24 jan, 2018
“The Darkest Hour”, em exibição nos cinemas, é uma grande evocação de um político fora de série e de um dos momentos mais cruciais da história europeia e global. O político é Churchill e o momento é o período de Maio-Junho de 1940, quando a Grã-Bretanha decidiu resistir à avalanche da “Blitzkrieg” nazi, então dada como invencível.
Winston Leonard Spencer Churchill foi uma figura “bigger than life”.
A sua biografia poderia ter sido um fracasso; em vez disso, proporcionou-lhe o contexto para o melhor da sua personalidade cunhar a lenda. Estudante mediano e soldado-jornalista durante a Guerra dos Bóeres, Churchill estreou-se na vida política em 1900, como deputado conservador.
Em 1904 mudou-se para o Partido Liberal, por onde chegou à liderança do Almirantado. O desastre de Galípoli, na I Guerra Mundial, custou-lhe o lugar, ainda que Lloyd George o tenha depois resgatado para postos ministeriais.
Em 1924, regressou ao Partido Conservador. Todavia, por estes ziguezagues e pelo seu modo de ser – gentleman, sem dúvida, mas impaciente, por vezes cortante e politicamente incorreto – era olhado pela classe política como pouco confiável.
Por isso ninguém quis ouvir os seus prescientes alertas acerca da militarização da Alemanha nazi, nos anos 30, e achou-se que tinha mau perder por criticar Neville Chamberlain quando este cantou vitória após a Conferência de Munique, em 1938.
Depois de Hitler invadir a Polónia e varrer a Europa, dos países nórdicos à França, nos primeiros meses da II Guerra Mundial, o governo de Chamberlain soçobrou.
Churchill tinha 65 anos quando chegou ao cargo de primeiro-ministro, a 10 de Maio de 1940. Estava-se a um ano e meio de Pearl Harbour e da entrada do amigo Roosevelt e dos EUA na Guerra, e o contributo antinazi da URSS de Estaline era ainda uma miragem.
Contra os que lhe recomendavam que negociasse uma qualquer paz com o novo dono da Europa, Churchill traçou a sua linha vermelha, e explicou-a em discursos memoráveis, de retórica apaixonada e de clarificação ideológica.
A Grã-Bretanha era o derradeiro bastião da liberdade, por esta se entendendo as mais veneráveis tradições e legados da civilização ocidental. Com “sangue, suor e lágrimas”, combateria o nazi-fascismo e jamais se renderia. O visconde Halifax e outros achavam que isto era patriotismo suicida.
Mas foi essa determinação que produziu o milagre de Dunquerque, que animou a martirizada Londres durante a Batalha de Inglaterra e que manteve acesa a chama da liberdade até a Guerra mudar de rumo. Em 1945, por injustiça poética, Churchill perdeu as eleições gerais para Clement Attlee. Ainda voltaria a Downing Street entre 1951 e 1955. Morreu uma década depois, já na era dos Beatles.
Democrata conservador e campeão da “Britishness”, Churchill não é um intocável da história (os críticos lembram a sua defesa da eugenia, o seu imperialismo ou o seu quase silêncio perante o Holocausto). Mas no fundamental – quando foi necessário salvar o mundo livre e as democracias a que tudo devemos – esteve do lado certo da história; foi ele, aliás, um dos grandes obreiros desse lado certo da história. E era, também, um grande europeísta, companheiro de Schuman, Monnet ou Adenauer, mesmo considerando a especial geografia marítima da sua Ilha.
Na II Guerra, a Europa salvou-se, não só, mas muito, pela resistência tenaz da Grã-Bretanha. Por isso, hoje e para o futuro, é doloroso pensar numa Europa sem o Reino Unido, e é preocupante que Theresa May não consiga emular Sir Winston (embora os contextos históricos sejam naturalmente diferentes), ou que o isolacionismo de Trump esteja nos antípodas da solidariedade atlântica de Roosevelt.