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Vidas Invisíveis
Em que situações se pode retirar um filho aos pais? Que mecanismos de ajuda existem? Como melhorar o sistema de prevenção e cuidado? São algumas das questões a debater no Vidas Invisíveis, sobre a realidade do acolhimento de crianças e jovens em risco em Portugal. Este é um podcast Renascença em parceria com a Associação CANDEIA, com produção e apresentação de Ângela Roque, sonorização de Beatriz Garcia e imagem gráfica de Rodrigo Machado
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Quando uma criança é retirada aos pais. "Às vezes o que se pede às famílias é irrealista"
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VIDAS INVISÍVEIS

Quando uma criança é retirada aos pais. "Às vezes o que se pede às famílias é irrealista"

12 mar, 2025 • Ângela Roque


Joana Simões de Almeida é diretora do Núcleo de Infância e Juventude do Tribunal de Cascais e já foi responsável por uma casa de acolhimento da Misericórdia de Lisboa. Diz que as ajudas são escassas e que há planos de recuperação que "parece que obrigam os pais a falhar!”. Defende maior aposta na prevenção das situações de risco e reforço dos apoios às famílias.

Afastar uma criança ou jovem da sua família nunca é uma decisão fácil, mas o que é que pode determinar essa medida limite? No episódio 3 do podcast Vidas Invisíveis, da Renascença, Joana Simões de Almeida, assistente social e atual diretora do Núcleo de Infância e Juventude (NIJ) do Tribunal de Cascais, começa por explicar que “a decisão de retirada é uma decisão judicial ou de uma comissão de proteção. São as únicas entidades que podem decretar o acolhimento”. Mas, em caso de “perigo iminente”, também “uma escola ou um hospital” podem acionar o mecanismo de alerta, e “o tribunal tem 48 horas para validar”.

Os dados do relatório Casa (2023), que faz a análise anual da situação do acolhimento de crianças e jovens em risco, indica que entre as situações de perigo mais comuns esteve a violência doméstica, mas Joana Simões de Almeida confirma que há cada vez mais casos de negligência e conflito parental, com uma crescente “incapacidade dos cuidadores em impôr regras e limites”.

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“Tem muito a ver com o dia a dia das famílias, as pessoas estão a trabalhar e têm menos disponibilidade”. O que aliado ao facto de se terem perdido as relações de vizinhança faz com que hoje muitos jovens estejam “muito entregues a si próprios”, na rua ou colados a écrans.

A experiência tem-lhe mostrado que muitas famílias sentem-se “impotentes” e “precisam de acompanhamento”, mas entende que a aposta devia começar a montante, na prevenção, com mais “equipas multidisciplinares”, “de proximidade” e “que intervenham em crise”, mas que “sejam empáticas e saibam criar condições para que as famílias possam mudar”.

Quando tem mesmo de se retirar os filhos aos pais, a família não pode ser esquecida. “A prioridade, a partir do momento do acolhimento, tem de ser trabalhar a família. Dentro do limite razoável, mas dar oportunidade àquela família e àqueles miúdos de voltarem para casa. Na larga maioria dos casos é isso que os miúdos querem, voltar para a família que conhecem”, sublinha esta responsável, que já foi diretora técnica da Casa de Acolhimento de Santa Teresinha, da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML).

Joana Simões de Almeida admite que “o acolhimento residencial, por melhor que seja, não corresponde às necessidades dos miúdos”, que quase sempre “ficam muito mais tempo do que deviam” a viver nas instituições. A maior parte das crianças em acolhimento têm projetos de reintegração familiar, mas deixa uma crítica a quem decide os processos: “a decisão de acolhimento parece ser mais fácil de tomar do que a decisão de reintegração. Há uma quantidade de exigências colocadas às famílias que quase não são realistas!”.

“Às vezes, olhamos para os planos (de recuperação) e pensamos: ‘isto é obrigar estes pais a falhar! Há famílias com filhos intervencionados a vários níveis diferentes, e que respondem a três ou quatro técnicos diferentes! Estas famílias precisam de muito acompanhamento. Às vezes, sinto que é muito injusto o que se pede às famílias, e que temos de fazer este caminho com elas, ajudá-las a fazer melhor, a fazer diferente”.

A diretora do NIJ do Tribunal de Cascais congratula-se com o facto de Portugal ter entrado “numa era de desinstitucionalização”, seguindo o exemplo de outros países que já apostaram no acolhimento familiar “com imenso sucesso”. Mas deixa outro alerta, relativamente à aplicação das novas regras criadas para o acolhimento residencial - passou a ser obrigatório, por exemplo, as casas serem mistas, para evitar separar irmãos que tenham de ser acolhidos, mas para muitas instituições não será fácil reconverterem-se. “Sabemos que as casas de acolhimento fora da Misericórdia (SCML) têm muitas dificuldades económicas e financeiras, e que o custo de uma criança em acolhimento é muito grande. Tem de ser possível fazer estas alterações que estão definidas na lei, mas de forma exequível”.

No momento em que todo o sistema de proteção e cuidado está a ser avaliado, esta responsável insiste que a prioridade tem de ser “criar recursos para apoiar as famílias, que estão mais desorganizadas”, e apostar “na preservação das crianças”, porque muitas vezes “quando se decide pelo acolhimento, não se pensa no que é que isso vai significar”.

“Estas decisões são muito difíceis de tomar. Quando são tomadas tem de ser com toda a seriedade”, defende ainda, sublinhando que ter em conta o “superior interesse da criança” é também “olhar para os direitos das famílias”.

Em Inglaterra têm o conceito de ‘Good Enought Parenting’, ser suficientemente bons (pais). Eu não sei se já lá estamos. Temos de apostar mais nas famílias”.

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