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Saragoça da Matta

"Pen" com dados secretos? "Há o dever jurídico de denunciar o facto"

30 jan, 2025 - 21:48 • Pedro Mesquita

"Se fosse chefe de gabinete do primeiro-ministro teria decidido remeter 'pen' à PGR", diz à Renascença o advogado Paulo Saragoça da Matta.

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"Pen" com dados secretos? "Há o dever jurídico de denunciar o facto", diz Paulo Saragoça da Matta

A "pen drive" com dados sensíveis de centenas de agentes secretos e da Polícia Judiciária, encontrada durante buscas no Palácio de São Bento no âmbito da operação Influencer, em novembro de 2023, deveria ter sido remetida para a Procuradoria-Geral da República (PGR), diz à Renascença o advogado Paulo Saragoça da Matta.

Quanto à investigação em curso, o especialista em Direito Penal explica quais serão as prioridades, a começar por saber a quem foi entregue o dispositivo no momento da chegada.

A "pen drive" estaria no cofre de Vítor Escária, chefe de gabinete do antigo primeiro-ministro António Costa.

Vítor Escária foi ouvido esta quinta-feira no Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), no âmbito do inquérito por violação do segredo de Estado.

A informação foi confirmada à Renascença por fonte da PGR, que não adianta se o antigo chefe de gabinete do ex-primeiro-ministro foi inquirido na condição de testemunha ou de arguido.

Em declarações à Renascença, o advogado Paulo Saragoça da Matta considera que ainda há muitas perguntas sem resposta.

Qual deve ser a prioridade do Ministério Público no inquérito que abriu relativo a esta "pen drive"?

Na minha opinião, o inquérito tem que começar por tentar perceber a quem foi entregue no momento da chegada, por onde é que a "pen" passou dentro do gabinete do primeiro-ministro, e quando chegou ao chefe de gabinete do primeiro-ministro, tentar perceber se foi pedido apoio jurídico para saber o que fazer com a "pen".

A mim parece-me que da duas uma: ou se considera que a informação é totalmente irrelevante, nada consta na "pen", e a "pen" era deitada para o lixo, ou entende-se que ela tem informação relevante, tão relevante ao ponto de ser guardada num cofre. E aí a atitude deveria ter sido toda outra.

Deveria ter sido enviada, por exemplo, para a Procuradoria-Geral da República?

Se fosse eu chefe de gabinete, eu teria decidido remetê-la à Procuradoria-Geral da República, seguramente, para que tentasse ver se valia a pena abrir inquérito ou não - quase de certeza quer sim -, para apurar o que agora vão ter que apurar com uma grande "décalage" temporal.

Sendo informação sensível, é cometido um ato ilícito em guardá-lo num cofre simplesmente em vez de o enviar para a PGR?

Eu digo sim, porque tenho o dever jurídico de denunciar o facto.

Com que intuito é que pode ser guardada informação que sugere, até, suspeitas de violação do segredo do Estado?

Quem a recebeu e a guardou num cofre, obviamente, percebeu que tinha algum valor. Pode ter acontecido que, no meio da dificuldade de trabalho que há num gabinete, a quantidade de assuntos a tratar, que até tenha acabado por haver um certo esquecimento daquele item ali no cofre. Temo é que não tenha sido alertado nem o Sr. primeiro-ministro à época, nem tenha sido transmitido ao novo executivo, o novo chefe de gabinete, a existência da "pen".

Porque é que, só agora, é que se sabe da existência desta "pen", 14 meses depois de ter sido descoberto o dinheiro, de ter sido passada a pente fino o gabinete de António Costa? Presumo que tenha sido detetada nessa altura...

Não. Imagino que se fosse detetada nessa altura, uma "pen" dentro de um cofre seria objeto de análise no momento. Nem sei se foi a Polícia Judiciária que detetou. Imagino que tenha sido alguém do gabinete que tenha detetado a existência da "pen".

O antigo primeiro-ministro, tendo a tutela dos serviços de informação, teria acesso, se quisesse, a todas estas informações classificadas, sem ser por via da tal "pen"?

Vamos ver, tendo a tutela, obviamente que tem um poder de tomar conhecimento de matéria reservada, classificada, secreta, que está na posse dos serviços de informações. A questão aqui é que as informações que constavam da "pen" não eram informações sobre o funcionamento dos serviços, sobre os problemas e perigos que havia para a República. São informações sobre dados pessoais de agentes do SIS, da Autoridade Tributária, etc. Ora, não me parece que o chefe de governo tenha necessidade de saber as informações pessoais de quem seja agente do SIS.

O advogado António Costa deixou claro, numa resposta à Renascença, que nunca o ex-primeiro-ministro foi confrontado com a existência desta alegada "pen", ou do seu conteúdo. Será de crer que a Procuradoria-Geral da República irá chamar António Costa?

Eu penso que bastará ouvir o próprio chefe de gabinete, ou os chefes de gabinete de António Costa, e eles relatarão se comunicaram ou não comunicaram.

E digo-lhe que, na minha opinião pessoal, parece-me que o chefe do Governo, constatando esta realidade e sendo jurista, não teria deixado a "pen" guardada num cofre.

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