21 jan, 2025 - 21:07 • Pedro Mesquita
João Bilhim foi o primeiro presidente da Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública (CReSAP), entre 2012 e 2014. Este antigo militante do PS, nomeado para o cargo quando o social-democrata Pedro Passos Coelho era primeiro-ministro, não parece ter grandes dúvidas sobre a responsabilidade da ministra da Saúde, Ana Paula Martins, na polémica que conduziu à demissão de Gandra d’Almeida, enquanto diretor-executivo do SNS.
“O erro é inteiramente da senhora ministra. Ela sim, não tinha impedimento nenhum de obter informações. Em contrapartida, a CReSAP se for pedir formalmente a qualquer entidade informação administrativa, ou judicial, é-lhe recusada na medida em que nos seus estatutos não tem autoridade, nem administrativa nem judicial, para fazer esse tipo de inquérito”, argumenta João Bilhim, em entrevista à Renascença.
O que falhou, do seu ponto de vista? A CReSAP consegue verificar se existem, ou não, incompatibilidades de um determinado candidato?
A CReSAP, no seu estatuto, não tem competência de polícia, não tem competência de inspeção, nem de auditoria. A CReSAP funciona como um tribunal e avalia, de acordo com a documentação material que tem à sua frente. A única coisa que pode fazer – e a CReSAP, neste caso fez - é obter informações indiretas, dizendo assim: “você declara que não omitiu nada que seja pertinente para avaliação deste caso.” E, pelos vistos, a CReSAP, neste caso, também o fez. Por isso não havia mais nada, do meu ponto de vista, que a CReSAP pudesse fazer.
Ou seja, a CReSAP no fundo teve o currículo de Gandra d’Almeida, que lhe foi enviado pelo Ministério...
Pelo Ministério. E também o questionário, que faz parte do site da CReSAP, enviado pelo Ministério, e o ofício do Ministério a requerer uma avaliação de adequação.
Saúde
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E, neste caso, não havia nenhuma informação vinda do Ministério da Saúde a sugerir que houvesse incompatibilidades?
Nada, porque se existisse nem o Mistério a poderia enviar. Não faltava mais nada.
Por outro lado, a deliberação da CReSAP, em relação a este caso, diz: “a personalidade indigitada declarou não ter omitido informações relevantes nem possuir quaisquer impedimentos e incompatibilidades para o exercício do cargo”. A CReSAP validou este dado.
Exatamente. Ou seja, a CReSAP tomou essa informação como boa e, consequentemente, o candidato é que terá prestado falsas declarações, porque, pelos vistos, tinha incompatibilidades que não declarou e fez uma afirmação ao contrário. Embora essa declaração seja dúbia, porque é assim: diz que não tem incompatibilidades para o cargo. Não diz que não tivesse incompatibilidades para os cargos ou funções que anteriormente tivesse exercido. Mas a pergunta é feita para o cargo em causa e não sobre se antes, ao longo da sua vida, ele teria exercido, ou não, alguma função irregular.
Mas a CReSAP teve conhecimento de irregularidades passadas?
Não tinha, nem tinha a possibilidade de ver. Repare, até mesmo para o próprio cargo, ela [a CReSAP] tem de se basear na afirmação do candidato a dizer que não tem e, portanto, se ele fizer falsas declarações, o problema é dele. Portanto, se nem sequer sobre o cargo, a CReSAP pode ir mais longe, muito menos poderia ir mais longe em matéria do exercício de funções que ele tenha exercido no passado.
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Tenho aqui a minha frente o currículo que é apresentado no parecer da CReSAP. Por aquilo que diz este currículo, deteta alguma incompatibilidade?
Não. Por aí vejo tudo normalmente. E nem vejo que a CReSAP tenha cometido qualquer ato de menor prudência. Eu acho que a falta de prudência radica inteiramente no membro do Governo, que terá indicado alguém, sem ter averiguado primeiro da sua idoneidade.
Pelo amor de Deus, a senhora ministra que assuma o erro. Errar, todos nós erramos e é bom que saibamos aprender com o erro. O erro aí não é da CReSAP. O erro é inteiramente da senhora ministra. Ela sim, não tinha impedimento nenhum de obter informações. Em contrapartida, a CReSAP formalmente, se for pedir a qualquer entidade informação administrativa, ou judicial, é-lhe recusada na medida em que nos seus estatutos ela não tem autoridade, nem administrativa nem judicial, para fazer esse tipo de inquérito.
Se é grave a omissão ou a apresentação de informações falsas por parte de um candidato, quão grave é politicamente a decisão da Ministra e a forma como ela agiu neste caso?
É grave politicamente porque não se indica um nome sem se informar primeiro sobre a pessoa. Eu não percebo como é possível um membro do Governo apresentar alguém, para um cargo destes, sem ter esmiuçado, ao pormenor, a vida profissional desse senhor. Eu acho que é de uma superficialidade que brada aos céus.
Imagina que, neste momento, o currículo de Álvaro Santos Almeida (o nome apresentado publicamente pela ministra da Saúde para diretor-executivo do SNS) esteja a ser passado a pente fino por parte do ministério...
Imagino que sim, não faltava mais nada.