Siga-nos no Whatsapp
A+ / A-

Euro 2024

​Quando Shearer ficou 21 meses sem marcar pela seleção (e o ketchup meteu-se no bigode de um português)

25 jun, 2024 - 10:05 • Hugo Tavares da Silva

Com o sururu entre Kane, Lineker e Shearer a marcar a agenda nacional, lembramos a seca quase eterna de Alan. Esta terça-feira joga-se o Inglaterra-Eslovénia para tirar as teimas (ou confirmar o drama).

A+ / A-

O antigo avançado do Newcastle está nas bocas do povo porque ele, Alan Shearer, e Gary Lineker criticaram Harry Kane e a prestação dos jogadores ingleses no Euro 2024. Tornou-se um assunto nacional. Kane foi questionado, numa conferência de imprensa, sobre o assunto e defendeu o grupo, lembrando os veteranos que devem ter outra postura e que também não ganharam nada pela seleção.

Bom, 1966 já lá vai…

Os dois antigos futebolistas alertaram que Harry Kane, o homem que vive uma das maiores maldições do futebol (zero títulos conquistados), tem pouca influência no jogo da equipa de Southgate, o selecionador que vai tremendo na cadeira.

Depois da resposta de Kane, Lineker e Shearer voltaram a morder o assunto, num tom porreiro diga-se, e explicaram que a função deles é comentar e avaliar. Mas também entenderam as palavras de Kane. Afinal, “também ali estivemos como capitães de Inglaterra, sentar em frente dos jornalistas quando não jogámos bem”.

Alan Shearer sabe mais do que isso, sabe perfeitamente a que sabe o gostinho vazio da agonia de não marcar golos. O poderoso avançado ficou 21 meses sem fazer as redes abanar, o que levou muitos a questionar a sua titularidade no Euro 1996, em casa. Terry Venables segurou-o.

“Eu continuava a marcar no Blackburn, acho que fiz 37 golos, mas por alguma razão não conseguia marcar pela Inglaterra”, desabafou no “Match of the day”, com Micah Richards e Gary Lineker. “Iam ao poste, à barra. Afeta-te sempre. Tens de acreditar que isso vai mudar. Está sempre na tua cabeça, quando acordas, quando te vais deitar. É o que é, é a tua vida. ‘Meu deus, isto vai mudar alguma vez?’, pensei. Os outros avançados, via-se bem, olhavam para mim a pensar ‘como é que este ainda está a jogar?’.”

Foram quase dois anos sem um golo pela seleção, que não jogou um apuramento rumo ao 1996 porque era em casa. Ou seja, os falhanços e o desacerto deram-se em jogos particulares. Talvez este 'killer' não goste de jogos a feijões.

E lá estava ele na equipa titular naquele 8 de junho de 1996, no Wembley, contra a Suíça de Artur Jorge, para o arranque do Campeonato da Europa. Seaman, Gary Neville, Tony Adams, Southgate (hello, sir), Stuart Pearce, Paul Ince, McManaman, Gascoigne, Darren Anderton, Sheringham e Alan Shearer.

Seiscentos e trinta e nove dias depois, o avançado que estava em trânsito do Blackburn para o Newcastle marcou mesmo. O passe de Paul Ince foi uma delícia, rasgou a defesa helvética toda. O número 9, que até tinha Sheringham ao lado (tipo Cristiano e Bruno Fernandes), disparou uma bala contra a baliza de Marco Pascolo.

A tristeza chegou mais tarde, quando Kubilay Turkyilmaz empatou de grande penalidade. Artur Jorge dava assim o primeiro bigode àquela rapaziada que está habituada a sofrer. Um empate no jogo de estreia num Europeu caseiro é doloroso (Portugal conseguiu pior em 2004, é certo).

O golo de Shearer “foi a única notícia boa”, admitiu Darren Anderton à “Tribuna Expresso” durante o Euro 2020. “Os adeptos não estavam felizes, a imprensa estava a enlouquecer a dizer quão maus nós éramos, principalmente porque tivemos a noitada em Hong Kong, jogámos mal, houve a ‘dentist' s chair’…”

Lembra-se do festejo de Paul Gascoigne depois do golão à Escócia, em que se deitou na relva e os colegas lhe atiram água para a cara? Pois bem, o festejo honrava a galhofa que viveram num bar, nessa tal noite em Hong Kong, antes do Campeonato da Europa. Havia fotografias nos jornais e tudo.

“Basicamente, a imprensa estava a atacar-nos [risos]”, continuou Anderton. “Foram tempos duros. Acho que estávamos todos em baixo, mas lembro que o Alan [Shearer] era o único a andar pelo hotel com um pequeno sorriso. Claro que ele queria ganhar, mas muita gente andava a questionar se ele devia jogar. Claro que devia jogar e claro que ele fez o que ele fez. Os 21 meses estavam esquecidos. Era um dos melhores pontas de lança do mundo.”

Ou seja, Shearer sabe bem o que é estar enfiado naquela farda britânica a ser infeliz e a sofrer com as críticas do mundo inteiro.

O Europeu dos ingleses foi especial, e Shearer até foi o melhor marcador (5), mas acabariam por esbarrar num sinal de “stop” mostrado nas meias-finais pela Alemanha, pois claro. Shearer marcou primeiro, Kuntz empatou depois. Os alemães, treinados por Berti Vogts (o único a ser campeão europeu de seleções como jogador e treinador), venceram nos penáltis e, uns dias depois, ganhariam a final com um golo de ouro contra a República Checa de Poborsky.

Agora, numa análise para o “The Athletic”, Alan Shearer defendeu que Harry Kane não deve perder a titularidade contra a Eslovénia, na derradeira jornada da fase de grupos. “Não podes tirar o teu capitão e o teu principal marcador de golos.” Mas mostrou o que devia fazer diferente em termos de movimentos. De resto, o jogador tem sempre a palavra final no que toca a rebater críticas, escreveu o mítico avançado.

A história repete-se.

Comentários
Tem 1500 caracteres disponíveis
Todos os campos são de preenchimento obrigatório.

Termos e Condições Todos os comentários são mediados, pelo que a sua publicação pode demorar algum tempo. Os comentários enviados devem cumprir os critérios de publicação estabelecidos pela direcção de Informação da Renascença: não violar os princípios fundamentais dos Direitos do Homem; não ofender o bom nome de terceiros; não conter acusações sobre a vida privada de terceiros; não conter linguagem imprópria. Os comentários que desrespeitarem estes pontos não serão publicados.

Destaques V+