é a permanente ânsia de novidade num tempo empanturrado de mediatismo. Repetiu-se até à exaustão que o Papa era renovador, arrojado, transformador, sem perceber que isso era exatamente o oposto daquilo que ele pretendia. O Papa nunca quis fazer uma Igreja à sua imagem, mas colocar o Senhor no centro. A uma jornalista que, embevecida por mais uma alegada originalidade de Francisco, lhe perguntava se a Igreja o seguiria nisso, o Papa respondeu de forma lapidar: “Sou eu quem segue a Igreja” (entrevista 12/7/2015).
De nada serviram as suas repetidas garantias de apenas repetir a Doutrina Social da Igreja; foram inúteis as múltiplas citações dos seus antecessores, mostrando a sólida continuidade. Para os defensores, como para os críticos, a Igreja de Francisco era diferente. Alguns, que detestam a Igreja como ela é, e estão sempre à espera daquela que finalmente seja boa, disseram seguir a Igreja de Francisco; não a Igreja que realmente existe no pontificado de Francisco, mas aquela que imaginaram a partir da sua interpretação do Papa. Este, que sempre amou aquela que considera como sua Mãe, apenas lhe quis lavar o rosto.
A melhor forma de compreender a incompreensão do Pontificado de Francisco é comparar as opiniões atuais com as que foram referidas após a morte de São João XXIII, São Paulo VI, São João Paulo II, ou Bento XVI. Em todas essas datas surgiram as mesmas declarações acerca da novidade, originalidade, revolução. E em todos os casos foram verdadeiras. Isto porque em todos os casos, a posição do Papa era estranha e original, a mesma de Pedro, seguindo o Seu Mestre há dois mil anos.
João César das Neves, Professor da Católica Lisbon Business School & Economics.
Este espaço de opinião é uma colaboração entre a Renascença e a Católica-Lisbon School of Business and Economics.