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Pedro Leal
Opinião de Pedro Leal
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​Em Paris, discute-se o envio de tropas para a Ucrânia. Em Lisboa…

10 mar, 2025 • Opinião de Pedro Leal


A discussão política em Portugal revela-se assíncrona e totalmente lateral à gravidade do momento que a Europa atravessa. Não estamos a ser responsáveis e estamos distraídos com a espuma dos dias.

Na terça-feira, reúnem-se em Paris os chefes de Estado-Maior das Forças Armadas dos países que estão a considerar o envio de soldados para a Ucrânia, integrados numa eventual força de manutenção da paz, quando e se esta chegar, numa iniciativa do presidente francês, Emanuel Macron.

Contactada pela Renascença, a assessoria do Chefe de Estado Maior General das Forças Armadas não confirma se Portugal estará presente. Mas Portugal já não esteve presente na cimeira de Paris, também convocada por Macron, nem na de Londres, convocada por Starmer.

Em Portugal, o tema do dia é a moção de confiança.

No domingo, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, disse que “as alterações geopolíticas estão a fazer estremecer alianças” e que “os valores europeus, a democracia, a liberdade e o estado de direito estão sob ameaça”. Nos últimos dias, no centro do continente europeu, a Polónia anunciou que vai dar treino militar a todos os homens adultos perante a ameaça de uma guerra alargada na Europa.

No início de janeiro, no discurso ao corpo diplomático acreditado na Santa Sé, o Papa Francisco disse que “a terceira guerra mundial aos pedaços está a transformar-se num verdadeiro conflito global”.

Enquanto isso, em Lisboa, a Assembleia da República prepara-se para discutir uma moção de confiança, após duas de censura terem sido chumbadas.

A discussão política em Portugal revela-se assíncrona e totalmente lateral à gravidade do momento que a Europa atravessa. Não estamos a ser responsáveis e estamos distraídos com a espuma dos dias. Uma espuma mesmo assim grave, que necessita de ser explicada, mas que poderia ter outra saída.

Faltam explicações e escrutínio. Será natural que uma crise deste tipo - que pode levar à queda do governo - passe sem uma entrevista ao protagonista da crise, Luis Montenegro, num órgão de comunicação social? Será natural não haver um escrutínio jornalístico, politicamente equidistante, no qual todas as explicações poderiam ser dadas - evitando-se a ruptura?

Nas rádios, televisões e imprensa multiplicam-se os ministros, a dizerem uma coisa e o seu contrário, bem como as personalidades da oposição: todos dizem que se formos para eleições a culpa é dos respetivos adversários. Mas Luís Montenegro, o único que verdadeiramente precisa de falar, permanece fechado nas suas palavras sem contraditório jornalístico.

Em algum silêncio estão também as entidades públicas responsáveis por fiscalizar estes processos e que não respondem às perguntas dos jornalistas sobre o caso, pelo menos em tempo útil.

Perante a gravidade do momento internacional, que os líderes têm obrigação de conhecer, não seria aconselhável um outro comportamento? Pelo menos uma tentativa de se estabelecerem pontes em vez de frases, proferidas por um lado e por o outro, que falsamente criam a sensação de disponibilidade, mas que mais parecem um precipício para a ruptura.

Até em Espanha, onde confronto político é grave, duro e onde o diálogo está praticamente ausente, o primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, e os partidos da oposição, encabeçados por Alberto Núñez Feijóo, do PP, reunem esta semana para falarem não da crise política interna, mas da segurança europeia e da posição espanhola.

E neste tema, qual a posição de Portugal? Qual a estratégia? Como vamos enfrentar o aumento de despesas no sector militar? O que pensamos do futuro da segurança europeia? Quem a vai liderar? Vamos enviar tropas para a Ucrânia? Vamos introduzir de novo o Serviço Militar Obrigatório? Onde e como queremos estar e que pensamento temos sobre o grave contexto internacional?

A reflexão tarda, repetindo-se as as velhas frases de jura de defesa do atlantismo - um atlantismo que está já a ser colocado em causa pelos Estados Unidos a favor do Pacífico. Nos últimos dias, os Estados Unidos anunciaram mesmo que vão abandonar os exercícios NATO em solo europeu a partir de 2026.

Regresso de novo ao Papa Francisco. No mesmo discurso aos diplomatas, no início de janeiro, Francisco lembrou que, à luz da Doutrina Social da Igreja, “a política deve ser sempre entendida, não como uma apropriação do poder, mas como uma forma mais elevada de caridade", ou seja, que a centralidade da ação política deve estar no outro, no próximo.

Perante o cenário político nacional, Portugal está distante dos temas que gravemente marcam o dia-a-dia da Europa e do que deveria ser o objeto da ação política - o cidadão.

Comentários
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  • Afirma
    10 mar, 2025 Pereira 08:27
    Isso é apenas o "habitual". Só damos pelas crises quando elas nos mordem. Até lá, tudo como dantes, quartel-general em Abrantes. Por isso e pela nossa fraqueza em meios materiais, temos ficado de fora das reuniões onde se começa a desenhar uma Europa sem os EUA. Só palavreado, é só isso que conseguimos produzir, porque no resto, andamos - andamos não, andam os políticos, nós só temos o direito de ir votar para dar cunho de legalidade a esta farsa que é a nossa dita democracia - entretidos com este teatrinho de sombras