15 out, 2015 - 16:57 • Celso Paiva Sol
Com base em muitos documentos internos classificados, alguns deles nunca antes publicados, António José Vilela escreveu “Os Códigos e as Operações dos Espiões Portugueses”.
Neste novo livro, editado pela Esfera dos Livros, sobre os serviços secretos portugueses, o jornalista mostra como é a vida dos espiões, que descreve como homens e mulheres “bem reais, que circulam entre nós”, o seu treino e métodos de trabalho.
Em entrevista à Renascença, António José Vilela elogia a formação dos espiões, que segue os mais avançados padrões internacionais, sempre em permanente actualização com acções ministradas pela CIA (Estados Unidos) ou a Mossad (Israel).
Já sobre a eficácia e a legalidade de todas as missões, o jornalista mostra reservas. Em Portugal, afirma, o secretismo dá para tudo, até para esconder o que nem sempre está previsto na lei.
O jornalista refere-se, sobretudo, ao departamento do Serviço de Informações de Segurança (SIS) “que faz os seguimentos, as filmagens, que trabalha determinadas informações suspeitas, que porventura analisará informações detalhadas, que porventura acederá a dados bancários”. É “difícil perceber” o que este departamento faz e se a sua acção é “inteiramente legal”, diz.
António José Vilela dá o exemplo de filmagens feitas sem “mandato judicial”. “Os carros de serviços do SIS, por exemplo, os carros oficiais do SIS, têm câmaras dissimuladas para fazer filmagens. Os serviços de informações e os espiões portugueses devem fazer filmagens? Eu até concordo que sim, mas agora a lei diz que não.”
Vilela vai mais longe: aos espiões portugueses são ensinados procedimentos que ainda não podem realizar.
“É dada formação no tratamento de informação de facturação detalhada telefónica. É ensinado aos espiões como é que se recolhe essa informação e como é que se trata, como é que se fazem diagramas de conexões, o que é que se consegue apurar a partir de tudo isso”, diz.
“[É] Uma espécie de metodologia de acesso aos nossos dados telefónicos para saber com quem é que falamos, quantas vezes falamos, quando é que falamos, onde é que falamos e por aí fora. Só compreendo que se dê formação a um espião nesta aérea se aquilo lhe tiver algum tipo de utilidade.”
Secretismo é cortina?
O jornalista critica ainda o facto de sucessivas acções de fiscalização indicarem que “está tudo bem” nos serviços secretos portugueses.
“Isso não chega para uma sociedade. Periodicamente rebentam grandes convulsões internas dentro dos serviços, com situações e com denúncias de vigilância, de acesso a dados, de pessoas, identidades. Nunca se consegue perceber muito bem o que é que aconteceu.”
O livro agora publicado também faz várias referências à maçonaria. “É evidente que tem havido uma ligação de determinados núcleos dos serviços à maçonaria”, afirma o autor, mas também elementos do SIS que “não gostam muito da maçonaria”. “Há aqui uma espécie de atracção mútua de segredos.”
Uma vez mais, o segredo serve como cortina para o que realmente se passará dentro dos serviços.
O recrutamento tem melhorado, mas continua a ser feito, em grande medida, “a olho”.
“Há um conjunto de pessoas que ora estão dentro dos serviços, ora estão fora dos serviços. Há um conjunto de pessoas que tem conseguido ao longo dos anos colocar gente dentro dos serviços. E isso é evidente: são filhos de diplomatas, filhos de polícias, filhos de advogados, filhos da secretária do próprio secretário-geral do SIRP [Sistema de Informações da República Portuguesa]”, critica.