01 set, 2016 - 12:28
O presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), Henrique Gaspar alertou esta quinta-feira que o sistema de justiça está confrontado com dificuldades, como cobrança de dívidas e penhoras, “que medidas de gestão não podem resolver”.
Henrique Gaspar falava na sessão de abertura do novo Ano Judicial, onde salientou a ineficácia das execuções como uma “consequência agregada de um erro histórico e genético do modelo e dos efeitos devastadores da crise económica”.
Perante esta situação, o presidente do STJ vai exigir o estudo rigoroso dos números e uma profunda reflexão, já que as indicações de instâncias centrais de execução apontam para taxas de eficácia nos 2% ou 3%.
"A razão é tão óbvia, que surpreende não ser equacionada no discurso recorrente sobre esta matéria; a dimensão do problema constitui expressão de uma economia doente", sublinhou.
No entanto, Henrique Gaspar destaca aspectos positivos na justiça, como a taxa de resolução e a taxa de descongestionamento processual que têm vindo a melhorar. Na última década, estas taxas apresentam valores positivos em 2015 e no primeiro trimestre de 2016, baixando as pendências processuais em 12%.
Na sua intervenção, o presidente do STJ revelou que o tempo de duração média na primeira instância, em matéria cível, foi de 17 meses e, em matéria penal, a duração média de acusação foi de 10 meses e meio. Na justiça laboral verificam-se oscilações no desempenho, com média de duração entre 11 e 12 meses e meio.
Já os processos de insolvência, com aumento acentuado desde 2011, tiveram índices de resolução positivos e a duração média até à declaração de insolvência dos processos concluídos em 2015 foi de 3 meses. Nesta questão, Henrique Gaspar sublinha que os efeitos da crise económica são muito expressivos, dado que as insolvências de pessoas singulares atingiram 72.2%.
Direito penal. Um “turbilhão de mudanças”
O direito penal também mereceu observações de Henrique Gaspar, para quem este direito "não escapa ao turbilhão de mudanças, ficando instável e num plano inclinado de indefinição".
"O direito penal passou a servir para tudo. Parece, de repente, a invenção política mais simples para responder a anseios e aquietar medos, que despertam sentimentos sociais condicionados por exageros mediáticos de uma ou outra manifestação crítica", disse.
Na sua opinião, os tribunais, num ambiente de "populismo penal" e de emoções devem ter "a prudência, a sabedoria e a coragem nos seus julgamentos quando enfrentem a multidão".
"Não podemos esquecer nunca que a condenação de alguém inocente constitui o absoluto da ofensa à dignidade da pessoa humana. Por outro lado, a expressão do populismo penal tem de ser racionalmente confrontada com a realidade", frisou.
A relação entre a Justiça e a Europa num "momento de crise e incerteza” que o projecto europeu atravessa foi outro dos temas abordados por Henrique Gaspar, ao destacar que os tribunais portugueses são "uma garantia do substracto material da democracia, contra a erosão dos direitos fundamentais, a insegurança e a incerteza".