07 abr, 2025 - 06:00 • Anabela Góis
A decisão está tomada: o modelo de referenciação de grávidas para as urgências, o SNS Grávida, que obriga a uma triagem prévia pelo SNS24, vai ser alargado a todo o país. A Renascença apurou que o anúncio vai ser feito muito em breve.
O presidente da Comissão Nacional de Saúde da Mulher, Criança e Adolescente, Alberto Caldas Afonso, responsável pelo Plano de Reorganização das Urgências de Obstetrícia e Pediatria, diz que a fase-piloto não podia ter corrido melhor. Para além de optimizar o número de médicos, a obrigatoriedade de contactar o atendimento telefónico do SNS antes de recorrer às urgências reduziu em 25% as admissões nos últimos meses.
O médico não tem dúvidas de que o modelo “deve manter-se não só porque não há recursos profissionais para assegurar as urgências, como estavam, nas 39 Unidades Locais de Saúde (ULS) do país, como os dados mostram que o modelo garante que as mulheres estão a ser observadas no local apropriado, e com isto já reduzimos 25% dos episódios nas urgências".
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Quando foi apresentado este novo modelo de referenciação foi anunciada, também, a criação de incentivos – ainda a estudar – para atrair mais profissionais da especialidade de obstetrícia para o Serviço Nacional de Saúde. Até agora não saíram do papel, mas Alberto Caldas Afonso garante que já entregou a sua proposta à ministra da Saúde.
O que está previsto “é uma majoração do salário que pode chegar aos 40%, desde que sejam cumpridos vários indicadores, que não são meramente quantitativos”. É preciso – sublinha – “garantir acessibilidade, garantir produção e garantir cuidados assistenciais com qualidade e com humanização”.
Mas esta medida é essencial, defende o médico, que também é diretor do Centro Materno Infantil do Norte. Dos 1.900 obstetras que há no país, só 760 é que trabalham no SNS e destes, 40% têm mais de 55 anos e, por isso, não são obrigados a fazer urgências. “Tenho uma profunda convicção que sem incentivos não se consegue resolver este grave problema. Os médicos foram o grupo profissionais que mais poder de compra perdeu. E quando há outras solicitações, seja do setor privado ou do estrangeiro, não é difícil perceber o que acontece”
A falta de obstetras na Península de Setúbal ainda não foi resolvida, e são muitos os fins de semana em que não há uma maternidade aberta. A ministra da Saúde falou na possibilidade de criar um centro materno-infantil no Hospital Garcia de Orta, em Almada. Caldas Afonso diz que a solução pode ser difícil, mas tem e pode ser encontrada. Como está é que a situação não pode ficar, diz, questionando se “alguém compreende isso?”.
Segundo o médico, “é preciso um entendimento entre os conselhos de administração das três ULS que incluem os hospitais de Setúbal, Barreiro e Almada, de que há um bem comum que deve estar sempre acima do bem individual, e o bem comum é proporcionar às senhoras de Setúbal uma garantia de estabilidade, de haver sempre uma resposta na península de Setúbal”.
Mas Alberto Caldas Afonso também adianta que, em último caso, há sempre as decisões políticas, mas que essas competem aos políticos.
Na pediatria, o novo modelo de referenciação - que obriga à triagem prévia pela linha SNS Criança - está a funcionar há pouco mais de um mês na região de Lisboa e Vale do Tejo, Leiria, Santarém, Caldas da Rainha e Área Metropolitana do Porto. Mas, até agora, diz Caldas Afonso, já retirou mais de um terço das falsas urgências dos hospitais.
“As alternativas que temos para os casos triados com pulseira azul e verde, quer sejam as consultas abertas ou diferidas do centro de saúde, quer sejam as consultas abertas no respetivo serviço nos hospitais, quer sejam os Centros de Atendimento Clínico nas grandes áreas metropolitanas, estão a retirar 30 a 40% de situações de muito baixa gravidade dos hospitais”. As coisas estão a funcionar muito bem, garante Alberto Caldas Afonso, que até diz que as expectativas iniciais foram ultrapassadas.
“A almofada que temos para marcações nos cuidados de saúde primários e nas consultas hospitalares tem maior capacidade do que eu imaginava", aponta o médico, "mesmo em regiões com menos médicos de medicina geral e familiar”.
Estas urgências integram um projeto-piloto para testar o Plano de Reorganização para as Urgências de Pediatria, antes de ser alargado a todo o país.