05 fev, 2025
Para Donald Trump, a contagem decrescente começou no momento da sua tomada de posse. Ele sabe que tem quatro anos para fazer história e entrar para a História. Na verdade, nem quatro anos tem, porque no final de 2026 haverá eleições intercalares para o Congresso e é provável que o poder absoluto dos republicanos venha a diminuir, por uma previsível recuperação do Partido Democrata - embora este pareça ainda não perceber o que lhe aconteceu, e ainda distante de uma autocrítica de “deswokização” que a esquerda americana (e europeia) tarda em fazer.
Pouco moderado e bastante impetuoso, menos diplomata de bastidores do que homem de negócios pragmático e empreendedor, Trump tem na presidência da maior potência do mundo um instrumento que nenhum outro magnata alguma vez teve (Morgan, Hearst ou Rockefeller manobravam o poder, mas não estavam sentados na Sala Oval). Por isso, numa estratégia de “front loading” (vincar o início de um novo ciclo), a sua política pretende um vórtice de barreiras protecionistas na economia e de OPA’s hostis na política - da apropriação simbólica do “Golfo da América” ao “convite” a que o Canadá se lhe junte, do monroísmo sobre o Panamá às ambições de domínio sobre a Gronelândia, tudo misturado com rasgos de retraimento isolacionista como os EUA abandonarem a OMS, o Acordo de Paris, e quem sabe um dia a NATO ou a ONU.
A festivalização política e o estilo histriónico do trumpismo obscurecem o que é essencial. Desde que há vinte anos os norte-americanos começaram a enterrar-se no atoleiro do Iraque, passando a constituir o grande rosto exógeno do problema do Médio Oriente (em vez de serem a sua solução), os EUA estão em recuo do mundo. A crise internacional pós-2008 agravou isso mesmo, pela simultaneidade da fragilização da Europa e da ascensão da China. Quando se estreou em Davos, em 2017, era o autocrata chinês Xi Jinping e não o novato Trump quem representava o globalismo internacional. O trumpismo que regressou agora à Casa Branca quer estar para os nossos tempos como o neoimperialismo pós-1898 de William McKinley, explicitamente citado no discurso de tomada de posse. No final do século XIX, os EUA deixaram de ser uma potência regional para se tornarem potência global, com um eixo alargado que ia das Filipinas e do Havai a Cuba e Porto Rico. Em 2025 e no futuro querem voltar a sê-lo, externalizando a sua voz e projetando o seu poder em concorrência, e por isso contra, a quem o ensombra - a China. Para Trump, o problema não é Xi Jinping ser um autocrata ou a China uma ditadura; é essa autocracia ditatorial dar cartas na economia mundial, arregimentando mais de uma centena de países no “soft power” de Pequim que, pelo projeto «Cinturão e Rota», está a neocolonizar várias partes do mundo, algumas… às portas da América.
O slogan e plataforma MAGA (“Make America Great Again”) implica, portanto, um outro, com a simples variação de uma letra: o MAWA, de “Make an American World Again”. Em vez de se afadigarem em descobrir “fascismo” em Washington, talvez os europeus devessem pensar seriamente que posição lhes convém tomar perante esta ressurreição da América. Trump, por seu turno, também deveria ter quem o aconselhasse a não alijar o eixo atlântico, porque é deste lado do oceano que poderão estar os seus aliados numa causa de competitividade internacional que será também um teste à durabilidade das democracias. A questão estará em fazer Bruxelas compenetrar-se de que em Washington encontra hoje um líder para quem a moralidade intrínseca das democracias vale menos do que uma posição económica, militar e geoestratégica - e nisto, a Europa também precisa de se dar pressa e de regressar ao (seu) futuro.